RK na Nova Consciência 2012

19/02/2012

Ricardo Kelmer 2012

Um festival multicultural que reúne arte, ciência, filosofia e tradições religiosas

.

O Encontro da Nova Consciência é realizado desde 1992, durante o Carnaval, em Campina Grande, Paraíba. É um festival multicultural que reúne arte, ciência, filosofia e tradições religiosas, buscando um mundo melhor pelo caminho do respeito às diferenças. Nesta 21ª edição, farei duas palestras, participarei de duas mesas e lançarei o livro novo. Eis os horários de minhas participações:

> 6ª feira, 17fev

AUDITÓRIO SESC CENTRO
21h40 – Palestra – “A revolução do mundo autoconsciente: Cidadania global como saída para a crise evolutiva”.

> Sábado, 18fev

3º ENCONTRO DE LITERATURA CONTEMPORÂNEA
15h30 – Mesa: “Realismo fanástico, RPG e a escrita de ficção científica”. Com André de Sena (escritor, jornalista-PE) e Wander Shirukaya (escritor-PB). Mediação: Bruno Ribeiro (PB).
16h45 – Lançamento do livro “O irresistível charme da insanidade” (romance, Editora Artepaubrasil-2011).

> 2ª feira, 20fev

AUDITÓRIO SESC CENTRO
14h – Mesa – “Produção cultural independente: ou colaboramos ou evaporamos”. Com Alberto Marsicano (Citarista-SP), Rayan Lins (Coletivo Mundo-PB) e Diogo Rocha (Coletivo Natora-AL). Coord.: Arthur Pessoa (Músico-PB).

> 3ª feira, 21fev

14º ENCONTRO DE ATEUS E AGNÓSTICOS
14h – Palestra – “Ativismo ateu: chatice ou necessidade?”

2º ENCONTRO DE COMUNICAÇÃO E MÍDIAS DIGITAIS
17h – Palestra – “Internet livre x direitos autorais – Mocinhos e vilões na guerra pelo controle da cultura mundial”

ENCERRAMENTO
Leitura da crônica Medo de Mulher (dedicada às mulheres violentadas e mortas em Queimadas-PB, em 12.02.12)
> Baixe o arquivo de áudio dessa leitura (mp3, 8mb)

> Todas as noites

Na praça, é claro, curtindo os shows da programação musical, que apresenta atrações locais, de outros estados e de outros países.

PROGRAMAÇÃO COMPLETA DO EVENTO

.

.

VÍDEO DA PALESTRA
“A revolução do mundo autoconsciente – Cidadania global como saída para a crise evolutiva”

.

.

.


O Irresistível Charme da Insanidade

Um músico obcecado pelo controle da vida. Uma viajante taoísta em busca de seu mestre e amante do século 16. O amor que desafia a lógica do tempo e descortina as mais loucas possibilidades do ser.

.

.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer(arroba)gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer. (saiba mais)

.

.

Comentarios01 COMENTÁRIOS
.

01- Ainda não conhecia o trabalho de Ricardo Kelmer, mas fiquei encantada de uma forma, que com certeza vou procurar suas obras para ler, principalmente seu filho mais recente, adorei o enredo… Harriet Galdino, Campina Grande-PB – fev2012



Nosso Bar – Existe birita após a morte

09/02/2012

29fev2012

Quando você chega na colônia extrafísica Nosso Bar, a primeira coisa que recebe é uma camiseta da sua birita predileta

NOSSO BAR – EXISTE BIRITA APÓS A MORTE

.
Após ver o filme Nosso Lar, fiquei imaginando… E se eu fosse parar num lugar daquele? Já pensou, eu vestido com aqueles modelitos esvoaçantes, sem poder usar meu boné do Cabaré Soçaite, eu levitando em passeios matinais à beira do lago enquanto toca música celestial… Já imaginou? Também não consegui imaginar. Então bolei um filme do além alternativo. Com vocês: Nosso Bar – Existe birita após o morte.

Para começar, quando você chega na colônia extrafísica Nosso Bar, a primeira coisa que recebe é uma camiseta da sua birita predileta. Eu, por exemplo, vou ganhar aquela preta clássica do Jack Daniel´s. E a segunda coisa que você recebe é um fígado novinho em folha, sem prazo de validade.

Bar no Nosso Bar é que nem hospital: não fecha nunca. Nem em dia de finados. E ninguém precisa se preocupar com a conta: basta assinar e pronto. E quem paga? O Mistério. Como assim, o Mistério? Ah, isso eu não sei explicar, sempre foi assim, o Mistério paga tudo. Inclusive o engov.

Aqui os bares fecham cedo para não dar problema com a vizinhança, né? Lá não tem isso, pois a vizinhança é toda de bares, boates e inferninhos. Música ao vivo? Infelizmente, não tem – mas tem música ao morto de primeira qualidade. Você gosta de barzinho de rock? Tem mil para você escolher. Bar de blues? Tem a perder de vista. Bar de sertanejo? Desculpa, isso não tem, é melhor você procurar em outro além. Tá, tudo bem, podemos incluir um bar de sertanejo. Mas com isolamento acústico cem por cento.

O atendimento é coisa do outro mundo: garçonetes lindas e atenciosas, sempre simpáticas. Admiravelmente generosas. E eternamente solteiras. Como, garçons sarados? Não, assim você quer acabar com meu filme. Tá, tudo bem, vamos incluir garçom sarado também. Putz, o Nosso Bar já foi melhor…

Só maiores de idade podem ir a essa colônia. É lei. Por isso, relaxe, meu amigo, pois você nunca será enganado por aquela linda ninfeta que jurou para você que tinha dezoito anos. E as crianças que nascem lá, por acaso elas não crescem e viram ninfetas tentadoras? Arrá! Lá não nasce ninguém, o sexo não é procriativo. Por isso é que você, querida leitorinha, pode enfiar o pé na jaca sem medo que jamais engravidará. É o lado bom da lei.

Dirigir bêbado? Isso é coisa da Terra. No Nosso Bar basta você pensar “quero ir pro Chope Astral” que no segundo seguinte você já tá lá, no melhor lugar do balcão. Brigas? Não tem, pois quem briga perde o crédito com o Mistério e ainda tem que pagar tudo o que bebeu. E quando reencarnar, nascerá com total intolerância ao álcool. Ou seja, é desgraça muita. E como lá todos estão de passagem, ninguém tem que procurar apartamento para alugar: seu quarto tá reservado num hotel bacaninha, perto dos agitos. Por conta do Mistério, claro.

E o enredo do filme? É assim. O Bar Nosso Que Está No Céu realizará uma superfesta que contará com canjas especiais de Janis Joplin, Jim Morrison, Cazuza, Cássia Eller, Jimi Hendrix, Raul Seixas, Tim Maia, Amy Winehouse e Intocáveis Putz Band. A notícia da festa chega ao mundo dos vivos e milhões de pessoas decidem que vão morrer para não perder a festa. E agora? Agora em breve num bar, ops, num cinema perto de você.

.
Ricardo Kelmer 2011 – blogdokelmer.com

.

.

LEIA NESTE BLOG

Estão abduzindo nossas mulheres – Abdução em massa de brasileiras! E bem debaixo do nosso nariz. Alguém precisa fazer algo, daqui a pouco só vai ter homem aqui

Loiras, celulite e futebol – A mulher se sairá melhor se passar uma noite inteira numa mesa ao lado de duas Ex e três Loiras Burras e Gostosas do que se tentar derrotar o Futebol

O charme da vidalheia – Programas sensacionalistas, ligações rastreadas, câmeras por todo canto… A vidalheia parece ser mesmo irresistível

Mordida na última sessão – A maioria dos vampiros são ilustres desconhecidos, gente como você que rala no dia a dia para pagar as contas e assiste ao Sexy Time antes de dormir

Aviso prévio de traição – A partir de hoje poderei te trocar por outra a qualquer momento. Basta que ela sorria pra mim e que me faça agradinhos. E me dê o que você nunca quis me dar

> Mais postagens no tema “humor”

.

A VERDADE SOBRE O ESPIRITISMO
Documentário sobre as origens do espiritismo e seu desenvolvimento no Brasil. Assista e tire suas próprias conclusões.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

COMENTÁRIOS
.

01- Tsc, tsc, tsc, acho que você anda bebendo demais! Maria do Carmo Antunes, São Paulo-SP – fev2012

02- eu acho que é de menos… 😛 Susana X Mota, Leiria-Portugal – fev2012

03- E ai cabra, eu adorei a estoria, mas nao estou com pressa de ir a esse bar, e tambem quando chegar a minha hora, havera uma bela camiseta da Brahma, a numero 1, tambem no Astral. Ja estou plasmando desde ja para ir direto e vou aproveitar e ja irei conhecer o bar. Obrigado pela ideia, aproveito o ensejo par desejar a vc e seus familiares, um FELIZ NATAL e um PROSPERO ANO NOVO, com bastante !!!!!!! PAZ & LUZ !!!!!!!, Durva 65 duartinense e palmeirense. Viva o Chelsea. Durval Brasil, São Paulo-Sp – dez2012

04- O povo do Inferno de Dante era muiiiiiiiito mais borogodozento do que o povo do Paraíso dele, entonces, o povo do “Nosso Bar” é da mesma linhagem do povo do Inferno Dantesco. Beeeeijo. Pat Maria, Salvador-BA – dez2012

05- Ola Ricardo!!!! Meu marido adorou……… Bjs Luck, Campos do Jordão-SP – dez2012

06- Caro Ricardo, sua crônica é muito engraçada. Juraci, Campos do Jordão-SP – dez2012

07- Sou daqui de Corumbá e assisti a sua apresentação do Viniciarte ano passado.Foi um show e tanto.Li o trecho da paródia de Nosso Lar e não pude deixar de rir…você se supera a cada estação,menino.Vejo em você um quixote que combate aqueles que impedem o riso,hegelmente falando é claro…rs.Estranho,né?Eu,uma voz que sai assim do nada e vem te adjetivando.Não,eu sempre leio os seus posts,embora não trilhe as mesmas veredas,mas gosto sinceramente de sua forma de escrever. Fateha Liza, Corumbá-MS – dez2012

08- kkkkkkkk Adorei!!!!! Repassei geral….sucesso. Paula Medeiros de Castro, São Paulo-SP – dez2012

09- Eis que eu acordo, depois de um cochilo, rs, e, sem sono, resolvo olhar meus email… Então, me deparo com o “nosso bar”, kkkkkk. Adoooooreeeeiiii!!! 🙂 Quer dizer que o mistério paga tudo? Nossa… Gostei demais disso! 😉 Obrigada pelo texto! Deu mais sorriso pra minha noite! Beijo! Dalu Menezes, Fortaleza-CE – dez2012

10- Muito bom! Camilla Avella, São Paulo-SP – dez2012

11- Muito engraçado, parabéns!! André de Sena, Recife-PE – dez2012

12- VALEU RICARDO ! ADOREI O NOSSO BAR. MUITO BOM TEXTO, COMO SEMPRE. UM ABRAÇO FORTE. Tibico Brasil, Fortaleza-CE – dez2012

13- o Nosso Bar também existe. Vai depender do seu magnetismo pessoal. Nixxon Alves e Silva, Rio de Janeiro-RJ – dez2012

14- Adorei! Preciso deste livro! Sou espírita e realmente a visão do filme é um tanto cômica… Patrícia Gonçalves, Duque de Caxias-RJ – fev2019

15- Já tô é lá ia ser bem mais feliz que nesse mundo miserável. Cristiane Ribeiro, Fortaleza-CE – fev2019

16- Adorei! Yalis Cardoso, Fortaleza-CE – fev2019

17- Esse Nosso Bar com garçons sarados é mesmo coisa do outro mundo! Cátia Silva, Fortaleza-CE – fev2019

18- Já tenho um lugar pra ir. Íris Medeiros, Campina Grande-PB – fev2019

19- Essa foi boa… rsrs. Jaionara Leite, Manaus-AM – fev2019

20- Eita piula! É pra lá que gostaria de ir. Karina Mozart, Fortaleza-CE – fev2019

21- Rsrs amei!!!! Mas acho que briguei no Nosso Bar e o Mistério…. Michele Jacinto, Fortaleza-CE – fev2019

22- Adorei! “Bar sertanejo com isolamento acústico cem por cento.” Kkkkkkkkkk. Clea Fragoso, Fortaleza-CE – fev2019

 


Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos – Pré-venda

18/01/2012

Ricardo Kelmer 2012

Adquira antecipadamente com um ótimo desconto, tenha seu nome no livro e receba em casa, antes mesmo das livrarias


.

“O que fazer quando de repente o absurdo invade nossa realidade e as velhas verdades se tornam inúteis? Para onde ir quando o mundo acaba?”

Meu livro de contos fantásticos Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos será relançado este ano. E como terei que bancar parte do investimento, já iniciei a pré-venda do livro.

Adquirindo o livro antecipadamente até 10fev, você ganha desconto especial (nas livrarias custará R$ 30) e seu nome constará na obra, na seção Galeria de Leitores Especiais. E você receberá o livro pelo correio no início de abril, com dedicatória, antes mesmo das livrarias.

PREÇOS (pro mesmo endereço, frete incluído)

1 exemplar: R$ 21
2 exemplares: R$ 19 cada
3 exemplares em diante: R$ 19 cada + 1 livreto de brinde (você escolhe o livreto, veja no fim)

BANCOS PARA DEPÓSITO: HSBC, Itaú, Banco do Brasil e Bradesco. Pra participar, envie e-mail pra rkelmer(arroba)gmail.com e eu entrarei em contato informando as contas.

SOBRE O LIVRO

Publicado originalmente em 1997, o livro foi reescrito e alguns contos mudaram bastante. Em minha opinião, ficou bem melhor. Nos nove contos que formam este livro, onde o mistério e o sobrenatural estão sempre presentes, os personagens são surpreendidos por estranhos acontecimentos que abalam sua compreensão da realidade e de si mesmos e deflagram crises tão intensas que podem se transformar numa questão de sobrevivência. Um livro sobre apocalipses pessoais.

> Saiba mais, leia alguns contos, veja comentários

.

LIVRETOS DO BRINDE (comprando 3 ou mais livros)
formato bolso, 48 pag

Guia do Escritor Independente (dicas)
Memórias de um Excomungado (crônicas, reflexão, humor)
Um Ano na Seca (conto, erotismo, humor)
O Ultimo Homem do Mundo (conto, terror, humor)
Blog do Kelmer (crônicas, contos)

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer(arroba)gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer. (saiba mais)

.

.

Comentarios01 COMENTÁRIOS
.


Mordida na última sessão

14/11/2011

14nov2011

A maioria dos vampiros são ilustres desconhecidos, gente como você que rala no dia a dia para pagar as contas e assiste ao Sexy Time antes de dormir

MORDIDA NA ÚLTIMA SESSÃO

.
Eu a conheci na fila do Entrevista com o Vampiro, última sessão. Linda, sensual e misteriosa ‒ foi paixão à primeira olhada. Depois do filme, ela me convidou para um uísque no bar. Aceitei, claro, encantado com seus olhos lânguidos. Algumas horas depois, virei o rosto para o lado e, na escuridão do quarto, procurei o relógio digital. Quase cinco da manhã, em breve amanheceria. Sobre meu corpo, ela se contorcia freneticamente, os cabelos negros balançando. Sua bela silhueta a me cavalgar foi a última imagem que vi, pois logo depois uma onda de prazer incontido me invadiu e fechei os olhos, rendido. Senti que ela prendia meus braços à cama, beijava-me a boca e tchum!, cravava os dentes em meu pescoço. Na confusão de sensações só deu tempo de pensar: Uma vampira… E apaguei.

Pela carinha que você está fazendo, minha amiga, vejo que não acredita em mim, né? Você é uma mulher moderna, não acredita em vampiros. Bem, melhor para eles. Pois eu lhe digo: eles existem. E estão por aí, espalhados entre as pessoas comuns, selecionando o próximo pescoço. Evidente que não dá para reconhecê-los apenas olhando. Na maioria dos casos, só se percebe um vampiro quando já é tarde demais. Como no primeiro parágrafo.

Claro, há vampiros e vampiros. Com o passar dos séculos, muitas linhagens se desenvolveram e hoje já não dá para agrupá-los num só rótulo. Tem vampiro que até vai à missa, acredita? Tem vampiro cuja imagem não reflete no espelho, e ainda assim é hipervaidoso. Há os que dormem em caixões refrigerados e há também, creia, os que fazem bronzeamento artificial para disfarçar a falta de sol. Tem de um tudo nesse mundo de caninos afiados.

Nosferatu, Drácula, Vampirella, algum desses famosos você conhece. Mas a maioria dos vampiros são ilustres desconhecidos, gente como você que rala no dia a dia para pagar as contas e assiste ao Sexy Time antes de dormir. Sim, tem aqueles que se transformam em morcegos e dormem num caibro, pendurados de cabeça para baixo, tudo para fugir do aluguel. Em compensação, ninguém dorme com eles. Só no cinema é que vampiro não trabalha, se veste superbem e ainda mora em cobertura. Conheci uma vampira, garçonete num bar da Praia de Iracema, que mandou botar vidro fumê e ar condicionado no seu fusca para poder dormir dentro dele durante o dia. Para você ver como vida de vampiro não é mole.

No filme Fome de Viver, Catherine Deneuve, ai, ai, é uma linda e charmosa vampira que seduz a homens e mulheres. Ah, minha amiga, nem você resistiria àquele charme francês… Vampiros sabem conquistar como ninguém. Muita gente boa já caiu na lábia vamp. Exemplo? Lucélia Santos. Isso mesmo, pode conferir em As Sete Vampiras. Brad Pitt, Wynona Rider e David Bowie também caíram. Nem Xena, a guerreira, escapou. Se eles que são tão chiques caíram, por que você estaria imune? Ninguém está. Um belo dia, querida, você vai acordar e lá estarão as duas marquinhas no pescoço. Ou na virilha, pelas coxas que você tem…

Como é que sei dessas coisas? Não importa. O que interessa é: o que fazer se você levar uma dentada? Eu lhe digo: relaxe e goze. Aceite o fato e prepare-se para um mundo novo, cheio de novidades. Você é uma mulher bonita, vai aproveitar à beça. Sim, tem vida eterna. Mas cuidado, há sempre um caça-vampiros de plantão, desses bem neuróticos, cheio de frustrações, doido para lhe enfiar a estaca no coração. Por isso, vampiro tem de ser discreto. Vantagem mesmo é que a maioria não envelhece, não adoece, não tem ressaca nem pega aids. A vida vira uma festa, toda noite na gandaia, já pensou? O diabo é o cartão de crédito que vive estourado.

