O esoterismo morreu

18nov2012

Assim como esoterismo superficial é um contrassenso e esoterismo pop jamais será esoterismo de verdade, seu sucesso teria necessariamente que decretar sua deturpação

O ESOTERISMO MORREU

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Esoterismo significa, originalmente, a parte mais oculta de uma filosofia, religião ou tradição, que requer sincera dedicação para ser alcançada. Essa dificuldade torna-se uma barreira natural aos aspectos mais profundos do aprendizado, e assim eles prosseguem exclusivos aos que persistem. Foi assim que os ensinamentos esotéricos se protegeram das perseguições e chegaram ao mundo contemporâneo.

Em contrapartida, a parte mais simples e visível das tradições sempre foi abertamente oferecida a todos, e as pessoas que se contentavam com sua simplicidade não precisavam passar por severos ritos de iniciação nem se dedicar durante anos ao aprofundamento. Esses aspectos mais triviais são a parte exotérica (exo, do grego fora, exterior), exatamente o contrário da parte esotérica (eso, do grego dentro, interior).

No Ocidente, as antigas tradições místicas e religiosas se mantiveram vivas mesmo sob extrema perseguição por parte das religiões oficiais, como fez a Igreja Católica, entre os séculos 14 e 18 com sua impiedosa Santa Inquisição. No século 19, a facilidade crescente dos transportes e das comunicações as tornou mais conhecidas, e mais ainda no século 20. Nos anos 1960, com a explosão da contracultura, as bandeiras de paz, amor e igualdade ganharam a mídia, e a espiritualidade, desatrelada das religiões formais, ganhou espaço.

E foi justamente num dos aspectos da espiritualidade, o esoterismo, que a mentalidade mercantilista do Ocidente farejou grande potencial de consumo. Porém, como tornar popular (para vender mais) algo que necessita de tempo, estudo e dedicação? A saída foi vestir o esoterismo com uma roupinha mais leve, que desse para usar em qualquer ocasião. Foi assim que a cultura esotérica tornou-se popular e, mais que isso, massificada. Uns aproveitaram a quantidade de informações circulante para, de fato, se aprofundar no esoterismo, mas a grande maioria ateve-se aos aspectos superficiais.

Assim como esoterismo superficial é um contrassenso e esoterismo pop jamais será esoterismo de verdade, seu sucesso teria necessariamente que decretar sua deturpação. Foi o que ocorreu. A maior parte do que se vê por aí como esotérico são apenas aspectos caricatos de ensinamentos profundos que durante séculos foram passados de iniciado a iniciado, com cuidado e reverência. Porém, mesmo disseminadas e desvirtuadas na promiscuidade da mídia e da internet, as profundas tradições místicas e religiosas continuam com sua essência guardada aos que se dispõem ao esforço do aprendizado. São como algo valioso que pode até circular entre muitos mas que, para alcançá-lo de verdade, tem-se de passar pelo inevitável e insubornável guardião da iniciação.

Os anos 1970 vieram com John Lennon avisando que o sonho acabara e o movimento hippie percebendo que flores, de fato, não venceriam canhões. Porém, a espiritualidade, despertada nos anos 60 e vivenciada agora sem tantas formalidades religiosas, já se incorporara à cultura ocidental. Foi o esoterismo pop, no entanto, esse monstrengo ideológico, que se mostrou mais vendável, e assim tudo passou a ser esotérico para poder vender: era a sensação consumista dos anos 1990. Shirley McLaine, no cinema, falou de vidas passadas, e o mago Paulo Coelho, nos livros, tornou-se fenômeno mundial de vendas. Agora, início do novo milênio, para desespero de seus críticos, o furacão do esoterismo pop ainda mostra fôlego, explorando (e deturpando) aspectos das tradições milenares.

A espiritualidade do novo milênio é multifacetada, reflexo do caos de valores e informações. Anjos, pirâmides e vidas passadas ainda vendem horrores, mas é interessante ver que em muitas pessoas a espiritualidade mostra-se mais madura e menos bitolada, chegando, em alguns momentos, a abranger questões bioéticas, sociopolíticas e ecológicas, e a flertar com valores como diversidade das crenças e autoconhecimento psicológico. Até que nem tanto esotérico assim.
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Ricardo Kelmer 1999 – blogdokelmer.com

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> Esta crônica integra o livro A Arte Zen de Tanger Caranguejos

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