Você já viu Quente como Licor? É uma história de amor entre vampiros que se prostituem para conseguir sangue. Está em cartaz no Cine Franzé. Que tal irmos esta semana? Ótimo! Então está marcado, a gente se encontra na entrada. Podemos ir na última sessão?

.
Ricardo Kelmer 2001 – blogdokelmer.com

.

.

FILMES CITADOS

FILMEFomeDeViver-01Entrevista com o Vampiro – The Vampire Chronicles. EUA, 1994, Terror. Direção: Neil Jordan. Roteiro: Anne Rice, baseado em livro de Anne Rice. Elenco: Tom Cruise, Brad Pitt, Antonio Banderas, Stephen Rea.

Fome de Viver – The Hunger. EUA/Inglaterra, 1983, Terror. Direção: Tony Scott. Roteiro: James Costigan, Ivan Davis e Michael Thomas, baseado em livro de Whitley Strieber. Elenco: Catherine Deneuve, David Bowie, Susan Sarandon, Cliff De Young.

As Sete Vampiras – Brasil, 1987, Comédia. Direção: Ivan Cardoso. Roteiro: R. F. Luchetti. Elenco: Andréa Beltrão, Ivon Cury, Danielle Daumerie, Wilson Grey, John Herbert, Leo Jaime, Zezé Macedo, Nuno Leal Maia, Lucélia Santos.

Drácula de Bram Stocker – Bram Stoker’s Dracula. EUA, 1992, Terror. Direção: Francis Ford Coppola. Roteiro: James V. Hart, baseado em livro de Bram Stoker. Elenco: Gary Oldman, Winona Ryder, Keanu Reeves, Anthony Hopkins.

Quente como Licor – Todas as informações sobre este filme foram misteriosamente apagadas da internet.

.

.

DOCE VAMPIRO (Rita Lee)
Vídeo com imagens do filme Drácula de Bram Stocker

.

.

LEIA TAMBÉM

MeuFantasmaPredileto-01Meu fantasma predileto – Diziam que era a alma de alguém que fora escritor e que se aproveitava do ambiente literário de meu quarto para reviver antigos prazeres mundanos

O íncubo – Íncubos eram demônios que invadiam o sono das mulheres para copular com elas – uma difundida crença medieval. Mas… e se ainda existirem?

Vade retro Satanás – O Mal pode ter mudado de nome e de estratégias. Mas sua morada ainda é a mesma, o nosso próprio interior

Cine Kelmer apresenta – Dicas de filmes

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- hum…adoreiii. Carol Nobre, Fortaleza-CE – nov2011

02- Uhnnn….sabe que sempre gostei bastante dessas histórias a respeito de meus ancestrais, rs…. Paula Medeiros de Castro, São Paulo-SP – nov2011


Vade retro Satanás

07/10/2011

07out2011

O Mal pode ter mudado de nome e de estratégias. Mas sua morada ainda é a mesma, o nosso próprio interior

VADE RETRO SATANÁS

.
Na primeira vez que o Diabo passou pela cidade corria o ano de 1974 e eu era pequeno demais para encarar. Tive de me contentar com os relatos de quem foi corajoso o suficiente para ir confrontá-lo, escutando-os atento, uma parte de mim tremendo de medo e a outra inteiramente seduzida. Se por um lado minha educação católica pintava-o como o mais temível dos inimigos, por outro lado crescia em mim o desejo de conhecê-lo e com ele medir forças.

Alguns anos depois as trombetas anunciaram sua volta e senti um frio no estômago. Chegara o grande momento e eu já não podia recuar. Tinha então meus 14 anos, estava mais crescidinho. Havia lido livros, visto filmes, escutado histórias sobre Ele e seus feitos terríveis. Eu já intuía que aquele encontro seria uma espécie de prova iniciática e que precisava passar por ela. Como nenhum de meus amigos tivera coragem de ir ver o filme, isso só aumentou meu medo. Então, mesmo sentindo cheiro de encrenca, lá fui eu assistir O Exorcista, o filme de William Friedkin.

Putz, foi um vexame! Voltei para casa apavorado. Avisei a meus pais que aquela noite dormiria no quarto deles e restou à minha mãe, que insistira que eu não fosse ao cinema, repetir o velho “eu avisei, eu avisei”. Apesar disso, não me arrependi. Até sentia um certo orgulho de mim.

A partir de então eu seria atraído por tudo que dissesse respeito ao modo humano de entender o Bem e o Mal. Deuses, demônios e heróis de variadas mitologias passaram a habitar minha biblioteca e dividir comigo o meu quarto. Revirei religiões, ciências e filosofias em busca de entender o que havia por trás dessa confusa e frágil dualidade. Viajei, conheci outras ideias, vivi experiências profundas que me puseram em contato com o melhor e o pior de mim. Aos poucos percebi que o Diabo que eu tanto buscava lá fora para tentar entendê-lo, na verdade sempre morara em meu interior, e que para decifrá-lo eu teria antes que decifrar a mim. Lúcifer se escondia sob a legião dos meus medos e bloqueios mais íntimos, me espreitando por trás de tudo o que eu desconhecia de mim mesmo.

O Exorcista é um marco na história dos filmes de terror. Roteiro, direção, interpretações – tudo é excelente. O drama pessoal do padre Karras, que se vê às voltas com um exorcismo justamente quando enfrenta uma forte crise de fé e de consciência por ter abandonado a mãe, é um dos destaques. Poucos filmes merecem fazer-lhe companhia na estante do gênero. Depois daquela primeira vez eu o veria outras mais, sempre esmiuçando detalhes. Numa delas levei um gravador e gravei o filme inteiro para ficar escutando depois. Também li o livro de William Peter Blatty do qual nasceu o roteiro.

O terror dos filmes de hoje é geralmente mais explícito, sanguinário e tecnológico, sem sutilezas psicológicas como em O Exorcista. Se hoje as novas gerações não se assustam tanto com ele quanto seus pais se assustaram, talvez seja porque nesses dias atuais o grande terror responde pelos nomes de violência, terrorismo e fanatismo religioso, e o bicho-papão agora são os bandidos cruéis e impunes a nos ameaçar nas esquinas da injustiça social e nos cargos políticos. A humanidade está possuída por seus próprios demônios inconscientes, o que faz do futuro da espécie e do planeta um perigoso horizonte de incertezas.

Sim, o Mal pode ter mudado de nome e de estratégias. Mas sua morada ainda é a mesma, o nosso próprio interior. O motivo é simples: lá é sempre o último lugar onde os humanos vão procurar a verdade. Se de fato pretendemos derrotar o Mal, é urgente que tenhamos antes de tudo, cada um, a coragem de entrar no quarto frio e escuro do nosso desconhecimento de nós próprios e, uma vez lá, reconhecer os demônios que procuramos sempre exorcizar… nos outros.

Água benta e crucifixos são uma beleza para afastar o capeta – em filmes. No roteiro mais realista de nossas vidas, é esse autoconhecer-se o verdadeiro exorcismo que pode nos libertar das piores possessões.

.
Ricardo Kelmer 2001 – blogdokelmer.com

.

.

O EXORCISTA (The Exorcist, EUA, 1973)
Direção: William Friedkin
Roteiro: William Peter Blatty

Baseado no romance O Exorcista, de Wlilliam Peter Blaty
Elenco: Max Von Sidow, Ellen Burstyn, Jason Miller, Linda Blair

Padre em crise de fé é procurado por mãe aflita cuja filha doente não consegue ser curada pelos médicos. Junto com ele um famoso padre exorcista tentará expulsar o suposto demônio da criança.

.

.

TRÊILER OFICIAL

.

LEIA TAMBÉM

Deus planta bananeira de saia (filme: Dogma) – Como todo ser, o criador busca sempre transcender a sua própria condição e é criando que ele faz isso

Deuses, humanos e andróides na berlinda (filme: Blade Runner) – Como todo ser, o criador busca sempre transcender a sua própria condição e é criando que ele faz isso

O íncubo – Íncubos eram demônios que invadiam o sono das mulheres para copular com elas – uma difundida crença medieval. Mas… e se ainda existirem?

Meu fantasma predileto – Diziam que era a alma de alguém que fora escritor e que se aproveitava do ambiente literário de meu quarto para reviver antigos prazeres mundanos

Mordida na última sessão – A maioria dos vampiros são ilustres desconhecidos, gente como você que rala no dia a dia para pagar as contas e assiste ao Sexy Time antes de dormir.

Cine Kelmer apresenta – Dicas de filmes

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

 


Reencarnação e vidas simultâneas

27/05/2011

Ricardo Kelmer 2011

A vida de Luca e Isadora no século 16 influencia suas vidas no século 21 e vice-versa, como se o “eu” existisse em mais de uma vida ao mesmo tempo
.

.

Já pensou você descobrir que numa outra vida já viveu um grande amor com a pessoa que hoje está com você?

É sobre isso o meu romance O Irresistível Charme da Insanidade. É a história do amor maluquete do casal viajandão Luca e Isadora. Ele é um cantor de blues e ela uma mochileira taoísta que acredita ser ele a reencarnação de seu grande amor do século 16. A história se passa simultaneamente na Espanha quinhentista e nas praias do Nordeste do século 21.

Para mim, particularmente, a teoria da reencarnação não faz sentido. Mas é uma ideia que pode render boas histórias. A prova disso é o sucesso dos livros espíritas com suas histórias românticas sobre amores através dos séculos. Tem quem goste. Eu, porém, acho esses livros de uma caretice irritante, argh!, um moralismo açucarado e gosmento, o bem e o mal muito bem definidinhos, seres da luz e seres das trevas, aaaargh! Quem gosta de moralismo e caretice, vou logo avisando, é bom nem chegar perto do meu romance.

Mas voltemos à ideia. Já pensou você descobrir que numa outra vida viveu um grande amor com a pessoa que hoje está com você? Uau!!! Deve ser emocionante, heim? Bem, isso também pode render alguns probleminhas extras, pois o casal terá o dobro de motivos para brigar, além de se confundirem o tempo todo:

– Aquela fulaninha tá ligando pra você de novo.

– De novo não, naquela época não tinha telefone. E você, já deu pro Betão?

– Dei, mas foi na outra vida.

– Acho que a gente tá passando pela crise dos sete séculos…

Mas… e se a outra pessoa não acredita em reencarnação, acha essas coisas uma grande bobagem, acha que você está viajando na maionese, e aí? O que você faria? Tentaria fazer com que ela lembrasse, sugerindo, por exemplo, uma terapia de vidas passadas? Ou se conformaria e deixaria para lá? E se de repente você se pegasse agindo de forma estranha, culpando a pessoa por coisas da outra vida?

Esse é justamente o tema central do meu romance. Nele, no entanto, a ideia da reencarnação funciona como um gancho para uma outra ideia: a multidimensionalidade do ser, em que a consciência não está restrita ao corpo físico nem ao tempo presente, mas atua simultaneamente em várias dimensões do tempo-espaço. A vida de Luca e Isadora no século 16 influencia suas vidas no século 21 e vice-versa, como se o “eu” existisse em mais de uma vida ao mesmo tempo e elas estivessem conectadas.

É uma ideia bem louca, eu sei, eu sei. Mas tem seu charme, admita.

.

Ricardo Kelmer 2011 – blogdokelmer.com

.

.

O Irresistível Charme da Insanidade
Romance – Arte Paubrasil, 2011
14 x 21 cm – 160 pag – ISBN: 9788599629352

Um músico obcecado pelo controle da vida. Uma viajante taoísta em busca da reencarnação de seu mestre-amante do século 16. O amor que desafia a lógica do tempo e descortina as mais loucas possibilidades do ser.

Mais sobre o livro e trilha sonora

Para adquirir o livro

.

.

Blues de luz neon – clipe
(da trilha sonora do romance)

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer(arroba)gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer. (saiba mais)

.

.

Comentarios01 COMENTÁRIOS
.

.


A insanidade está de volta às livrarias

29/04/2011

.

Após alguns anos atuando apenas no circuito editorial alternativo, eis que tô de volta às livrarias: a Editora Arte Paubrasil acaba de lançar meu livro O Irresistível Charme da Insanidade. Os eventos de lançamento acontecerão em Fortaleza (10 a 14mai) e em São Paulo (julho). Os leitores que participaram da promoção de pré-venda receberão seus livros pelo correio no início de maio e poderão ver seus nomes na seção Galeria de Leitores Especiais (pag 157), aqui nesta postagem e na seção do livro neste blog.

A história de Luca e Isadora e seu amor que desafia a lógica do tempo foi publicada pela primeira vez em 1996, pela Editora Universalista (PR). Anos depois reescrevi a história e em 2005 publiquei alguns exemplares por conta própria, em formato de bolso (selo Miragem Editorial). Em 2010 finalmente escrevi a versão definitiva e negociei com a Editora Arte Paubrasil. A essência da história é a mesma mas houve alterações nos personagens e em algumas passagens, o final foi mudado e a narrativa ficou mais cinematográfica.

Este livro tem um diferencial: ele tem uma trilha sonora, composta especialmente pra ele por mim e meus parceiros. Se não for o primeiro, certamente é um dos primeiros casos do tipo na literatura brasileira.

A narrativa cinematográfica revela meu desejo de ver esta história transformada em filme. Vamos ver se algum produtor ou diretor se interessa…

> Mais sobre o livro e trilha sonora

> Pra adquirir o livro

> Lançamento em Fortaleza
.

FALARAM DO LIVRO POR AÍ

Conexões atemporais  – Jornal Diário do Nordeste, Fortaleza, 10.05.11
O herético e o erótico segundo Ricardo Kelmer – Por Jeite Jr., 20.05.11

.

LEITORES ESPECIAIS

Obrigado a todos os leitores que adquiriram este obra antecipadamente na promoção de pré-lançamento (até 24fev2011). Eles ganharam desconto, tiveram seus nomes inseridos na obra e serão os primeiros a receber o livro, pelo correio. Mais que leitores, estas pessoas são grandes incentivadoras do meu trabalho.

Mariana Melo (Maceió-AL), Thais Souza (Manaus-AM), Pat Maria (Salvador-BA), Fernando Veras (Camocim-CE), Paula Izabela (Juazeiro do Norte-CE), Alzira Aymoré, Ana Érika Galvão, Ana Karine Oliveira, Arthur Valente, Eugênio Leandro, Fabiano Brilhante, Glaucia Costa, Iana Bezerra, Marta Aurélia, Monica Fuck, Sandra Macedo, Verônica Guedes, Viviane Avelar (Fortaleza-CE), Meg Lia (Paracuru-CE), Suely Andrade (Brasília-DF), Mardônio Veras (São Luís-MA), Aluska Cavalcanti, Emerson Figueiredo (Campina Grande-PB), Christiane de Oliveira, José Maria Teixeira Jr. (João Pessoa-PB), José Carlos Neves (Belo Horizonte-MG), André de Sena, Rógeres Bessoni (Recife-PE), Joelson Maximiniano (Curitiba-PR), Gabriel Falcão, Maria Emília Lino da Silveira, Pedro Camargo, Regina Coeli Carvalho, Waldemar Falcão, Wilza Mazur (Rio de Janeiro-RJ), Larissa Azevedo (Natal-RN), Arlene Amorim, Edgar Powarczuk, Gisela Symanski (Porto Alegre-RS), Jamile Mileipe (São Carlos-SP), Virginia Mancini (Leme-SP), Antonio Venâncio, Bárbara Leite, Bia Rocha, Celia Terpins, Cesar Veneziani, Graziely Camargo, Kátia Regis Albuquerque, Juliana Cupini, Leopoldo F. Noschese, Lucilene Pacheco, Maria do Carmo Antunes, Renata Regina, Roberta Lossio e Tarcius Guedes (São Paulo-SP), Katiê Ribeiro (Plymouth-Inglaterra), Francisco Fontenele Neto (Lourinhã-Portugal), Luciana Bergstrom (Suécia).

Obrigado também: Gilvanilde Oliveira (Fortaleza-CE). Obrigado pelas observações valiosas: Rosa Emília Costa (Fortaleza-CE), Daniela Ramos (Rio de Janeiro-RJ) e Marcelo Gavini (São Paulo-SP). Obrigado por tudo: Wanessa Bento (Fortaleza-CE).

.

.
Adriana Cardoso (Jundiaí-SP, mai2011)
estreando a seção Insanos Olhares

Envie sua foto com o livro pra rkelmer(arroba)gmail.com

.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

Acesso aos Arquivos Secretos
– Promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer(arroba)gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer. (saiba mais)

.

.

Comentarios01 COMENTÁRIOS
.

01- Uauuuuu…..Parabens pelo novo livro e que este seja um sucesso como os outros que escrevestes…..Bjs e muita paz no coração! Sandra Abou Dehn, Cuiabá-MT – mai2011

02- Parabénsss papai! Tim tim! Beijo_ ;-). Kátia Régis Albuquerque, São Paulo-SP – mai2011

03- Parabéns pelo livro… Sucesso!!! Enorme abraço. Michelle Fávero, São Paulo-SP – mai2011

04- Parabéns, querido! Vc está em SP? Eu estou passando uns dias. Só compro se for pessoalmente!!!!rsrsrssrs Beijos. Maria Theodora, Rio de Janeiro-RJ – mai2011

05- adorei saber de vc. sucesso, sempre. há braços. Iumê Colombo, Brasília-DF – mai2011

06- Viva!!! Abraço. Jamile Mileipe, São Carlos-SP – mai2011

07- VAGABUNDO-MOR! Meus Parabéns, Kelmer… Amanhã é meu aniversário (dia 4) e notícias boas como esta sua, servem como um grande presente! Muito feliz mesmo com esta notícia, garoto! Aquele Abraço. Téo Lorrent, São Paulo-SP – mai2011

08- Parabéns, Kelmer! Octávio Roggiero, São Paulo-SP – mai2011

09- Parabéns! Como não tenho champagne estou brindando com “licor de merda” para dar bastante sorte. Aguardando chegar meu exemplar. bjs. Regina Coeli, Rio de Janeiro-RJ -mai2011

10- Parabéns, muito sucesso com o livro!!! Glauco Wiltenburg Nunes, Rio de Janeiro-RJ – mai2011

11- Olá Kelmer, Fico feliz pela vitória e espero que esse livro publicado seja só o começo de muitos outros. Como escrevi para você a um tempo atrás, sou fã do seu livro “Matrix e o Despertar do Herói” e como combinado, quando você publicá-lo novamente me avisaria. Seria legal se, quem sabe, a mesma editora o publicasse também… Um grande abraço e espero ansioso por comprar esse livro com dedicatória e tudo… Jackson Cruz, Belém-PA – mai2011

12- SINCEROS E EFUSIVOS PARABÉNS! \o/ Creio que estarei presente no lançamento em São Paulo. QUEBRA TUDO! 😉 Abração. Sandro Fortunato, Natal-RN – mai2011

13- Grande Ricardo, PARABÉNS !!!! Orgulhosamente já carimbei a compra. Desejo sucesso total e apareça pelo planalto. Forte abraço. Mauro Galvão, Brasília-DF – mai2011

14- Parabens Kelmer! Mereces nao um mas uma caixa de champangne! Vai rolar ai em julho o salão de turismo e em agosto o Piaui Sampa…creio que vale a oportunidade pra divulgar seu livro… Sucesso! Marcos Fonteles, Parnaíba-PI – mai2011

15- Parabéns,querido! Muito sucesso pra vc! “Xêros” recifenses. Mônica Burkleward, Recife-PE – mai2011

16- Parabéns…vc é demais!!!!! Bj. Regina Lucia Fernandes, Fortaleza-CE – mai2011

17- Parabéns amigo! André Luis Cabral, São Paulo-SP – mai2011

18- grande ricardo, acabei de adquirir seu livro pela paubrasil. aguardo ansiosamente a chegada para devorá-lo. aquele abraço e feliz preço baixo. Aroeira, Belo Horizonte-MG – mai2011

19- Parabéns, Kelmer! Estou aguardando meu exemplar. Pela sinopse enviada, parece apetitoso. Mas… é mesmo! Qd vc vai oferecer champagne em SP? Espero q seja numa 5a feira. Abração, mestre! Maria Emília Lino da Silveira, Paraty-RJ -mai2011

20- Parabéns amigo querido!!! Orgulho!!! Bjks. Ana Karla Dubiela, Fortaleza-CE -mai2011

21- Ricardo querido, Que maravilha! felicidades e muito sucesso ai! Forte abraço daqui. Airam, Belo Horizonte-MG – mai2011

22- Que notícia boa, Ricardo! Parabéns! Caesar Moura, Rio de Janeiro-RJ – mai2011

23- deu vontade de começar a ler agora! pode ir pensando em uma dedicatória… estarei no lançamento pra comprar o meu! boa sorte! Erika Zaituni, Fortaleza-CE – mai2011

24- Tá mais pra mãe do que pra pai. Uuuups, melhor dizendo mãe/pai. Amei a capa, e mais ainda o olhar sensual e misterioso da tigresa – tua Alma. Alma que guia, inspira e borogodoza a Estrada do caminhante musical. Bárbaro, ERRIKÁ, tu é da linhagem dos fininhos mui talentosos. Senti a marca no arriar das malinhas. Nunca te vi, sempre te senti. 🙂 champanhe aberta, brindemos. Beeeeijo e reverência for ever after. Pat Maria, Salvador-BA – mai2011

25- Parabéns Kelmer, por mais essa vitória!! Grande abraço. Cecília Colares, Niterói-RJ – mai2011

26- Nuossa ! Tô ficando chique demais, com meu nome no seu livro. Vai até alavancar as vendas, rsrsrsrsrs. Volta logo, estamos com saudades! Bjs. Maria do Carmo Antunes, São Paulo-SP – mai2011



Religião certa e sexualidade errada

21/04/2011

21abr2011

Com exceção daquelas mais ligadas à Natureza, as religiões atuais foram criadas por homens e refletem a mentalidade patriarcal dominadora

RELIGIÃO CERTA E SEXUALIDADE ERRADA

.
Apesar das críticas que frequentemente faço à religião, alguns leitores religiosos prosseguem acompanhando meu trabalho. Talvez esses consigam separar o Ricardo crítico da religião dos outros Ricardos. Talvez apreciem uma boa discussão e percebam como é saudável para a humanidade confrontar diferentes pontos de vista. Talvez até mesmo aproveitem meus argumentos para questionar suas próprias crenças – e ousar questionar a si mesmo será sempre um valioso exercício de liberdade. Fico feliz com isso, claro, pois acredito verdadeiramente que podemos conviver e aprender com nossas diferenças.

Não gosto de religião e não escondo isso. Considero a religião uma ameaça à liberdade pessoal e à harmonia entre os povos, além de ser um perigo para a democracia. Com exceção daquelas mais ligadas à Natureza, as religiões atuais foram criadas por homens e refletem a mentalidade patriarcal dominadora, com sua mania de conquista e seu eterno medo do feminino.

Já a religiosidade pessoal é outra coisa: é um anseio legítimo do ser, é o modo pessoal que alguém tem de lidar com o grande mistério da vida. Penso que num estágio mais avançado de evolução da espécie, o grande mistério será reverenciado de modo particular, no altar silencioso da intimidade de cada um, e não mais precisaremos de religiões institucionalizadas e seus aproveitadores da fé nem tentaremos converter ninguém, pois já teremos compreendido que todas as maneiras de entender o mistério são verdadeiras.

Uma analogia possível seria com a sexualidade. Cada um de nós tem a sua própria sexualidade e, se a analisarmos bem de perto, veremos que ela é absolutamente única e que ninguém mais no planeta inteiro possui a mesma forma de viver o desejo sexual, com todas as mesmas nuances e contradições. Qual de todas essas sexualidades seria a única legítima e verdadeira, aquela que todos deveriam ter? Evidentemente nenhuma. Porque sempre que tentamos enquadrar a sexualidade, ela se mostra maior e mais complexa que qualquer critério de classificação. Assim, não faz nenhum sentido querer convencer alguém a adotar uma sexualidade certa ou abandonar uma sexualidade errada, pois todas são manifestações legítimas da rica e diversa natureza humana.

Deixemos que cada um viva sua própria sexualidade e sua própria religiosidade. No entanto, rejeitemos toda tentativa de nos fazer crer que este ou aquele jeito de viver a sexualidade ou o mistério é que é o certo. O certo mesmo é nos aceitarmos uns aos outros.
.

Ricardo Kelmer 2010 – blogdokelmer.com

.

.

LEIA NESTE BLOG

Entrevista com o ateu – Um pregador evangélico entrevista um escritor ateu

Bem vindo ao clube dos excomungados – Para a Igreja o pecado de estuprar ou assassinar alguém é menor que o de praticar um aborto

Memórias de um excomungado – Eu jamais havia cogitado a ideia de que era possível não ter religião ou não acreditar em Deus

Religião no esporte é gol contra – Se nada for feito, a religião invadirá os campos e quadras e o esporte virará uma cruzada entre os jogadores e seus deuses

As crianças transexuais – Putz, que espécie louca, a humana. O que ainda haverá para descobrir sobre nós?

A noiva lésbica de Cristo – Se hoje a sexualidade feminina ainda apavora a mentalidade cristã, no século 17 ela era algo absolutamente demoníaco

.

AFINIDADES

Entrevista: Fundador de grupo de ‘cura de homossexuais’ que se assumiu gay – Entrevista com Sergio Viula para o site eleicoeshoje.com.br, 25.10.11

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

Acesso aos Arquivos Secretos
Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

 COMENTÁRIOS
.


Shopping das vidas passadas

06/04/2011

06abr2011

Quer dizer que mil anos depois eis-me aqui fazendo a mesma coisa que eu fazia naquelas noites frias das estepes russas, conjeturando sobre o tempo?

SHOPPING DAS VIDAS PASSADAS

.
Descobri uma vida passada minha. Foi por volta do ano 875 da era comum, numa região central da Rússia. Fui uma sacerdotisa pagã, que fazia uso da magia para curar. Eu tinha uma visão da vida voltada para a procura da verdade e da sabedoria. Através do conhecimento atingi a certeza de uma vida futura. Embora fosse vista como uma sonhadora, nunca perdi a fé.

Esta era eu. Pelo menos foi o que o Mago disse. Conheci o Mago quando passeava pelo shopping, tentando esquecer o aluguel atrasado. Deparei-me com ele à entrada de uma loja de produtos místicos e religiosos, era um boneco enorme com um cartaz pregado nele: “Conheça sua vida passada”.

Não resisti. Entrei na loja e comprei uma ficha, que enfiei na barriga do Mago. Na pequena tela de computador surgiram as orientações, digite seu nome, sexo e data de nascimento. Digitei, aguardei e saiu um papel. O Mago me dizia que eu estava viajando no tempo através dos segredos contidos nas tabelas de Rama-Mu, elaboradas pelos antigos sacerdotes da Ilha de Páscoa, e que eu poderia obter respostas para muitos de meus por quês, assim mesmo, por quês separado. Vamos relevar, talvez os sacerdotes pascoais não dominassem muito bem o português.

Li a descrição da minha vida passada, guardei o papel no bolso e saí, eu e os meus velhos porquês de sempre, que os sacerdotes não conseguiram explicar. Pelo contrário, agora eu tinha mais uma dúvida a me coçar a orelha: como aquela bruxa que eu fui conseguiu a tal da certeza da vida futura? Ela sabia que, mil anos depois, renasceria como homem?

Bruxa poderosa. Sentada diante da fogueira, ela viajou no tempo e se viu homem, vivendo num país que se chamaria Brasil, escrevendo crônicas sobre… sobre o tempo. Hummm, quer dizer que mil anos depois eis-me aqui fazendo a mesma coisa que eu fazia naquelas noites frias das estepes russas, conjeturando sobre o tempo, exercitando as possibilidades, buscando atalhos nas conexões temporais?

Se é assim, então talvez eu esteja agora fechando o círculo. A bruxa que fui acessou sua vida futura, e agora eu acesso a dela. Círculo fechado. Mas e agora? Era para acontecer algo, não? Um clarão, um raio a iluminar tudo em volta…

Hummm, talvez não seja um círculo… Talvez seja uma espiral… Isso mesmo, uma espiral que me faz passar pelo mesmo ponto de compreensão, mas num nível acima, onde mudarei minha percepção da realidade e despertarei fora da Matrix…

Uau! Captei! Meu aluguel atrasado não existe. Era tão somente criação da minha mente. Uau, uau! É isso mesmo! Agora tudo faz sentido!

Obrigado, sacerdotes da Ilha de Páscoa. Vocês não imaginam como aquele aluguel atrasado estava me tirando o sono. Ufa. Agora só preciso convencer a proprietária do apartamento a dar uma voltinha no shopping. Ela precisa bater um papo com o Mago.
.

Ricardo Kelmer 2005 – blogdokelmer.com

.

.

LEIA TAMBÉM

O redemoinho do fim do mundo – É provável que estejamos à beira de um grandioso marco evolutivo, onde a humanidade alcançará o clímax dessa aceleração das transformações

Meu fantasma predileto – Diziam que era a alma de alguém que fora escritor e que se aproveitava do ambiente literário de meu quarto para reviver antigos prazeres mundanos

Alma una (clipe musical) – Na doce magia da noite, minha alma é noiva desse ritual

Quando os homens não voltam pra casa – Javier Viegas é tarólogo e resolve problemas do Além. Dessa vez uma moça deseja reencontrar o namorado que foi supostamente atraído por uma bela princesa para dentro de um quadro de parede

O menino e o feminino misterioso – Esse instante numinoso em que o Feminino Sagrado mostrou-se para mim, sob a meia-luz de seu imenso mistério

O presente de Mariana – A cabocla Mariana, entidade da Umbanda, propõe noivado ao moço Dedé. Noivar com ela significa conseguir estabilidade financeira mas em troca ela exige fidelidade absoluta
.

DICA DE LIVRO

ICI2011Capa-01dO Irresistível Charme da Insanidade

Dois casais, nos séculos 16 e 21, vivem duas ardentes e misteriosas histórias de amor, e suas vidas se cruzam através dos tempos em momentos decisivos. Ou será o mesmo casal?

Luca é um músico, obcecado pelo controle da vida, que se envolve com Isadora, uma viajante taoísta que acredita ser ele a reencarnação de seu mestre e amante do século 16. Ele inicia uma estranha aventura onde somem os limites entre sanidade e loucura, real e imaginário e, por fim, descobre que para merecer a mulher que ama terá antes de saber quem na verdade ele é.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer
(saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- Parabens,Ricardo Kelmer. Vilma Galvão, Braga-Portugal – mai2015

02- rsrsrs… ….. não sei não, mas algo me diz que é melhor vc arrumar logo essa grana e pagar o aluguel… ..abs! Arnaldo Afonso, São Paulo-SP – mai2015

03- que maravilhaaa, vamos falar sobre ? Bianka Emiliano, João Pessoa-PB – mai2015

04- Saudades dos seus contos mirabolantes, Ricardo Kelmer. Kd o guru sem futuro? Ana Claudia Domene Ortiz, Albuquerque-EUA – mai2015

05- Muito bom! Fez-me lembrar um sonho recente que acordei rindo da minha viagem onírica! Adoro essa tua pegada literária surreal! Kkkkk. Ivonesete Zete, Fortaleza-CE – mai2015

06- Haha, e ela foi lá se consultar com o Mago, Ricardo?… Espero que sim. Waldemar Falcão, Rio de Janeiro-RJ – mai2015

ShoppingDasVidasPassadas-01c

 


O redemoinho do fim do mundo

07/12/2010

07dez2010

É provável que estejamos à beira de um grandioso marco evolutivo, onde a Humanidade alcançará o clímax dessa aceleração das transformações

ORedemoinhoDoFimDoMundo-01.
O REDEMOINHO DO FIM DO MUNDO

.
Sei que corro o risco de parecer alarmista ou esquisotérico, mas eu sinceramente acho que em poucos anos a Humanidade poderá viver um acontecimento muitíssimo sério, desses que dividem a História em antes e depois. Antes de prosseguir, deixe-me dizer logo que sou ateísta e não tenho nenhuma religião, ok? Pois bem, continuemos. O motivo de eu pensar assim vem de vários lados, mas principalmente da análise dos grandes saltos evolutivos da Humanidade e do ritmo em que ocorrem.

Vejamos. O surgimento da linguagem (dois milhões de anos atrás), o controle do fogo (500 mil anos), a agricultura (12 mil anos), a escrita (5 mil anos), a democracia (3 mil anos), as grandes navegações (500 anos), a revolução industrial (200 anos), as comunicações (100 anos), a revolução digital (40 anos), a internet (15 anos)… Todos esses acontecimentos são marcos evolutivos da Humanidade e representam, inegavelmente, grandes e decisivas transformações no mundo. Há, porém, um detalhe intrigante: o ritmo em que eles ocorrem está cada vez mais veloz.

Essas grandes mudanças, que antes levavam milênios ou séculos para se sucederem, agora ocorrem a intervalos cada vez menores, a ponto de, atualmente, uma pessoa presenciar durante sua vida duas ou três imensas transformações no mundo, dessas que mudam tudo. Além disso, essas mudanças alcançam cada vez mais pessoas no mundo inteiro e são cada vez mais transformadoras. A continuar esse ritmo, como será? As sociedades conseguirão lidar com tantas e imensas transformações em tão pouco tempo? Como organizar a vida se tudo muda tão rápido e tão radicalmente?

Imagine um redemoinho. A cada volta, a água gira cada vez mais rápido, né? Pois bem. É como se a História fosse um redemoinho de transformações a ocorrer em ritmo cada vez mais acelerado, cada vez mais, até que… Até que o quê? Bem, num redemoinho, tudo que há nele é tragado quando chega ao fim. Estaremos chegando ao fim do redemoinho? E, depois, o que acontecerá?

Pô, se já é difícil falar do fim do mundo, imagine do que virá depois. Fiquemos, por enquanto, no redemoinho, mais precisamente no fim dele. A minha séria desconfiança é de que nos aproximamos do clímax dessa aceleração das transformações, e que o acontecimento, ou os acontecimentos que virão serão decisivos a tal ponto que significarão uma espécie de fim do mundo, ou melhor, o fim do mundo como o percebemos, o fim da realidade e de nós mesmos como até hoje entendemos.

O fim do mundo, então, seria isso, um violentíssimo choque de percepção coletiva. E o que exatamente ocasionará esse choque? Um inédito evento cósmico? Uma supercatástrofe ambiental? Ou uma guerra mundial de motivações religiosas? Seria um revolucionário experimento científico? A descoberta de novas formas de vida ou de novos níveis de realidade? O contato com uma forma desconhecida de inteligência? Um colapso do sistema financeiro? Ou o surgimento de uma noção de cidadania planetária capaz de derrubar governos e fronteiras? Tudo isso junto? Nada disso?

Não é apenas o ritmo cada vez mais acelerado das transformações que me faz desconfiar de que estamos no fim do redemoinho. A ciência, por exemplo, projeta para breve vários acontecimentos radicais como o esgotamento dos recursos naturais do planeta. A astrologia, por sua vez, nos diz que vivemos exatamente agora a mudança da Era de Peixes para a Era de Aquário. E há a questão das profecias. Sim, o fim do mundo já foi previsto várias vezes e o danado continua de pé, eu sei. Porém, entendo as profecias apocalípticas como a expressão natural de uma percepção inconsciente do fato de que um dia chegaremos ao fim do redemoinho. Em outras palavras: nós humanos sempre pressentimos, sem saber explicar direito, a chegada desse momento em que a aceleração das transformações chegará a tal ponto que, tchum!, isso significará o drástico fim do nosso senso comum da realidade. As datas estavam erradas, é verdade, mas a percepção sempre esteve correta.

Há algo mais na questão das profecias. Uma profecia tem mais chance de se realizar quanto maior for o número de indivíduos que acreditam nela, pois quem crê numa profecia naturalmente deseja, ainda que inconscientemente, que ela se realize. Isso significa que se boa parte da Humanidade atual crê que chegou o fim dos tempos, provavelmente muitos seriam capazes de fazer algo para provar que sua crença é verdadeira, que é essa a vontade de seu deus. A pergunta então é: que parcela da Humanidade acredita, e consequentemente deseja, que vivemos o fim do mundo? Bem, a julgar por tudo que se lê e ouve, os livros e filmes, as notícias, os discursos religiosos, a Humanidade está, no mínimo, obcecada pelo tema.

Por essas e outras é que desconfio que o fim do redemoinho está bem próximo. Talvez nos próximos anos. Quem sabe em 2012.

.
Ricardo Kelmer 2010 – blogdokelmer.com

.

.

LEIA NESTE BLOG

> Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos – O que fazer quando de repente o inexplicável invade nossa realidade e velhas verdades se tornam inúteis? Para onde ir quando o mundo acaba?

> As máquinas não são bobas – Já existe uma geração de máquinas com certo grau de autonomia necessária pra tomar decisões que podem ou não seguir o que lhes foi ensinado

.

LIVROS, FILMES E SITES

– O Buraco Branco no Tempo (Peter Russel)
Editora Aquariana, 1992
As ideias deste livro inquietante nos levam a pensar sobre o tempo de uma forma diferente e nos faz exercitar uma nova maneira de nos percebermos, como espécie, dentro do contexto da evolução e do Cosmos. O físico Peter Russel, numa linguagem acessível, mostra porque a atual crise da Humanidade é, na verdade, uma crise de percepção, e chama a atenção para o ritmo vertiginoso da atual evolução tecnológica. Podemos, neste momento, estar à beira de um decisivo salto de compreensão a respeito do tempo e de nós mesmos. Assista o filme (26 min).

– O Ponto de Mutação (Fritjof Capra)
Editora Cultrix, 1983
Prosseguindo em seus estudos, Capra mostra como as ciências já estão falhando por insistir em seguir o modelo newtoniano/descartiano de interpretação da realidade e sugere que a Humanidade está vivendo uma decisiva transição em sua evolução. Especificando a situação de diversos ramos da ciência, como medicina, psicologia e economia, Capra escreveu uma das mais importantes obras do nosso século, indispensável ao estudioso do pensamento holístico e dos novos paradigmas que lentamente estão, não substituindo, mas complementando os atuais.

Introdução ao Apocalipse (Robin Robertson)
Editora Cultrix, 1997
A ideia de Deus é um dos principais arquétipos da Humanidade, existente em todas as culturas. Através da Bíblia, ainda que esse não seja seu objetivo oficial, é possível acompanhar como evoluiu a relação da Humanidade com sua ideia de Deus, desde Adão até os dias de hoje. Este livro narra de forma brilhante a saga da transformação da consciência humana e reabilita um dos mais importantes porém menos compreendidos documentos da civilização ocidental: o Livro do Apocalipse, esmiuçando todo o seu rico simbolismo através das delicadas ferramentas da psicologia junguiana.

> ATEA – Assoc. Bras. de Ateus e Agnósticos – Vale a pena conhecer. Ou você tem medo de mudar de ideia?

> Zeitgeist (Direção: Peter Joseph. EUA/2007) Este filme mostra o quanto a história é manipulada pelas elites religiosas e econômicas, que “criam” os fatos e nos fazem todos acreditarmos neles, lutarmos por eles, matarmos por eles. Veja o filme Zeitgeist

Por que 2012? Entenda como funciona o calendário maia – Revista Superinteressante, nov2012

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos

Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- É…tem lógica! 🙂 Mônica Burkle Ward, Recife-PE – dez2010

02- Paranóia delirante! Tudo isso q vc postou para levar à conclusão q vc deseja é fruto do conhecimento q vc possui. Agora imagina o q vc desconhece? Quem tem certezas está mal informado, pois sempre existe um fato que interfere no processo conclusivo, o que existe neste instante é o momento. E ele está em constante movimento. Adapte-se! Flua. Abandone as certezas. Vc e seus próximos serão mais felizes. O excesso de informações trava nosso processamento de pensar corretamente, aí nosso raciocínio nos engana levando-nos a conclusões erradas e muitas vezes em direção aos nossos medos. Esclareça-se: descubra seus pontos fracos para proteger-se de si mesmo. Paz, saúde, bons sonhos & saravá! 😀 Wener Marq, Alegre-ES – dez2010

03- É impressionante como os que se dizem “ateus” SÃO ESPIRITUALISTAS !!! Daria uma ótima tese !!! rsr sr O trecho abaixo relata muito bem o quanto que você inconscientemente e muito bem inspirado pelo NOSSO CRIADOR, descreve o que nós espíritas kardecistas já sabemos desde que o “consolador prometido por Jesus que chegou em 1857, ou seja, a doutrina espirita kardecista …. NAÕ COMO FIM TOTAL DO MUNDO ou do planeta terra, MAS, O FIM DE UM MUNDO DE PROVAS E EXPIAÇÕES .. e aos poucos tornando UM MUNDO DE REGENERAÇÃO … ESTAS MUDANÇAS SE FAZ NECESSÁRIAS CONFORME OS PLANOS DE “DEUS” Sds kardequianas. Lucimar Rabello, Vila Velha-ES – dez2010

RK: Sou ateu porque não creio na existência de divindades. Porém, não sou materialista no sentido de achar que não existe nada além da matéria. Quanto à questão do fim do mundo, essa ideia não começou com Kardec, nem com Jesus, nem com qualquer outro profeta. Ela é um arquétipo presente na psique humana, e isso nada tem a ver com religião. Entendo o Universo como uma mente, única, e as nossas mentes são expressões manifestadas dessa mente. Assim sendo, cada um de nós sabe, conscientemente ou não, dos ciclos de transformação do Universo e, por isso, “sabemos” que o mundo irá acabar. Mas o que irá acabar é o mundo como nossa mente o entende, a realidade como nós aprendemos a captá-la. Ou seja, o fim do mundo é uma transformação da percepção da realidade para um novo nível de percepção.

04- Adorei como sempre vc se supera…beijos amigo. Liz Fernandes, São Paulo-SP – dez2010

05- O que tu escreveu, brother maluquinho, sinto nas tripas. Sinto, tremo, farejo logo existo!!! 🙂 Patrícia Lobo, Salvador-BA – dez2010


Meu fantasma predileto

01/08/2010

01ago2010

Diziam que era a alma de alguém que fora escritor e que se aproveitava do ambiente literário de meu quarto para reviver antigos prazeres mundanos

MeuFantasmaPredileto-02

MEU FANTASMA PREDILETO

.
Alguém aí pode me dizer onde estão os fantasmas? Onde foram parar as almas penadas que rondavam os cemitérios em noite de lua? E aqueles bichos horrendos que vinham do canto escuro aterrorizar as crianças desobedientes, onde se meteram? De repente não existem mais. Parece que não há mais lugar para eles nesse mundo de assaltantes, sequestradores, assassinos e ladrões de órgãos. Em vez de alma penada, gangues que roubam tênis de crianças e terroristas religiosos que explodem prédios e espalham gases letais em nome de seu deus.

Nas pequenas cidades do interior talvez ainda seja possível encontrar algum fantasminha, resistindo bravamente à invasão dos novos terrores coletivos. Os fantasmas certamente se sentem constrangidos em viver num mundo onde ETs sanguinários estão infiltrados entre nós. Como rivalizar com um bicho gosmento que desce de poderosas naves e implanta chips na cabeça das pessoas para monitorar a raça humana? Isso, sim, é maldade. Assustar pessoas no silêncio das madrugadas é besteira.

Lá em casa morava um fantasma. Não tenho foto dele, mas pergunte para qualquer um lá de casa e terá a confirmação. Ele se manifestava em meu quarto e já havia naturalmente se incorporado ao folclore da família. Diziam que era a alma de alguém que fora escritor e se aproveitava do ambiente literário de meu quarto para reviver antigos prazeres mundanos.

Todos da casa já haviam escutado o som de minha velha Remington, tec-tec-tec no meio da madrugada. No outro dia, ao saberem que eu sequer dormira em casa, constatavam: foi o fantasma novamente. E assim ele (ou ela, vai saber) passou a fazer parte da família. E quando algum hóspede desavisado comentava que ouvira o som de uma máquina de escrever de madrugada, minha mãe então contava do fantasma, de um jeito natural e até com certo orgulho, como uma avó fala das traquinices do neto. Todos tinham certo medo, é claro, e jamais entravam sozinhos em meu quarto à noite. Mas durante anos, ao almoço, a família reunida naqueles sagrados desentendimentos, o fantasma foi garantia de humor e descontração.

Eu, particularmente, adorava a ideia desse insólito companheiro de quarto e não sentia medo. Muitas vezes pedi-lhe encarecidamente que aparecesse, mas nunca vi nem escutei nada. Um belo dia, sumiu. Simplesmente sumiu, ninguém mais escutou o tec-tec-tec de suas visitas. Várias versões surgiram: ele cansou de tentar fazer-me um escritor de sucesso, ela não aturava as minhas namoradas, e por aí vai…

Minha versão, durante algum tempo, era que meu fantasma de estimação foi embora porque não gostou quando troquei minha máquina de escrever por um computador. Deduzi que a tecnologia o expulsara definitivamente deste mundo cada vez mais cheio de teclas e senhas digitais. Mas depois entendi que isso seria subestimar a classe dos fantasmas. E, assim, voltei à estaca zero, e o mistério do sumiço do fantasma prossegue até hoje.

Talvez os fantasmas estejam tão confusos quanto nós, tentando entender o que foi feito daquele mundo em que eles brincavam de nos assustar e nós adorávamos sentir medo. Hoje nosso medo não tem graça nenhuma.
.

Ricardo Kelmer 1998 – blogdokelmer.com

.

> Esta crônica integra o livro A Arte Zen de Tanger Caranguejos

.

LEIA NESTE BLOG

ICI2011PirataoCapa-01Piratearam meu livro novo. Eu rio ou choro? – Já que tem cópia pirata solta por aí, prefiro que você, que é leitor do meu blog, leia a pirata certa

O escritor grávido – Será um lindo bebê, digo, um lindo livrinho, sobre o mais belo de todos os temas

Você vem sempre aqui? (1) – Os termos que trazem as pessoas ao Blog do Kelmer

O dilema do escritor seboso – Certos escritores amadurecem cedo. Tenho inveja desses. Porque nunca viverão o constrangimento de não se reconhecerem em suas primeiras obras

Kelmer Com K no Toma Lá Dá Cá – Aqueles aloprados moradores do condomínio Jambalaya descobriram meu livro maldito

O pop pornográfico de RK (André de Sena) – Pode-se afirmar que Kelmer já é dono de um estilo próprio (no fundo, uma das almejadas metas de todo escritor)

Pesadelos do Além – O pior pesadelo pra um escritor é ser psicografado. Ou melhor: ser mal psicografado

O encontrão marcado – Fechei o livro, fui até a janela e olhei para o mundo lá fora. E disse baixinho, com a leveza que só as grandes revelações permitem: tenho que ser escritor

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

Acesso aos Arquivos Secretos
Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- Achei muitissimo bem escrito, tao engracado e tao triste ao mesmo tempo, e verdadeiro. SIMPLESMENTE O-TI-MO! Ana Claudia Domene, San Diego-EUA – jun2006

02- adorei a historia de seu fantasma predileto. Monica Campos, Fortaleza-CE – jan2016

03- Gostei. Bons tempos em que os sustos eram de mentirinha. Teo Ponciano, São Paulo-SP jan2016

04- Alguém sabe dizer onde se meteram os fantasmas? Teo Ponciano, São Paulo-SP – jan2016

05- Relembrei meus tempos de infância no interior onde cresci. As pessoas de fato se empolgavam ao contar os “causos”q envolviam fantasmas. Alguns lugares as pessoas evitavam de passar a noite. O Ribeirão era assombrado e isto alimentava a fantasia daquele povo simples e feliz. Saudade dos nossos fantasmas q nunca fizeram mal a ninguém. Carolina De Figueiredo, Içara-SC – mai2016


A mensagem de Avatar ao Povo da Terra

28/01/2010

28jan2010

Temos de compreender o que os antigos já sabiam e nós esquecemos: a Terra é um ser vivo e nós fazemos parte dele

A MENSAGEM DE AVATAR AO POVO DA TERRA

.
Muitos aplausos merece James Cameron por seu filme Avatar. Se o cinema já é uma experiência meio onírica, agora, com as técnicas de filmagem para a tecnologia 3D criadas pelo diretor, avançamos ainda mais dentro do sonho. Pena que, quando acaba o filme, estamos de volta ao nosso pesadelo terráqueo, do qual não conseguimos acordar.

A história de Avatar é simples: os humanos, interessados num valioso mineral existente na lua Pandora, invadem a terra de um povo humanoide, que se defende bravamente e conta com a ajuda fundamental de um humano que vira a casaca e passa a lutar ao seu lado. O roteiro não tem atrativos maiores e chega a ser previsível. Os personagens vestem os velhos modelões: tem o mocinho que se transforma ao longo da história, a mocinha que gosta dele, outro cara que gosta dela, o vilão malvado que morrerá no embate final…

Então, Avatar teria como único destaque os efeitos especiais, aperfeiçoados pela nova tecnologia 3D? Não. O filme tem o grande mérito de focar com competência na questão ecológica, e o faz em duas frentes: no visual exuberante do mundo de Pandora e na conexão mística de seu povo, os Na´vi, com a Natureza. Em Avatar, o 3D nos entretém e sempre rouba a cena, é verdade, mas a mensagem ecológica fica em nossa mente após o filme. E é isso que importa.

Toda a força do povo Na´vi vem do fato deles entenderem Pandora como um ser vivo que se comunica com tudo que nele vive, inclusive com os Na´vi, que não apenas o habitam mas são parte integrante desse ser. Eles vivem de forma harmoniosa com Pandora porque é assim que se sentem, unos com ela, e por isso sua relação com tudo que vive é de um respeito carregado de sacralidade, devoção e gratidão, como se fosse uma religião. Ops! Chegamos a uma das melhores coisas de Avatar: a religião dos Na´vi, se é que podemos chamar de religião, é a própria Natureza.

E aqui na Terra, fora da tela? Aqui, seguimos em nosso pesadelo real. O Homo sapiens, a única espécie sobrevivente da linhagem hominídea, vive um momento evolutivo decisivo: ou se entende já com a Natureza ou então procura outro lugar para morar. Putz, por que chegamos a esse ponto lamentável? A resposta estaria prontinha na boca de qualquer Na´vi: Porque vocês se separaram da Natureza. E não poderemos discordar. É justamente porque nos entendemos separados da Natureza que desrespeitamos as leis do planeta onde vivemos, e achamos que escaparemos impunes. Não escaparemos porque, sendo parte da Terra, ao destruí-la estamos também destruindo a nós mesmos.

Repensar a forma como nos percebemos em relação à Terra e a nós mesmos, é disso que precisamos, urgente. Temos de compreender o que os antigos já sabiam e nós esquecemos: a Terra é um ser vivo e nós fazemos parte dele. Se você pensou agora na teoria de Gaia, é isso mesmo. Segundo a teoria, a Terra é um superorganismo vivo, autoconsciente, dotado de inteligência própria, capaz de se autorregular e que, como tudo que vive, busca o equilíbrio interno. E nós, assim como tudo que vive na Terra, fazemos parte desse equilíbrio. Infelizmente, o Homo sapiens civilizado desprezou o que seus antepassados sabiam, e o preço disso pode ser seu próprio extermínio, como outras tantas de espécies que não souberam se adaptar ao equilíbrio geral do organismo maior.

Religiões gostam de cultuar deuses distantes, entidades inalcançáveis, tudo muito longe daqui. Talvez seja o momento de focar mais perto em nossa busca pelo Sagrado. Se existe algum tipo de religiosidade que pode nos salvar a todos, ela se resume ao amor pelo planeta e pela Humanidade. Uma religiosidade sem deuses, templos ou dogmas. Sem salvadores, pecados originais, guerras santas, e sem dízimo. Uma religiosidade cuja salvação virá de uma profunda mudança de percepção – ou não virá.

Ah, mas como cuidar de algo que não é de ninguém e no qual todo mundo mete a mão? De que adianta alguns terem essa noção sagrada da Terra se outros não têm e esses continuam a desrespeitá-la? Chegamos à conclusão inevitável, que é a mensagem mais importante de Avatar: só cessaremos o desequilíbrio do organismo geral se agirmos como organismo geral. Em outras palavras, é somente nos entendendo como um povo só, o Povo da Terra, que poderemos cuidar devidamente da Terra e de nós mesmos. Enquanto formos vários povos, vários países e várias religiões, não alcançaremos a visão do todo. Enquanto houver fronteiras, religiões e outras noções separatistas, não nascerá a unidade necessária para agirmos em conjunto. Somente quando surgir o Povo da Terra é que haverá salvação para o Homo sapiens.

.
Ricardo Kelmer 2010  – blogdokelmer.com

.

PALESTRA
Este texto é o resumo da palestra que fiz no Encontro de Cinema, um dos eventos integrantes do 17o Encontro da Nova Consciência, festival de caráter multicultural que acontece desde 1992, durante os dias de Carnaval, na cidade de Campina Grande, na Paraíba.

.

.

AVATAR – TREILER

.

FILMEAvatarCartaz-01AVATAR – FICHA TÉCNICA

Avatar
Diretor:
James Cameron
Elenco: Sam Worthington, Sigourney Weaver, Michelle Rodriguez, Zoe Saldana, Giovanni Ribisi, Joel Moore
Produção: James Cameron, Jon Landau
Roteiro: James Cameron
Fotografia:
Mauro Fiore
Trilha Sonora: James Horner
Duração:
150 min
Ano: 2009  –  País: EUA
Gênero: Ação  –  Distribuidora: Fox Film
Estúdio: Twentieth Century-Fox Film Corporation / Lightstorm Entertainment / Giant Studios
Classificação: 12 anos

.

.

LEIA NESTE BLOG

A imagem do século 20 – Vimos nossa morada flutuando no espaço. Vimos um planeta inteiro, sem divisões. Não vimos este ou aquele país: vimos o todo

Minha noite com a Jurema – Nessa noite memorável, fui conduzido para dentro de mim mesmo pelo próprio espírito da planta, que me guiou, comunicou-se comigo, me assustou, me fez rir e ensinou coisas maravilhosas

Xamanismo de vida fácil – A tradição xamânica dos povos primitivos experimenta uma espécie de retorno, atraindo o interesse de pesquisadores e curiosos

Pátria amada Terra – É animador ver as novas gerações convivendo mais naturalmente com essa noção de cidadania planetária

WikiLeaks e o nascimento da cidadania global – Quanto mais as pessoas se conectam à internet, mais elas se entendem como participantes ativos dos destinos do mundo e não apenas de seu país

Uma bandeira diferente – As pessoas saudavam o nascimento do novo símbolo que emergia do fundo da alma de todos falando de paz e unicidade, de um mundo unido e sem divisões

.

DICA DE LIVRO

LIVROOBuracoBrancoNoTempo-01O Buraco Branco no Tempo
Peter Russel – Editora Aquariana, 1992

As ideias deste livro inquietante vão além de muitas compreensões padronizadas que temos a respeito da vida. Elas nos levam a pensar sobre o tempo de uma forma diferente e nos fazem exercitar uma nova maneira de nos percebermos, como espécie, dentro do contexto da evolução e do Cosmos. O físico Peter Russel, numa linguagem acessível, mostra porque a atual crise da Humanidade é, na verdade, uma crise de percepção, e chama a atenção para o ritmo vertiginoso da atual evolução tecnológica. Podemos, neste momento, estar à beira de um decisivo salto de compreensão a respeito do tempo e de nós mesmos.

> Teoria de Gaia na Wikipedia

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- adorei o artigo sobre Avatar. Voce pegou o ponto central da questao… e o pior é que esta é uma sindrome bem comum desde uma escala pequena (ruas e pracas) ate a escala global. Temos esta ideia que somos meros visitantes, com bilhete pago e direito a faxineiro para colocar tudo de volta como era quando a gente sair… ahh tolos mortais :- ) … Desenvolvemos inteligencias incriveis em tantos campos da vida, mas ficamos tao especializados que estamos cada vez menos sabios para entender o todo e como nos relacionamos com este todo! Roberta Lossio, Recife-PE – jan2010

02- Sintetizadissimo! Depois faço um comentário mais aprofundado. Massa demais. Gabriel Sousa, São Paulo-SP – jan2010

03- êêê…a menina de olhos puxados ressuscitou tua consciencia cósmica!!! Edgar Powrczuk, Porto Alegre-RS – jan2010

04- Gostei muitíssimo. Houve uma sinapse em mim, por volta de dezembro, que me faz viver hoje, justamente, o fim da era separatista e o renascimento pela Unidade… Vou repassar, viu? Amei. Um cheiro. Ana Karla Dubiela, Fortaleza-CE – jan2010

05- Você é simplesmente DEMAIS. Gosto de tudo o que vc escreve, me identifico com seu pensamento holistico de vida e espiritualidade.Te adoro! Beijos. Sandra Neves, Belo Horizonte-Mg – jan2010

06- NÃO TENHO O MENOR INTERESSE NESSA BABAQUICE NEW AGE E MUITO MENOS NAS IDIOTICES PRETENSAMENTE LITERÁRIAS E PRETENSAMENTE ERÓTICAS QUE VC ESCREVE. DESCULPE-ME, MAS VC É UMA FRAUDE! QQ SER HUMANO CAPAZ DE DIZER QUE AVATAR “FICARÁ MARCADO NA HISTÓRIA DAS ARTES” SÓ PODE SE UM DÉBIL MENTAL OU NÃO ENTENDER ABSOLUTAMENTE NADA DE CINEMA OU ARTE. Marcos K, São Paulo -SP – jan2010

07- Que liiindo!!! Não tinha vontade nenhuma de ver este filme, mas este seu artigo me convenceu. É deste Ricaredo que eu gosto, quando fala sério, do universal. Os dois últimos parágrafos estão divinos. Parabéns e muito sucesso nesta palestra do Encontro da Nova Consciência. Muito obrigada. Até que enfim uma luz no fim do túnel. Gilvanilde Oliveira Falcão, Fortaleza-CE – jan2010

08- Amei a cronica sobre a visao de Avatar. Vc ja me fez despertar duas visoes diferentes de filmes: Matriz e agora Avatar. eu amei e ja repliquei. Fabiano Brilhante, Fortaleza-CE – jan2010

09- Todo verdadeiro Xamã é profundamente RELIGIOSO no sentido original e etimológico do que significa ser religioso. Ele e a Natureza são um só. O Espírito Católico/Javético DESLIGA e o Espírito Xamã RELIGA. Hey xamã nordestino!!!!!, Me likes muitão tua ALMA. Tua PANDORA/HELENA/SHERAZADE/PROSTITUTA SAGRADA… Patrícia Lobo, Salvador-BA – jan2010

10- Ainda não assisti ao filme, mas depois dessa crônica, desse final de semana não passa! Mônica Burkleward, Recife-PE – jan2010

11- Caro amigo, é sempre um prazer compartilhar esta percepção de unicidade e de – SINTO-ME FELIZ EM USAR ESTA PALAVRA QUE HÁ TEMPOS EVITO – religiosidade. Sim Na’vi poderia ser nossa Gaia. Somos uno e estamos conectados com o planeta, não compreender isso é buscar o próprio fim. Também tenho feito algumas palestras sobre o tema, e vinculado a educação a distância nesse paradigma de integração. José Lins Jr., Juazeiro do Norte-CE – jan2010

12- O próprio filme, a tecnologia, o cinema como arte, são separações/criações de algo do humano que não estão na natureza. Nós não somos naturais, desde a metáfora da “saída do paraíso”. Não estamos como água na água, como os outros seres vivos, como dizia o George Bataille. E também Hegel: “o homem é a doença do animal”. Diante disso, a única saída é nos conscientizarmos do nosso alto poder destrutivo, inclusive contra nós mesmos e procurarmos soluções de controle e auto gestão pela força, que é a única coisa que é respeitada. Direito, justiça e leis, como coação, desde Kant. O problema é que o capitalismo se tornou maior que os Estados e a sua possível força. A coisa é muito complexa. Adianta o que cada um pode fazer e que, de certa forma, lentamente demais, mas simplesmente impossível de ter-se visto há poucos anos atrás, o discurso ecológico está aí, nem que os que não queiram, que vão utilizá-lo politicamente, não o queiram. O discurso ecológico é o velho silêncio da morte. Contra a morte, ninguém pode, e é isso que acontecerá com o planeta e com a raça humana. Diante da morte, própria, dos amados e odiados, o “povo da terra” vai ter que se unir. Se há alguma coisa ainda natural para o homem é a morte. Então, unam-se “o povo da morte”. Retornarão para a terra, “metafóricaliteralmente”….. Abraço, do amigo. Ronald Paula, Fortaleza-CE – jan2010

13- Adorei, querido! Vou reenviar para meus amigos!!!!! Liz Cristal, São Paulo-SP – jan2010

14- Adorei!!! Linda Mascarenhas, Fortaleza-CE – jan2010

15- Parabens Ricardo pelo seu blog. Maria Christina, Brasília-DF – jan2010

16- Bem, gostei bastante desta mensagem pois olha, assisti ontem a noite o filme Avatar… Muito lindo. Você tem toda razão, é tudo isso e mais um pouco. Realmente a mensagem ecológica fica na memória de quem assisti o filme, e para os mais sensíveis, fica ainda a consciência buscando algo a fazer em prol da natureza. Parabêns, esteja em Paz, sucesso em sua vida. Jaqueline Lima, Ariranha-SP – fev2010

Adorei, querido! Vou reenviar para meus amigos!!!!!Adorei, querido! Vou reenviar para meus amigos!!!!!

Mariana quer noivar

24/01/2010

24jan2010

Você abdicaria das relações amorosas em sua vida em troca de dinheiro ou sucesso na carreira?

MarianaQuerNoivar-04

MARIANA QUER NOIVAR
.

Em 1991, quando eu morava em Manaus, conheci uma entidade da Umbanda que me causou forte impressão: a cabocla Mariana. Anos depois, escrevi um conto sobre ela, O Presente de Mariana, que está em meu livro Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos, publicado originalmente em 1997. É um dos contos de que mais gosto.

A crença em Mariana adquire nuances diversas dependendo da região do país, mas a versão à qual fui apresentado conta que Mariana foi encantada aos dezessete anos e meio, tem a pele branquinha, olhos azuis e cabelo ruivo cor de telha, é bonita, graciosa e brincalhona, e dá conselhos gerais aos que a procuram ‒ mas sua especialidade, digamos assim, é noivar com os homens. Noivar com Mariana significa fazer um pacto com a entidade: ela ensina ao homem a ter sucesso nos negócios, mas, em troca, exige exclusividade em sua vida. Isso significa que o noivo jamais poderá ter qualquer outra mulher, pois Mariana simplesmente não permitirá.

Há vários aspectos interessantes envolvidos na crença. O tema faustiano da venda da alma, por exemplo, está imediatamente visível. É aquela velha história, bem conhecida de nós pobres mortais: que preço estamos dispostos a pagar pelo que desejamos conquistar? Você abdicaria das relações amorosas em sua vida em troca de dinheiro ou sucesso na carreira? Num mundo onde o que importa é ser alguém, mas que seja alguém rico e famoso, muitas pessoas vendem suas almas nesse sentido, priorizando os negócios e a carreira em detrimento de suas relações amorosas, o que as leva a errar por um sem-fim de relacionamentos insatisfatórios. Vencedor nos negócios, infeliz no amor.

Fazendo uso agora da psicologia arquetípica, vemos em Mariana uma versão curiosa do arquétipo da menina-mulher, aquela que, com sua irresistível mistura de inocência, encanto e malícia, nos seduz e nos arrasta pelos redemoinhos das loucas paixões inconsequentes. Seduzido por Mariana, o noivo é guiado por um tipo de sabedoria de ordem racional e prática, e tem sua energia criativa direcionada para o sucesso profissional com tal intensidade que, de fato, ele o consegue, ou seja, Mariana cumpriu sua parte. O pacto funcionou.

Porém, se por um lado Mariana tem essa sabedoria para ofertar, por outro lado ela é uma adolescente geniosa, ciumenta e possessiva. O noivo de Mariana não escapará de seus caprichos. Focado no reino dos negócios, ele adquire a sabedoria racional necessária para se realizar profissionalmente, sim, mas no reino dos relacionamentos ele possui a idade de sua noiva, dezessete anos e meio, uma espécie de limbo evolutivo, um nem lá nem cá da maturidade psicológica em que a ingenuidade, a possessividade e os caprichos infantis não dão espaço a uma relação adulta e sadia. Preso num estágio infantilizado dos sentimentos, o noivo de Mariana inconscientemente boicota seus relacionamentos amorosos com a sua visão ingênua das relações, sua insegurança e seus joguinhos de controle e poder, e ao fim sempre põe tudo a perder. Ele sofre com isso, mas não consegue escapar desse padrão de comportamento, pois jurou ser fiel à sua noiva.

Mariana seria, assim, um complexo autônomo que se instala na psique masculina e desenvolve intensamente a função racional (pensamento), levando o ego a direcionar a atenção aos negócios e conduzindo o indivíduo ao sucesso profissional, ao mesmo tempo que mantém subdesenvolvida a função oposta (sentimento). O noivado com Mariana é, então, um pacto interno e inconsciente que o indivíduo faz consigo mesmo em nome da realização profissional, mas que provoca um perigoso desequilíbrio psíquico. O noivo de Mariana é um indivíduo racionalmente desenvolvido, capacitado para o mundo dos negócios, mas sentimentalmente imaturo. Dê uma olhada nos homens financeiramente muito bem-sucedidos e certamente encontrará entre eles alguns noivos da caprichosa entidade.

E as mulheres? No contexto ritualístico da Umbanda, pelo menos até onde sei, a cabocla Mariana não noiva com mulheres. Entretanto, o fato dela possuir tais habilidades para os negócios, um dom mais ligado ao princípio yang, sugere que ela também possui em sua constituição algum componente masculino. Isso significa que ela é um complexo psíquico dual, dotado de elementos femininos e masculinos, yin e yang. Assim sendo, a mesma dinâmica do processo também ocorre na psique feminina, ainda mais nos tempos atuais em que a mulher já está bem inserida no ardiloso mundo dos negócios. Talvez haja alguma diferença, mas, a rigor, mulheres também assimilam a mesma sabedoria racional encontrada em Mariana para ganhar dinheiro, ao mesmo tempo que também incorporam sua ingenuidade infantil nos relacionamentos, inviabilizando a todos, um atrás do outro.

Mas deixemos de teorizações, vamos ao conto. Espero que você goste e, se quiser comentar, fique à vontade. Com você, a encantadora Mariana…

 

.
Ricardo Kelmer 2010 – blogdokelmer.com

.

A cabocla Mariana, entidade da Umbanda, propõe noivado ao moço Dedé. Noivar com ela significa conseguir estabilidade financeira, mas em troca ela exige fidelidade absoluta

Conto: O presente de Mariana

.

.

LEIA NESTE BLOG

ilha03aA ilha – Uma fábula sobre o autoconhecimento

Livros: He, She, We – Os rios de nossas vidas correm, na verdade, por leitos muito, muito antigos – os mesmos leitos que outras águas, ou outras pessoas, também percorreram

Mulheres na jornada do herói – As mulheres sempre foram, mais que os homens, historicamente reprimidas na busca pela essência mais legítima de suas vidas

Carma de mãe para filha – Os filhos sempre pagam caro pelos pais que não se realizam em suas vidas

Vade retro Satanás – O Mal pode ter mudado de nome e de estratégias. Mas sua morada ainda é a mesma, o nosso próprio interior

Blade Runner – Deuses, humanos e androides na berlinda – Como todo ser, o criador busca sempre transcender a sua própria condição e é criando que ele faz isso

.

DICA DE LIVRO

MatrixEODespertarDoHeroiCapaEdicaoDoAutor-01Matrix e o Despertar do Herói
A jornada mítica de autorrealização em Matrix e em nossas vidas

Usando a mitologia e a psicologia do inconsciente numa linguagem descontraída, Kelmer nos revela a estrutura mitológica do enredo do filme Matrix, mostrando-o como uma reedição moderna do antigo mito da jornada do herói, e o compara ao processo individual de autorrealização, do qual fazem parte as crises do despertar, o autoconhecer-se, os conflitos internos, as autossabotagens, a experiência do amor, a morte e o renascer.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

 Acesso aos Arquivos Secretos
Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

 COMENTÁRIOS
.

01- Muito bom! – Marcos André Borges, Fortaleza-CE – 2010

> Postagem no Facebook

 

MarianaQuerNoivar-04a


Medo de mulher

16/01/2010

16jan2010

Como não temer algo que tem o poder de gerar e nutrir a vida? E, caramba, como não temer um bicho que sangra durante dias e não morre?

MedoDeMulher-03

MEDO DE MULHER

.
Homens que agridem mulheres… Homens que atacam prostitutas, saem na rua atirando em travestis… O que leva um homem a tais selvagerias? Diversos fatores podem estar envolvidos. Mas há um fator mais profundo que todos, mais antigo… É o medo da mulher.

Instintivamente, todo homem teme a mulher. É claro que a maioria dos homens, se perguntado, certamente negará, ou levando a coisa para o lado da piada jocosa ou se irritando com o que ele pensa ser um questionamento de sua masculinidade, oh, a sagrada masculinidade. Calma, meu amigo macho. Esse medo nada tem a ver com homossexualidade. Trata-se do velho temor do feminino, um sentimento arquetípico, que sempre esteve em nossa psique, tão natural quanto o desejo sexual que sentimos pela mulher.

Esse temor existe, sim, e se não o reconhecemos, o danado nos acompanha vida afora, se refletindo em nossa relação com as mulheres. Pior que isso: o medo do feminino faz surgir religiões e sociedades machistas, que reprimem violentamente as mulheres, negando-lhes direitos básicos, tornando-as propriedade dos homens e até mesmo queimando-as em fogueiras. Mas… por que esse temor?

A mulher é um imenso mistério, que o homem jamais alcançará. É o mistério sagrado da própria vida. É através do corpo feminino que a vida se concretiza no plano físico. A mulher é a Natureza humanamente representada em suas curvas, saliências e reentrâncias: ela é o rio sinuoso que hipnotiza o olhar, montes que se elevam graciosos da superfície, cavernas escuras que guardam segredos… É feita de ciclos a mulher, renovando-se a cada lua para em seguida oferecer-se novamente fértil e receptiva. Como não temer algo que tem o poder de gerar e nutrir a vida? E, caramba, como não temer um bicho que sangra durante dias e não morre?

É bem antigo o medo da mulher. Milhões de anos atrás, percebemos que viemos todos de dentro dela – e até hoje isso nos maravilha e assusta. Percebemos também que ela se comporta como a Natureza em suas estações, alternando ciclos, e isso nos fez entender que o masculino é Sol enquanto o feminino é Lua. Se aquele é o mesmo todos os dias, esta não cansa nunca de se experimentar em sua natureza mutante. Se elas são naturalmente iniciadas pela vida, eles não, eles precisam inventar iniciações.

Ao menstruar, a mulher está a repetir, mesmo sem consciência disso, seu íntimo ritual sagrado de fertilidade. Isso tem o poder de conectá-la com a sabedoria instintiva de seu corpo e com os ciclos naturais do planeta. O sangue é o fluxo da vida, que vem da caverna escura, lá onde se guarda o feminino misterioso e profundo. E são poucos, bem poucos, os homens que têm coragem de ir lá. Fisicamente eles vão, sim, mas apenas tocam o feminino, nunca dançam com seu mistério. Homens fazem guerra porque a guerra vem do Sol. Mas poucos, bem poucos, são homens o suficiente para fazer amor com a Lua.

E, no entanto… a Lua sempre esteve dentro deles!, desde o momento em que os princípios masculino e feminino se uniram para gerá-los. São homens simplesmente porque neles a porção masculina é a dominante, e é isso que os faz mais agressividade e razão e menos suavidade e sentimento – mas se não houvesse também em sua alma a porção feminina, seriam uma inconcebível aberração psicológica. Ao negar o feminino em si, esses pobres homens negam também, sem perceber, sua própria totalidade, e assim buscarão inutilmente mil coisas pela vida, sem que nada os possa completar, e morrerão frustrados, sem sequer entender o que lhes faltou. E o que lhes faltou foi sua própria alma inteira.

Homens agridem mulheres porque elas são o próprio princípio feminino encarnado diante de seus olhos fascinados e temerosos. Sua presença os faz lembrar, inconscientemente, do que eles temem admitir. Sim, temer o feminino é normal, é humano. Mas negá-lo, não. O homem que nega o feminino, meu amigo macho, declara guerra contra si próprio. Bem melhor, mas muuuito melhor, é fazer amor com o feminino.
.

Ricardo Kelmer 2007 – blogdokelmer.com

.

Este e outros textos
integram o livro Vocês Terráqueas – Seduções e perdições do feminino

> Postagem no Facebook

.

.

MEDO DE MULHER
Esta crônica foi lida pelo autor no encerramento do 21o Encontro da Nova Consciência (Campina Grande-PB, fev2012) e dedicada às mulheres violentadas e mortas em Queimadas-PB (12.02.12)

.

.

MAIS SOBRE LIBERDADE E O FEMININO SELVAGEM

EmBuscaDaMulherSelvagem-02base1aA mulher selvagem – Ela anda enjaulada, é verdade. Mas continua viva na alma das mulheres

A mulher livre e eu – A liberdade dessa mulher reluz no seu jeito de ser o que é – e ela é o que todas as outras dizem ou buscam ser, mas só dizem e buscam, enquanto ela tranquilamente… é

Em busca da mulher selvagem – Era por ela que eu sempre me apaixonava, essa mulher que era quem ela mesma desejava ser e não a mulher que a família, religião e sociedade impunham que ela fosse

Amor em liberdade – O que você ama no outro? A pessoa em si? Ou o fato dela ser sua propriedade? E como pode saber que ela é só sua?

As fogueiras de Beltane – As fogueiras estão acesas, a filha da Deusa está pronta. O casamento sagrado vai começar

Alma una – Eu faço amor com a Terra / Sou a amante eterna / Do fogo, da água e do ar / Sou irmã de tudo que vive / Ninfa que brinca com a vida / Alma una com tudo que há

Quem tem medo do desejo feminino? (1) – A maternidade, a castidade e a mansidão de Nossa Senhora como bom exemplo, e a força, a independência e a liberdade sexual da puta como exemplo contrário, a ser jamais seguido

Marchando com as vadias – Se ser vadia é ser livre para exercer a própria sexualidade, então todas as mulheres precisam urgentemente assumir sua vadiagem, para o seu próprio bem e o de suas filhas

LIVROS

LivroMulheresQueCorremComOsLobos-01Mulheres que correm com os lobos – Mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem (Clarissa Pinkola Estés –  Editora Rocco, 1994)

A prostituta sagrada – A face eterna do feminino (Nancy Qualls-Corbert – Editora Paulus, 1990)

As brumas de Avalon (Marion Zimmer Bradley – Editora Imago, 1979)

Mulheres na jornada do herói (Beatriz Del Picchia e Cristina Balieiro – Editora Ágora, 2010)

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- achei muito linda! Andrea Boni, Brasília-DF – jul2007

02- Ai, Rica… o cerrado te deu muita inspiracao hein? Discutir o principio feminino… se saiu bem na escolha do tema. Vai atrair o maior publico, de mulheres, todas querendo ser desvendadas pelas palavras do escritor. Vai dar pano pra muita manga histerica 😉 Beijo. Fabiana Vasconcelos, Boston-EUA – ago2007

03- Belíssimo texto. Como só vc sabe escrever. Ah, agora que vc parou pra respirar, quero ver as nossas fotinhas!!!!!! Beijos e saudades. Patrícia Meireles, Fortaleza-CE – ago2007

04- bacana rick… André Monteiro, Campinas-SP – ago2007

05 – Adorei o texto. Inspiradíssimo Ricardo. Poucos são os homens que conseguem esta sintonia vibratória conosco, por nos conhecer tão bem. Bom saber que existem! Um bj grande. Helga Lima, Rio de Janeiro-RJ – ago2007

06- Rapá, por causa das chatices e duns quilinhos a mais (dela e… meus tb!), eu já tava aqui na peinha de nada pra plantar a mãozada na muié — q me prometeu ser sempre linda, com aquele corpinho enxuto, como era qdo eu a conheci — qdo chegou esse seu email e me livrou de tirar umas férias vendo o sol nascer quadrado… Isso é q é amigo, viu! Wander Frota, Fortaleza-CE – ago2007

07- Kelmerrr! Amei seu texto! E puxa vida…tava com saudades de ler suas crônicas. Marisa Vieira, Rio de Janeiro-RJ – ago2007

08- Ainda mais quando essa mulher é cearense! Aí o homem tem é que correr de medo! Bjs. Gatalôca, Rio de Janeiro-RJ – ago2007

09- Lindo, como sempre. O texto, e você, claro! Fabiana Polotto Figueira, São José do Rio Preto-SP – ago2007

10- Parabéns pelo blog, pelo belo texto e também pela sua intensidade! Gosto do jeito que vc fala do feminino… ajuda-me a fazer as pazes com a minha própria feminilidade e também com os princípios do Sol. Quando eu te dei aquele Sol e fiquei com uma Lua, eu não pensei -ao menos conscientemente- na união entre o masculino e o feminino…rsrs. Kátia, João Pessoa-PB – ago2007

11- Ricardo. Achei maravilhoso este texto que você escreveu e me tocou profundamente. Beatris Rocha, Campinas-SP – ago2007

12- A sua cronica mais linda ate hj…. Christina Alecrim, Rio de Janeiro-RJ – ago2007

13- Rapá, por causa das chatices e duns quilinhos a mais (dela e… meus tb!), eu já tava aqui na peinha de nada pra plantar a mãozada na muié — q me prometeu ser sempre linda, com aquele corpinho enxuto, como era qdo eu a conheci — qdo chegou esse seu email e me livrou de tirar umas férias vendo o sol nascer quadrado… Isso é q é amigo, viu! Desleixo é falta de amor, é o contrário ou são os dois na mesma medida, pergunto eu? Vale! Wander Nunes Frota, Fortaleza-CE – ago2007

14- tambem tenho tenho medo!! e tu?? ainda lembro quando rosalia berrava, cesarinhooooooooo pra dentro!!!cara, corria p não apanhar!! (risos) concordo com a cronica!! +, e se no àpice do sexoroller (sexo no skate) mui bom, camarada!!! ela, olha na tua cara e ordena, bate porra!! quero gozar apanhando, +, bate devagar, que fazes??? hem, hem??? (risos) César de Cesário, Campina Grande-PB – ago2007

15- Olá Ricardo…tudo em Paz? Li e amei esta cronica…afinal como não temer o que nunca se tentou aprender? Como não fugir daquilo que nunca se transparece por inteiro…que nunca se desnuda do sabor de se ver tão diferente? Parabens e bom te ler novamente…um abraço carinhoso!!!! Sandra Abou Dehn, Cuiabá -MT – ago2007

16- Olá Ricardo. tudo bem? Parabéns, adorei sua crônica, muito inteligente e profunda. Todos nos temos nosso lado feminino hibernado. Poucos são aqueles que vivem em paz. Com sua permissão vou passar essa crônica para meus amigos interautas. Obrigado pela lembrança. Abs. Liano Silva Veríssimo, Fortaleza-CE – ago2007

17- QUER CASAR COMIGO??? Isso é tudo que tenho a dizer sobre sua crônica, linda de morrer… melhor, linda de viver. Vc já leu Cartas do caminho sagrado, que fala do xamanismo e da “carta da lua” (a “função” da menstruação no “eu” da mulher)? Outro livro que eu achei interessante, cujo autor é um homem que pensa como nós, é “A corrida do membro”. Saiu no Jô, mas não lembro o nome do jornalista. Ainda não li mas deve ser interessante. Sempre me disseram que todos os homens que amei (e amo) só falta um chip para gay. Não sou chegada a aberrações psicológicas que me jogariam na parede e chamariam (se tivessem chance) de lagartixa! Tô fora! Beijim daquela que está se viciando nas suas crônicas. No meu próximo curso sobre crônica, onde quer que seja, vou apresentar à turma um autor que desmente categoriacamente essa história dos estudiosos de literatura que dizem que a crônica morreu: Ricardo Kelmer é o nome dele. Ana Karla Dubiela, Fortaleza-CE – ago2007

18- Dear Ricardo, Fico a imaginar como consegues escrever com tanta clareza sobre um assunto tao dificil pra muitos que e’ essa relacao de homem e mulher. Quase todos os meus clientes estao completamente perdidos , e’ um trabalho arduo mostrar-lhes alguma outra visao das coisas vividas por eles. Adorei o seu texto , sou sua tiete e por isso suspeita mas acredito ser Super!!! Raquel Araújo, Los Angeles-EUA – ago2007

19- Posso incluir este artigo no meu blog? http://poderosamentemulher.blogspot.com. Izilda, Salvador-BA – ago2007

20- depende kelmer , kkkkkkkkkkkkk. Alyson Amâncio, Fortaleza-CE – ago2007

21- Esse texto tá bom demais,Ricardo.Adorei! Mônica Burkle Ward, Recife-PE – ago2007

22- É as vezes tm homens que sõa muito machões mais na hora que tem que ser homem mesmo não é digo iso num termo geral. E os homens principalmente falam que nós mulheres somos frageis e é ao contrario, vcs homens que são frageis por ex: vcs não tão a luz e gera uma criança durante nove meses ae nos mulheres temos essa benção e a graça divina. Bom quero ler mais coisas que vc escreve e se quizer mandar pra mim eu leu pode ter certeza ah!! fiz um blog para colocar as minhas histórias se quizer dar uma lida e uma opinião é sempre bom saber mais. Olha o endereço do meu blog: http//amandareisgomes .arteblog.com.br. Amanda Reis, Osório-RS – ago2007

23- Oi, Ricardo… Crônica pouco poética. São Paulo, às vezes, nem é Sol nem Lua… é assim, digamos… quase sempre nublada. Será que percebes a influência na (ou falta) de poesia? Que tal escrever uma crônica biológica para “eles” informando a partir da fecundação até aquele momento em que por definição génetica os órgãos sexuais determinantes se desenvolvem e se atrofiam simultaneamente… mas, com poesia. Beijos. Marly Rodrigues, São Paulo-SP – ago2007

24- Olá Ricardo! Recebi seu e-mail com a sua crânica sobre o Medo que os homens têm das mulheres, e achei uma obra de arte, achei que você falou tudo sem fiucar cansativo e monótono… na minha humilde opinião de leitora hehe! Além de ser um assunto que me chama muita atenção, essa coisa toda do machismo que perdura até hoje em uma sociedade tão moderna como é a que vivemos, fico boquiaberta com esse tipo de coisa que ainda acontece no mundo! Não há como entender!! Eu li, e adorei seu texto, achei que não podia deixar passar em branco no meu e-mail, não resisti em responder, embora não à altura do seu texto! Achei magnífica a forma como vc trata o corpo da mulher em constante ligação com a natureza (o que não deixa de ser verdade em nada), ficou sensacional! Vc escreve por hobby ou por profissão mesmo? No mais, seguem meus singelos elogios… achei que você tem um grande futuro (se é que já não o tem)! Caso haja mais alguma coisa que tenha em mãos, mande-me, é sempre bom ler esse tipo de coisa e saber que a situação também incomoda a outrs pessoas!Abraços! Pamela Bathory, Juiz de Fora-MG – set2007

25- adorei a crônica, vc sempre escreve o que gosto de ler sou sua fa bj. Lu Resende, Fortaleza-CE – set2007

26- MOCINHO COMO VC ESCREVE GOSTOSO!!! LIVRE, LEVE E SOLTO RSRS ADOREI. E VOU REPASSAR… UM OTIMO FIM DE SEMANA BEIJO Junia Drummond, Brasília-DF – set2007

27- caraaaaaaaaa !!!!!!!!!!!!!!!!! eu não me engano. Apasar de ter conversado muito pouco com vc tive a carteza de q vc é um cara muito sensível . e esse texto so vema confirmar . beijos. Júnia Turturro, Brasília-DF – set2007

28- Crônica interessante… Vc gosta muito de falar sobre as mulheres, não? Um abraço. Fernanda da Silva Xavier, Rio de Janeiro-RJ – set2007

29- amei, obrigada ….. bjs. Marysol Rosso, Cocal do Sul-SC – set2007

30- Parabéns menino! Só quem tem sua porção feminina bem resolvida pode ser o super homem que tão bem cantou Gil. Abraço carinho procê! Regina Coeli Carvalho, Rio de Janeiro-RJ – set2007

31- Tá bom vou começar. Recém cheguei da ópera Carmem de Bizet, apresentada ao ar livre pelo bobão do Silvio Barbato… o espetáculo foi lindo, os comentários dele, absolutamente desnecessários. Mas, não é isso para agora. Uma sugestão: que tal o título ser: Medo do Homem: Mulheres. Pq o medo? o medo é o pai de todas as dores e essencialmente nasce da necessidade de proteção diante da ameaça da morte…O nascimento é, se não o primeiro, um dos mais importantes eventos ameaçadores à vida, visto q apresenta de cara o desconhecido. Ao nascer, homens e mulheres CAEM no desconhecido absoluto… entretanto, a mulher traz consigo o potencial de parir, de continuar o ciclo… o homem nasce com o vazio do sentido da existência. Será? Este medo é primitivo, e inerente ao ser humano, mas segue se desenvolvendo no macho, será? este ódio, este repúdio, esta resistência de entrega do macho – confiar… não sei, tudo isso está me ocorrendo agora… vou sentir mais um pouco depois escrevo mais. Obrigada pela oportunidade. Não houve ritual da Lua. Eu me empaturrei de macarrão e dormi. Um beijo. Suely Andrade, Brasília-DF – set2007

32- Kra, muito legal essa crônica!!! Axu muita coisa legal na mitologia pagã tb. Daniel Gargas, Fortaleza-CE – set2007

33- muito bom! pena q apenas uma parcela mínima de homens se toca disso… Luciana, São José dos Campos-SP – set2007

34- Linda, sábia e profunda sua crônica Medo de Mulher. Parabéns por mais esta pérola! Gilvanilde Oliveira Falcão, Fortaleza-CE – set2007

35- Muito bacana, primo. Parabéns ! Beijos. Virgínia Galvão, Brasília-DF – set2007

36- Olá Kelmer, Muito interessante o seu texto. A Mãe Natureza é grandiosa, mas também esconde muito tesouros. Acho que a mulher tem um pouco disso, claro, dessa coisa incomensurável que nos faz tremer nas bases. E talvez Freud quisesse também dizer que o Complexo de Édipo é, para o menino, a grande ameaça que ele precisa passar para descobrir que sua mãe é uma caverna oculta aos seus propósitos libidinais. O primeiro obstáculo que vai precisar remover sem nunca conseguir transpor o mistério, talvez por isto, como você mesmo escreve, surja o medo. É realmente surpreendente. Um grande abraço e parabéns pelo texto. Felipe Moreno, São Paulo-SP – set2007

37- Graaaaaaaaaaaaaande verdade!!! Disse tudo meu Guru!!! Marcos André Borges, Fortaleza-CE – set2007

38- Oi bom dia !!! adorei essa crônica sua, linda !! adorei o uso dos conceitos do sol e da lua , do sagrado feminino, da fertilidade !! lindo!! por isso que eu sou sua fã!! Se puder me mandar de novo mulher selvagem(que eu adoro) e estou louca pra mandar pras minhas amigas eu agradeço!! Como sempre vc é como o vinho: a cada dia que passa fica melhor !!! beijos. Josylene, São Paulo-SP – set2007

39- Oi Ricardo..obrigada por agraciarnos com estas pérolas…adorei a palestra e mais ainda, adorei saber que ainda existem homens assim…deste jeitinho…da forma que deve ser…vc percorreu o caminho p/ o feminino que existe dentro de todos os homens… Li ” Para GAIA com Amor” …adorei tb…vc pensa muito parecido comigo…só que não consigo traduzir em “letrinhas”…meus sentimentos…Bjs e até a próxima!!!!! Mônica Rivera, Brasília-DF – set2007

40- OI, Kelmer! Muito legal a cronica sobre Medo de mulher! Adorei! Fabrícia Viana, Fortaleza-CE – set2007

41- Muito bom Morga, já estou copiando e mandando pra alguém especial. Ainda n tinha lido nada de Ricardo Kelmer, fiquei encantada… Angélica Belchote Trocoli, Salvador-BA – Comun. Orkut Mulheres Repensando Conceitos – set2007

42- lindo! vai de encontro a tudo que acredito sobre a natureza da mulher. Devíamos enviar este artigo para todos os homens que conhecemos. Obrigada pela oportunidade de tomar conhecimento deste autor.Cadê o endereço do blog dele?beijo. Kátia G, Belo Horizonte-MG – Comun. Orkut Mulheres Repensando Conceitos – set2007

43- Lindo! Cris, Florianópolis-SC – Comun. Orkut Mulheres Repensando Conceitos – set2007

44- o cara é simplesmente demais cada vez que o lei ele me surpreende e anima… lindo demais Ricardo Kelmer ! Parabéns! Andréa Magnoni, São Paulo-SP – Comun. Orkut Mulheres Repensando Conceitos – set2007

45- Adorei a cronica Ricardo!!! eh a pura verdade! beijao. Carmen Rangel, Barcelona-Espanha – set2007

46- Se as mulheres ainda se sentem oprimidas e agredidas, depois de tudo o que conquistaram, é porque elas permitem, mtas vezes até escolhem. Pois, perante todos estes problemas mtas ainda insistem em igualar-se aos machos, fazendo o que eles fazem, falando como eles falam, vestindo-se como eles se vestem, brigando como eles brigam. São verdadeiros homens debaixo de belas roupas, maquiagem e salto alto. E se há sensibilidade é puramente interesseira e vítima. Giovana Milozo, São Carlos-SP – set2007

47- Você é muito talentoso e escreve muito bem. Considere isso mesmo um elogio, porque eu já li à beça e tenho faro pra essas coisas. abraço forte. Deco, Rio de Janeiro-RJ – set2007

48- Já divulguei para minha lista de amigos. abraços. Regina Coeli, Rio de Janeiro-RJ – set2007

49- Kélmer, gostei muito desse texto, parabéns!! Só você consegue nos fazer pensar em assuntos importantes de maneira irônica e divertida. Sheryda Lopes, Fortaleza-CE – set2007

50- Obrigada pelo texto com interessantes reflexões!!! Parabéns!!! Aproveito a oportunidade e compartilho com você a indicação de um livro que acabei de ler. Chama-se “A Ciranda das Mulheres Sábias”. Dê-se a oportunidade de ler este livro. É da Clarissa, mesma autora do livro “Mulheres que Correm com os Lobos”. Abraço. Iolanda Santos, Fortaleza-CE – set2007

51- Lendo seu texto, lembrei-me menininho, escondendo-me quando a prima bonitinha entrava lá em casa. Como um bichinho que se esconde do predador na mata, mas fica observando-o da penumbra, envolto naquele sentimento novo, inexplicável naquele primeiro momento, de medo e fascínio. Enquanto não aprendermos a conviver com esse sentimento, o que você tão bem descreve e ensina, estaremos sempre no meio termo entre algoz e vítima, julgando-as santas ou profanas, causadoras de nossa tragédia ou fortuna, nossa salvação ou desgraça. Por isso quando eu nasci, veio um anjo e disse: – Vai, Paulo, vai ser voyeur na vida… Paulo Marcelo, Brasília-DF – set2007

52- Ricardo, como é bom sentir vc se superar cada vez mais!Esta crônica nos anima e acalenta em um mundo tão desconectado com nossos princípios naturais. Muitos beijus das “Rosas do Cariri” para nosso cearense querido. Lisiene Bezerra, Juazeiro do Norte-CE – out2007

53- já tinha gostado do livro que me enviaste, o “Blues da vida crônica”, mas esse texto gosto de reler, principalmente nos tais meandros cíclicos em que até nós mesmas tememos o dito “feminino”, rs. Um abraço! Jamile Mileipe, Recife-PE – dez2007

54- Gostaria de lhe parabenizar pela grandiozidade dos textos que compõe o leu livro “Vocês Terráqueas”. Mas, em particular, gostaria de lhe parabenizar pela crônica “Medo de Mulher”. Poucos homens seriam tão capazes de reconhecer esse medo de forma tão explícita. Menos ainda seriam capazes de assumi-lo publicamente editando em um livro. Isso mostra, no mínimo, a segurança que você tem quanto a sua masculinidade, não tendo medo de expor o que pra muitos seria um “fraqueza”. Mostra também a cumplicidade que você tem com nós mulheres, nos orientando e esclarecendo os motivos pelos quais muitos homem não desceram da árvore. Talvez os “ETs” tenham maior domínio desse medo e por isso as mulheres brasileiras se deixam abduzir. Parabéns: pelo grande escritor, pelo grande homem e pela grande pessoa que você é. Maria do Carmo, São Paulo-SP – ago2010

55- lindo,lindo lindo…vc diz o que eu gostaria de ter dito. KELMER querido, em sua homenagem vou soltar a minha loba…rsrs mudar minha fotinha… Maria Sá Xavier, Niterói-RJ – fev2011

56- Puta merda!!!! Tão seguro da sua masculinidade foi muito profundo. Rsrsrsrsr… Rsrsrsrsrsrsr… Rsrsrsrsrs… Essa eu vou contar na próxima rodada de pôquer. Rsrsrsrsr…. Mardonio Veras, São Luís-MA – fev2011

57- Ah, vai, Mardonio, ele sabe das qualidades dele, não precisa de incentivo. Mas como lider da ALK – Associação das Leitorinhas Kelméricas, faço qualquer coisa pra ele continuar enchendo nossos olhos com suas hitórias deliciosas. Kel, bota a imaginação pra funcionar! Maria do Carmo, São Paulo-SP – ago2010

58- Lindo texto, Kelmer… Lílian Rocha, Fortaleza-CE – fev2012

59- Que texto lindo, Ricardo Kelmer! Sempre percebi esse medo dos homens em relação às mulheres. Alguns mais, outros menos. Um homem que tem medo de mulher, nunca vai amá-la plenamente, porque não se entrega, não confia, não relaxa. Amor e medo são antagônicos.Que bom que vc tocou nesse assunto, pois é a causa de muita desgraça entre homens e mulheres! Vanessa Martins de Souza, Curitiba-PR – fev2012

60- veja o exemplo na idade media, depois joana dárc… as mulheres q faziam parto, sabiam o segredo das ervas… e estoria eh lon ga… sempre o medo da caverna escura dos ancestrais… a mulhr eh yin eh ternura e força… nao devemos querer parecer homem. Dhara Bastos, Fortaleza-CE – fev2012

61- achei tão fantástico, que joguei lá no V&P, prá modo daqueles brucutos ignaros aprenderem alguma coisa… – rsrsrsrsrsrs. Eduardo Ramos, Rio de Janeiro-RJ – fev2012

62- Maravilha! Não lembro de ter lido algo tão profundo sobre nossas ‘diferenças’ (prosapoética da melhor qualidade!); grata por compartilhar, e vamos compartilhar! : ) Mônica Mello, São Paulo-SP – fev2012

63- eu li. É TDO DE BOM. Renata Regina, São Paulo-SP – fev2012

64- Parabéns pelo texto e pela sensibilidade. Mob Cranb, Campina Grande-PB – fev2012

65- Rios sinuosos que hipnotizam o olhar… Se todos fossem iguais a você,q maravilha seria. Izabel Castro, São Paulo-SP – dez2013

66- Risos…até eu tenho medo de mulher, mulher é muito perigosa, se não te pega acordado, te pega dormindo. Mas lhe vinga! Por isso, bato em homem, espanco até…mas não relo o dedo numa mulher. Regina Zamora, São Paulo-SP – dez2013

67- (…) a mulher é a natureza humanamente representada em suas curvas, saliências e reentrâncias (…) aaaaadorei Kelmer brilhante como sempre. Cynthia Martins, Fortaleza-CE – dez2013

68- Como diz um ditado antigo “Falou e disse ” ou seja falou tuuuuuuuuuuudo. Marcos Felix, Ceilândia-DF – dez2013

69- Belíssimo, Ricardão. Sergio Nogueira, Fortaleza-CE – dez2013

70- “Se elas são naturalmente iniciadas pela vida, eles não, eles precisam inventar iniciações.” Absolutamente genial!!! Meu amigo Ricardo Kelmer, apesar de eu ter ido a esse ENC, não ouvi o texto lá. Estou lendo pela primeira vez e não encontro palavras para comentá-lo. Talvez o melhor texto seu que eu já li, e com certeza está dentre os melhores sobre esse tema. Minhas reverências, meu querido! Rógeres Bessoni, Recife-PE – dez2013

71- Estupro é a prova de não saber nada sobre conquistas é uma condição de reprovar a si mesmo na condição de ser comunicável é retirar a capacidade de inteligência nas entrelinhas! Resumindo: __ FALTA DE COMPREENSÃO !!!!!!!! Hyara Ougez, São Paulo-SP – dez2013

72- Lindo texto Ricardo! O mais triste é ver mulheres negando também a sua ligação com a natureza, sentindo nojo e vergonha de seus corpos e dos seus ciclos, e colaborando para que uma visão sexista seja mantida. O machismo não tolhe apenas as mulheres, mas também os homens que passam a ter que se mutilar emocionalmente e espiritualmente para se encaixar em uma visão limitada do masculino. O masculino e o feminino são lindos, cada um da sua forma. Marina LF, Porto Alegre-RS – dez2013

73- Bravo! Reflexão consistente, sincera, densa, verdadeira, profunda, ampla, EM SINTONIA COM A REALIDADE NACIONAL. PARABÉNS!! ASSINO EMBAIXO. EM COMUNHÃO. Luca Vianni, Fortaleza-CE – dez2013

74- Gratidão Ricardo!! Sou fã de teus escritos, sabes. Clordana Aquino, Campina Grande-PB – abr2014

.


Alma una (clipe musical)

01/06/2009

01jun2009

Fiz esta música em 2006 com Flávia Cavaca. Quem canta é Lila Shakti. Os instrumentos e a programação ficaram a cargo do Rodrigo Larese, um fera. Em algumas cidades há grupos que usam esta música em rituais xamânicos ou de celebração do Feminino Sagrado. Ótimo! É pra isso mesmo, fiquem à vontade.

.

ALMA UNA
.

Celebrar o milagre de ser
O assombro de viver
Na doce magia da noite
Minha alma é noiva desse ritual

O fogo me aquece num abraço amigo
As fagulhas são reflexos do infinito
Eu danço o mistério da Lua
Linda, nua e natural

Eu faço amor com a Terra
Sou a amante eterna
Do fogo, da água e do ar

Sou irmã de tudo que vive
Ninfa que brinca com a vida
Alma una com tudo que há

Salamandras brincam na fogueira…
Guerreiras aladas trazem oferendas…
Se aproximam os animais de poder…
Planta-mestra, eu quero aprender…
Guardiães, abençoem meu caminho…
Tambores do xamã, toquem para mim…
Grande Mãe, estou aqui…

(música de Ricardo Kelmer e Flávia Cavaca)

.

Ricardo Kelmer 2006 – blogdokelmer.com

.

> Baixe a música (mp3, 4mb)
.

ElaLua002

.

.

Mais sobre liberdade e o feminino selvagem

A mulher selvagem – Ela anda enjaulada, é verdade. Mas continua viva na alma das mulheres

A mulher livre e eu – A liberdade dessa mulher reluz no seu jeito de ser o que é – e ela é o que todas as outras dizem ou buscam ser, mas só dizem e buscam, enquanto ela tranquilamente… é

Em busca da mulher selvagem – Era por ela que eu sempre me apaixonava, essa mulher que era quem ela mesma desejava ser e não a mulher que a família, religião e sociedade impunham que ela fosse

Amor em liberdade – O que você ama no outro? A pessoa em si? Ou o fato dela ser sua propriedade? E como pode saber que ela é só sua?

As fogueiras de Beltane – As fogueiras estão acesas, a filha da Deusa está pronta. O casamento sagrado vai começar

Medo de mulher – A mulher é um imenso mistério, que o homem jamais alcançará

Alma una – Eu faço amor com a Terra / Sou a amante eterna / Do fogo, da água e do ar / Sou irmã de tudo que vive / Ninfa que brinca com a vida / Alma una com tudo que há

Quem tem medo do desejo feminino? (1) – A maternidade, a castidade e a mansidão de Nossa Senhora como bom exemplo, e a força, a independência e a liberdade sexual da puta como exemplo contrário, a ser jamais seguido

LIVROS

Mulheres que correm com os lobos – Mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem (Clarissa Pinkola Estés –  Editora Rocco, 1994)

A prostituta sagrada – A face eterna do feminino (Nancy Qualls-Corbert – Editora Paulus, 1990)

As brumas de Avalon (Marion Zimmer Bradley – Editora Imago, 1979) – A saga arturiana pela ótica das mulheres

Mulheres na jornada do herói (Beatriz Del Picchia e Cristina Balieiro – Editora Ágora, 2010) – É ainda mais interessante ver o relato das mulheres pois elas sempre foram, mais que os homens, historicamente reprimidas na busca pela essência mais legítima de suas vidas

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos

Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

COMENTÁRIOS
.

01- OBRIGADA, OBRIGADA, OBRIGADAAAAAAAAAAAAAAAA… Me emocionei… demais… Espero poder usá-la em meus trabalhos… A sensibilidade das palavras somadas ao ritmo é de fazer com que, nos esqueçamos, por alguns momentos, de onde estamos…Parabéns! Abraço carregado de Boas vibrações e gratidão, também, por suas palavras. Carinhos. Stella Petra, Curitiba-PR – dez2010

02- Sem palavras! É absolutamente estonteante. D´nara Rocco, Montevidéu, Uruguai – nov2012

03- O poeta arrasa na mitologia… 🙂 Muito bom! Ninfas… Sempre elas, hein…? 🙂 Dalu Menezes, Fortaleza-CE – dez2012

04- 20.12.12 Belo dia para transcender o óbvio! As palavras não se prestam ao que realmente se propõem! Incompletas, indefinidas, elas se esquivam dos meus sentimentos, do meu SENTIR. Ah! essa vontade de escrever pra ninguém. Esse desejo de mostrar a ALMA NUA pra quem?
Espanto! Sonhos! Desejos! Vontade quase eufórica de embrenhar-me na mata, subir montanhas, atravessar riachos e mangues. Bruxaria! As palavras escritas, desenhadas com se fora uma serpente me enroscando, tragando-me para o interior de um universo particular, paralelo, (sei lá)! Mostrar quem sempre SOU e não tenho ESTADO!
Magia! Bruxaria! Letras, palavras, histórias, crônicas, contos….. coisas de bruxo?????? Alma de Bruxo travestido de escritor, insano, devasso e ateísta????? E essa vontade de correr rios, matas, montanhas… e ao mesmo tempo SER tudo isso!? Alma Desnuda, Fortaleza-CE – dez2012

05- Adorei ……………………………….. Vou levar Alma Una…………. sensacional! Amanda Pontes, Florianópolis-SC – mar2014

06- Mágico. Parabéns ao autor. Felipe Nobrega, Florianópolis-SC – mar2014

07- Tchê, musica e composição de imagens lindas. Do carayyyy…… Isadora Meirelles, Porto Alegre-RS – mar2014

08- Que lindo Ricardo Kelmer! Amei o presente. Tudo a ver!E adoro a voz da Lila Shakti, tenho um cd dela. Vou usar! Valéria Rosa Pinto, Rio de Janeiro-RJ – mar2014

09- muito brigada Ricardo Kelmer por saber captar nossa escencia. Sandra Buongarzini, Buenos Aires-Argentina – mar2014

10- Quando eu li esse poema e vi o vídeo.. então parte de mim pegou o caminho de volta à floresta que já havia esquecido.. rsrsrs. Adoro! Ivonesete Rodrigues, Fortaleza-CE – jul2014

11- Na veia F.C.&R.K. Dedé Calixto, Fortaleza-CE – jul2014

12- amei! Socorro Sousa, Fortaleza-CE – jul2014

13- Para curtir com una mujer do lado como a Syl. Dedé Calixto, Fortaleza-CE – jul2014

14- LindoDorah Andrade, São Paulo-SP – jul2014

15-  Eu danço o mistério da lua linda, nua e natural / Sou amante eterna do fogo, da água e do ar… / Sou irmã de tudo que vive / Salamandra na fogueira / Algo diz que essa canção foi feita para mim / Alma una. Edy Paiva, Valparaíso de Goiás-GO – set2017


O último homem do mundo

24/12/2008

24dez2008

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2a.

O sonho de Agenor é que todas as mulheres o desejem. Para isso, ele está disposto a fazer um pacto com o diabo. Mas há um velho ditado que diz: cuidado com o que deseja, pois você pode conseguir…

.
Este conto integra os livros Baseado Nisso – Liberando o bom humor da maconha e o livreto O Último Homem do Mundo.

.

O ÚLTIMO HOMEM DO MUNDO

.
Agenor cumpriu todo o ritual, direitinho. Colhera o fumo num dia seis, e seis dias depois o debulhara, fumo plantado no sítio Inferninho, na sexta noite após a sexta lua do ano. Não contara nada a ninguém. Tudo dentro dos conformes do ritual.

Eram onze e meia da noite. Ali, no alto do morro, o céu parecia mais próximo e a pouca lua permitia às estrelas brilharem à vontade. Agenor sentia medo, mas estava decidido. Apenas meia hora o separava do momento mais importante de sua vida.

Tirou o cigarro da bolsa e acendeu. O nervosismo fez o cigarro cair duas vezes. Deveria fumá-lo sozinho, era o que pregava o ritual. Agenor fumou e, aos poucos, foi se acalmando. Tinha de estar tranquilo para dizer as palavras certas, não podia errar. Subiu numa pedra mais alta e lá encostou-se. E relaxou. Era realmente um excelente fumo, diferente de qualquer um que já houvesse experimentado. Diziam que, de tão especial, não estragava nunca.

Agora, as estrelas pareciam mais brilhantes, mais próximas. Lá embaixo, dava para ver as luzes da cidade de Jubá, a torre da matriz, o estádio. Quase dava para ver a casa onde morava e o restaurante onde trabalhava Dorinha…

Então, escutou um ruído vindo do mato. Olhou para o relógio. Onze e quarenta e cinco. Não, não devia ser ele ainda, pensou. Talvez algum bicho. Deu a última tragada e apagou o cigarro. Começava a fazer frio. Agenor tirou da bolsa um cobertor e se cobriu inteiro, encolhido à pedra.

Durante meses, estudara seu pedido como quem retoca uma pintura, ajeitando aqui e ali os detalhes das miudezas semânticas. Segundo o ritual do Encontro, o pedido tinha de ser formulado corretamente, as palavras exatas, o sentido perfeito. Não podia haver qualquer erro. Os diabos eram espertos, e se as palavras dessem margem a qualquer outra interpretação, eles não perdoavam a falha.

Agenor olhou o relógio: meia-noite. O diabo chegaria a qualquer momento. Meia-noite e dez. Talvez o relógio estivesse adiantado, pensou. Meia-noite e vinte. Teria falhado em algum ponto do ritual?

À meia-noite e meia, quando já começava a cochilar, Agenor percebeu que alguém chegava, vindo de dentro do mato, caminhando devagar entre as folhagens. Sentiu medo. Pensou em desistir daquela história de pacto… mas as pernas não obedeceram e ele continuou ali em pé, esperando.

Quem chegou foi um velhinho de barbicha branca, de sobretudo e botas pretas, chapéu e bengala. Agenor estranhou. Não se parecia com um diabo.

– Boa noite – o velho o cumprimentou, erguendo o braço e tocando seu chapéu. – Desculpe a demora, sexta-feira sempre tem muito serviço. Você é o Agenor, não é? Sou Soloniel, o mais astuto dos diabos. Certamente, já ouviu falar muito de mim.

– Ahn… não… – Agenor olhava para a figura à sua frente. Aquilo era um diabo? Parecia mais com aqueles velhos aposentados que jogavam dominó na praça.

– Devia ler mais, meu jovem – disse o diabo, apontando-lhe um dedo acusador. – É nisso que dá ficar vendo esses filmes idiotas da tevê. Deixa de saber quem foram os grandes nomes da História.

Agenor concordava com a cabeça, sem compreender aquela espécie de sermão. Aquilo era mesmo um diabo?

– Ainda duvidando de mim?

Ele lia pensamentos! – assustou-se Agenor.

– Desculpe… é que… eu…

– Já sei, já sei – o diabo o interrompeu, dando com a mão, resignado. – Esperava um diabo mais moço. A culpa é da moda, que agora exige diabos jovens e bonitões. Por isso que eles querem me aposentar. Nem um diabo velho é mais respeitado hoje em dia. O mundo está perdido.

– Desculpe, eu não quis…

– Pois saiba, rapaz, que toda a juventude deles não serve nem para lustrar as botas da experiência de Soloniel, estas aqui!

Agenor olhou para as botas. Eram bonitas e brilhosas. Talvez um pouco grandes.

– Eu emagreci e elas ficaram um pouco folgadas. Mas não comprarei outras. Sabe por quê? Porque estas botas estiveram em muitos lugares e muitos tempos, tantos que os números já não contam – Ele batia nas botas com a ponta da bengala, tum-tum-tum. – Estas botas já pisaram em cavernas, tendas, palácios… Em castelos, campos de batalha, escritórios, alcovas mal iluminadas… Presenciaram acontecimentos cruciais da história humana. Não só presenciaram como também ajudaram a determiná-los. Entende?

– Sim, sim… – balbuciou Agenor.

– Com estas botas, realizei vontades ardentes e inconfessáveis. Elas são testemunhas das confissões dos desejos mais profundos da humanidade. Tem um pano aí?

– Um pano? Este serve?

Agenor estendeu-lhe o cobertor. O diabo agachou-se e limpou o bico da bota com o cobertor.

– Obrigado. Vamos lá, qual é mesmo o seu pedido?

Agenor respirou fundo.

– Bem, eu… O senhor pode mesmo realizar qualquer desejo?

O diabo deu um risinho de impaciência.

– Diga logo o que quer, meu jovem. O diabo Soloniel ainda tem quatro encontros esta noite.

– Eu… eu…

De repente, Agenor sentiu um medo imenso. Valia mesmo a pena um pacto com o demo?

– Volte para a sua mamãe, jovem – disse o diabo, virando-se e afastando-se. – Pacto com o diabo não é para gente fraca como você.

– Ei, espere! – gritou Agenor, nervoso. – Vou fazer o meu pedido. Agora.

O diabo parou e voltou-se. E aguardou, apoiado em sua bengala.

– Eu…

– Sim?

– Eu quero que todas as mulheres…

– Estou ouvindo.

– Eu quero que todas as mulheres do mundo me desejem.

Pronto, dissera. Estava feito. E uma vez formulado, o pedido não podia mais ser mudado, ele sabia.

Agenor aguardava, a respiração suspensa, as palavras ecoando em seus ouvidos: todas as mulheres… do mundo… me desejem… Naquele instante, pela primeira vez, seu desejo lhe pareceu ridículo e despropositado. Era como se as palavras, enfim pronunciadas, concretizadas solenes no ar, tivessem o poder de lhe abrir os olhos.

– Hummm… Bom pedido, bom pedido – disse o diabo, balançando a cabeça e coçando a barbicha branca. – Fazia tempo que eu não topava com um desse. Deixe-me ver…

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aAgenor aguardava, o coração batendo forte. Teria sido um pedido difícil demais? Zombaria dele? Estaria estudando suas palavras, procurando brechas para poder enganá-lo?

– Fazer todas as mulheres do mundo desejarem um cara feio, pobre e desengonçado como você não é tarefa fácil. Por outro lado, é o tipo de coisa que pode consagrar um diabo pela eternidade inteira. Sabe o que significa a eternidade inteira, meu jovem?

A eternidade?, pensou Agenor. Sim, claro. Quer dizer, não, não sabia.

O diabo continuava coçando a barbicha, apoiado na bengala, olhando para as estrelas… Eram segundos que para Agenor pareciam séculos.

– Teve muita sorte de pegar um profissional como Soloniel, meu jovem. O que você pediu requer a experiência que só eu possuo, acredite. Pois muito bem. Dê-me o documento.

Agenor puxou do bolso uma folha de papel dobrada. Nela estavam a frase exata de seu pedido, data, local e a assinatura.

– Perfeito – falou o diabo, guardando o papel no bolso do sobretudo. – Então, estamos combinados. Toque aqui.

Apertaram-se as mãos.

– Na hora certa virei buscar o pagamento pelo serviço. Adeus.

Agenor viu o diabo sumir mato adentro. Então, suspirou. Fizera o pacto. O diabo realizaria seu desejo, era isso que importava. Ele conseguira. Não era um fraco.

Quanto à sua alma, pensou, já descendo o morro a caminho da cidade, perdê-la seria um preço pequeno diante do grandioso futuro que o aguardava.

*     *     *

O dia seguinte foi normal como todos os outros dias do carteiro Agenor. Envelopes, encomendas, campainhas que não funcionavam, cães que detestavam carteiros. Entregas e entregas sob o sol da manhã e da tarde. Nada demais. Mas, nesse dia, pela primeira vez, o feio, tímido e desengonçado Agenor olhou as mulheres com certa segurança. Na lanchonete, olhou para a moça que servia e lhe piscou um olho. Mas a moça não correspondeu e virou o rosto. Ele sorriu tranquilo: Deixe estar…

O dia terminou sem novidades. Após o jantar, pediu bênção à mãe, dona Fafá, e se recolheu. Antes, porém, olhou-se no espelho. Nada mudara em seu rosto, em seu corpo, ele continuava igual. Mas era apenas o primeiro dia, explicou a si mesmo. Estava esperançoso.

No segundo dia, as coisas também não foram diferentes. A mesma caminhada diária, a mesma rotina, tudo igual. E as mulheres de Jubá também. Nenhuma lhe pareceu mais simpática. Continuavam todas em seu mundo distante, princesas inalcançáveis de um reino a ele não permitido. Nem Dorinha, pela qual era secretamente apaixonado, mostrou-se mais acessível. Uma pena, pois Dorinha era bonita, prendada, trabalhadeira. Poderia ser sua mulher…

O terceiro dia também não trouxe novidades. O quarto dia também. Passou-se uma semana e nada aconteceu. Agenor olhava-se ao espelho e via, decepcionado, que continuava feio e desajeitado. E a vida também era a mesma, ele suando de endereço em endereço, e as mulheres limpas e perfumadas a ignorá-lo.

A segunda semana também correu igual, assim como a terceira. Um mês e nada, nenhuma mudança em sua vida.

Naquela noite, Agenor virou-se na cama e sentiu-se imensamente triste por seu desejo não ter sido realizado. O diabo bem que avisara que era um pedido difícil.

Talvez houvesse errado na formulação do pedido, será? Talvez não houvesse escolhido as palavras exatas, isso era comum nas histórias dos pactos com o demo. Mas onde errara? De todas as que pensara, aquela era a melhor frase. Não podia dizer “Quero todas as mulheres”, pois o diabo poderia, simplesmente, deixá-lo continuar querendo. Listar as mulheres que queria que o desejassem também não era uma boa ideia, pois terminaria deixando alguma de fora e, além do mais, está sempre nascendo mulher, né?

“Quero que todas as mulheres do mundo me desejem” era a melhor maneira de pedir. Não importariam sua pobreza, sua feiura e sua falta de jeito se elas o desejassem. E sendo “todas as mulheres do mundo” não haveria risco de deixar nenhuma de fora, entrariam todas, da mais feia à mais linda, da mais pobre às milionárias, da mais insignificante à mais famosa e cobiçada. Todas o desejariam e a ele caberia apenas escolher quem delas teria o privilégio de ficar com ele.

Súbito, lembrou-se de um detalhe, algo que havia lhe escapado durante todo aquele tempo: sua mãe. Dona Fafá, viúva, que tão bem cuidava do filho único. Sua mãe era uma mulher e, sendo assim, também o desejaria. E agora?

Agenor percebia, sobressaltado, que a formulação não fora perfeita. O que fazer com o desejo de sua mãe? Ou ela, por ser mãe, estaria automaticamente excluída das possibilidades? O diabo Soloniel seria razoável, entenderia a questão? E se seu pai fosse vivo, o que não acharia de uma marmota dessa?

Agenor puxou o lençol e se cobriu, como se assim pudesse se esconder daqueles tantos pensamentos. Demorou uma eternidade para pegar no sono.

*     *     *

Primeiro, foi o Chico da Magnólia, velho amigo. Era domingo e tomavam uma cachacinha à beira da lagoa quando Chico, já bêbado, confidenciou a Agenor, sem jeito, que estava acontecendo com ele uma coisa terrível. E a muito custo foi que conseguiu dizer que ficara broxa, já não conseguia fazer nada com as mulheres, o dito cujo não funcionava mais, uma desgraça. Na noite anterior, por sinal, fora ter com as raparigas lá do Siribó, elas que sabiam como ninguém alegrar o cidadão. Mas que nada, não teve jeito que desse jeito. Tentou com a Paizinha, com a Chiquinha Piassaba e a Neide Peixeirão. Nenhuma delas conseguiu levantar-lhe o moral um centímetro que fosse. Tentou até umas pilulazinhas que um primo trouxera da cidade grande, diziam que levantava até bigorna. Mas nem elas deram jeito. No desespero, chamou a Paloma, a espanhola dos peitões, a mais cara daquelas bandas do sertão, disposto a gastar cinquenta contos, o salário da semana inteira. Pois nem a Paloma, veja você, nem ela.

Agenor consolou o amigo, dizendo que procurasse um médico, não devia ser coisa muito séria. Mas Chico respondeu que já havia ido ao médico e este, sem detectar nada de anormal, falou que algum problema devia estar preocupando-o. Mas não tinha problema algum, explicou Chico, a não ser esse, esse era o problema, o pinto não queria mais subir e pronto. Uma vergonha que o cidadão trabalhador e pagador dos seus impostos não merecia passar.

Agenor, sensibilizado, encheu um copo e tomou. Que uma desgraceira daquela nunca se abatesse sobre ele, jamais.

Depois, foi a vez do seo Ribamar da bodega, que se chegou para perguntar se ele, Agenor, não conhecia um pai de santo bom, bom mesmo, que entendesse de mandinga de mulher malamada, pois ele tinha certeza: foi mulher, sim, que lhe jogara aquele trabalho desgostoso, para descompensar sua rola, foi mulher sim.

Agenor ficou impressionado. Seo Ribamar era homem forte, de saúde, viúvo e namorador. Difícil crer que tão cedo deixasse de dar nos couros. Sim, ele sabia de um pai de santo muito bom, lá para as bandas do Paredão, fosse lá que ele com certeza anularia aquele encosto de mulher ruim. Seo Ribamar agradeceu e saiu. Agenor viu o homem se afastar e bateu três vezes na madeira.

Então, começaram a chegar as notícias. O atendente da farmácia, rapaz novo, não tinha vinte anos, também andava com o mesmo problema, como podia? E o cabo Nonato, famoso pela ruma de namorada que tinha, também havia ido ao Paredão se consultar com o pai de santo para se curar de uma desgraceira repentina que o deixara inutilizado para as artes da agarração.

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aDe um dia para o outro, boa parte dos homens de Jubá estava broxa e o assunto era o preferido nas rodas de conversa. As beatas nas janelas invocavam Esaú aos Filisteus, capítulo 2, versículo 14: “E o peso da descrença pesará sobre a virilidade dos ímpios, e estes serão marcados pelo Anjo com o castigo de não poderem mais dar filhos às suas mulheres e a Terra os amaldiçoará.” Benza Deus.

Autoridades evitavam se pronunciar sobre o assunto porque o fato provocava risinhos e constrangimentos. O que estava acontecendo, afinal? Ninguém possuía explicação convincente para o fato e os médicos da cidade se debatiam entre teorias diversas, sem chegar a conclusão alguma.

A cada notícia, Agenor se assustava e corria para o banheiro para se investigar, munido de algum recorte de revista. Não, com ele não, felizmente. Com ele tudo corria normalmente, conforme a natureza estabelecera. E com as mulheres, tudo normal também: elas continuavam distantes como sempre.

Alguns forasteiros, atraídos pela notícia de que as mulheres de Jubá estavam que nem lagartixa, subindo pelas paredes, decidiram descer por lá e averiguar se a história tinha mesmo cabimento. Resultado: os hotéis da cidade agora estavam lotados. Se a broxação geral representava um golpe no orgulho dos machos jubaenses, a receita do turismo fechava os olhos dos donos de hotéis.

Os homens sérios de Jubá não gostaram nem um pouco dessas novidades, lógico, e exigiram posição firme das autoridades. Uma equipe médica da capital foi designada para estudar a estranha epidemia e, após muitos exames, constatou que, com exceção de uns gatos pingados, toda a população masculina da cidade fora afetada. Uma tragédia.

Apesar de todos os esforços, a equipe deixou a cidade sem qualquer explicação para o fenômeno. Bem ao contrário de outras coisas na cidade, o mistério continuava de pé.

Receitas, simpatias, promessas e orações, tudo foi usado contra a desgraceira. A Ladainha Milagrosa dos Sete Pingos, ou Ladainha da Bengala Poderosa, como também é conhecida, que diz que é tiro-e-queda, reapareceu por esses dias com força total, circulando pelas banquinhas da feira e até mesmo em farmácia, veja o desmantelo da situação. Ela dizia que o cidadão, pouco antes de começar a peleja do amor, devia acender uma vela branca nunca antes usada e, ajoelhado na direção de Juazeiro do Norte, deixar cair sete pingos sobre o dito cujo desmilinguido enquanto rezava:

Com minha fé e humildade, eu trago aberto o coração
E rogo pela intercessão de quem escuta o meu pedir
Que me ajude nessa prece para expulsar o malefício
Acabando o meu suplício nos sete pingos a cair

Minha bengala poderosa, acuda logo sem demora
Que é urgente essa hora de dor, espanto e aflição
Minha bengala poderosa, cancele a lei da gravidade
Para que suma a maldade e suba logo o cacetão

O estojinho contendo vela e folheto vendeu que nem bolacha. Só não ensinava para que lado ficava exatamente a cidade de Juazeiro, indesculpável falha que, certamente, deve ter inviabilizado muita reza, pois ninguém viu melhora alguma na situação.

Um jornalista da capital, que acompanhava o trabalho dos médicos, levou as informações para o seu jornal, e pronto: no outro dia, os leitores estavam cientes da desgraça da pequena Jubá. No mesmo dia, chegaram repórteres de rádio, jornal e tevê, e a cidade se transformou em notícia obrigatória em todo o estado. Até um laboratório farmacêutico, que produzia as tais pilulazinhas milagrosas, andou distribuindo amostras grátis, farejando na desgraceira alheia uma boa oportunidade de negócios. Mas deu com os burros nágua: para os homens de Jubá, as pilulazinhas e nada eram a mesma coisa.

Foi então que começaram a chegar notícias de outras localidades próximas: nelas também estava ocorrendo a mesma coisa! Tudo o que acontecera em Jubá estava nelas se repetindo, o mesmíssimo drama. E poucos dias depois, soube-se dos primeiros casos na capital e fora do estado ‒ era uma epidemia, desconhecida e assustadora. Logo depois, cidades do país inteiro exibiam alarmadas seus casos de impotência. Daí a mais uns dias e o mal já havia alcançado os outros países. A desgraça atingira nível de pandemia.

Cientistas se esforçavam por explicar, políticos exigiam verbas, empresários se mobilizavam, organizações formavam passeatas… O mundo inteiro não falava em outra coisa. Da Europa aos recônditos da África, de Santiago a Vladvostock, os homens, pretos, brancos, índios e amarelos, ricos e pobres, sucumbiam ao mal sem que ninguém entendesse por que diabos aquilo acontecia.

*     *     *

Desde o primeiro caso notificado em Jubá tinham se passado quase seis meses, e as estatísticas mostravam que noventa por cento da população mundial masculina fora afetada pela repentina impotência, e os casos seguiam aumentando, sem poupar nem os adolescentes, coitados, mal entrados no assunto. Podia-se realizar inseminação artificial nas mulheres, é claro, mas isso não resolvia o problema. Muito menos explicava.

Enquanto isso, médicos e terapeutas faturavam alto com o desespero, líderes religiosos engordavam a conta bancária, pomadas e sprays milagrosos surgiam às centenas e os vibradores viraram itens obrigatoríssimos no comércio inteiro, fazendo surgir inclusive um projeto de lei que incluía o vibrador na cesta básica.

Enquanto o mundo vivia seu terrível pesadelo, naquele domingo Agenor acordou sorridente. Após dois sorvetes na lanchonete e três noites de conversa mole na porta de sua casa, Dorinha aceitara seu pedido e agora estavam namorando, ela que já fazia algum tempo comprovava, nas despedidas ao portão, que aquele romance tinha, literalmente, onde se segurar. E, para comemorar o namoro, ela conseguira folga no restaurante e passaram o sábado na lagoa bebendo vermute. No fim, já noite escura, ela o puxou para si e ali mesmo sacramentaram o nheconheco, ele alegríssimo, ela em desesperado ardor, como se havia muito não soubesse como era um homem, coitada. Embora não houvesse muitas estrelas no céu, Dorinha viu uma constelação delas, todas brilhando só para si.

Quando as amigas de Dorinha souberam que ela estava namorando Agenor e andava cantarolando alegre e vistosa, chegaram à mais óbvia das mais óbvias das conclusões. Assim foi que a partir desse dia, Agenor pôde perceber uns olhares mais insinuantes pela rua e por onde quer que fosse.

Belo dia, ao receber a correspondência entregue por Agenor, a moça da butique, de nome Carmela e apelido Botinha, que por sinal era prima da Dorinha, mas, ao contrário da prima, nunca se prestara a saliência na frente do portão, perguntou mui delicadamente a Agenor se por um acaso ele não faria a gentileza de matar uma barata voadora que teimava em não querer deixar o depósito lá atrás, ela que tinha pavor de barata, quanto mais voadora. Agenor, muito solícito, dispôs-se. Quando chegou ao depósito foi que percebeu que era outra a barata. Embora a moça não fosse lá muito bem dotada de atributos físicos, tendo, inclusive, de usar bota ortopédica, daí o apelido, por causa de uma perna maior que a outra, sem falar num braço seco que furou no prego, Agenor foi solidário, ah, foi, sim, e fez com que a danada da barata se aquietasse. E voltou para a rua de ânimo revigorado, nem ligando para os cães que detestavam carteiros.

Mas em cidade pequena as notícias correm que nem fogo morro acima. Dois dias depois, elas foram dar no ouvido de Dorinha que, depois de largar meia dúzia de mãozada na cara da prima Botinha traidora, tratou logo de tomar providências contra o perigo que corria seu patrimônio. O que fez: botou as amigas, todas de altíssima confiança, para acompanhar a trajetória do namorado pelas ruas da cidade, olheiras a bem dizer, uma vez que ela mesma não podia fazê-lo, já que pegava no batente o dia inteiro no restaurante.

Uma semana depois, Agenor já havia sido requisitado para matar duas dezenas de baratas pela cidade, inclusive na casa das tais olheiras, algumas delas crentes, irmãs em Cristo, sim, que Cristo, bom que se diga, não tem nada a ver com certas agonias femininas que costumam dar no fim da tarde, quando o sol desce em Jubá e sopra um ventinho fresco que se intromete por baixo das saias.

Dorinha, de sangue quente por causa da crescente fama do namorado, agarrou-o pelo cangote no meio da praça e deu o ultimato: ou ela ou as baratas, que ela não era mulher de dividir com as outras aquilo que de direito era só dela.

Agenor pensou um pouco. Não era sua intenção magoá-la, Dorinha era mulher boa e ele gostava muito dela. Mas é que as baratas… Bem, elas lhe acenavam com um horizonte bem mais amplo de possibilidades, digamos dessa forma. Andava até pensando em montar uma firmazinha de dedetização, o mercado era promissor.

Ficaria com elas, as baratas. Foi o que respondeu.

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aQuem estava na praça viu quando o tabefe de Dorinha estalou no pé da orelha do carteiro, tabefe daqueles de ficar zunindo por três dias. Ela virou as costas e saiu, o passo ligeiro, a tromba desse tamanho, deixando Agenor de quatro a recolher as correspondências caídas ao chão.

Na mesma noite, porém, ela haveria de cair em si e se arrepender, tentar reconciliação, haja vista a carência horrorosa de homem na cidade. Melhor dividir o prato que não ter o que comer, coisa mais óbvia, né?

Mas nada feito. Agora era Agenor, ainda com a orelha ardendo, coitado, quem não queria. Dorinha chegara atrasada à obviedade.

No dia seguinte, um conhecido repórter da rádio local, de modos muito delicados, e que fazia reportagem sobre a pandemia, cismou de querer entrevistar algum homem que ainda estivesse com suas funções de macho normais. Perguntando daqui e dali, o repórter soube do carteiro Agenor. Animado com a descoberta, alcançou-o no momento em que, fim de expediente, trabalho terminado, o moço se encaminhava para matar uma barata lá para o lado do açude. Porém, tímido como era, Agenor nem deixou que o repórter lhe explicasse o motivo da entrevista e saiu correndo.

Naquela mesma noite, a reportagem foi ao ar. Não continha a entrevista de Agenor, claro, mas falava dele. E bem.

Dez minutos após terminada a reportagem, já tinha gente em frente à casa do carteiro Agenor, homens e mulheres. Um pouco assustada, Dona Fafá lhes informou que o filho não estava, mas que não demoraria a chegar. Todos resolveram aguardar, enquanto outros chegavam.

Do outro lado da cidade, Agenor pediu que a moça parasse um pouquinho com o vai e vem sobre seu corpo porque ele acabara de escutar seu nome no rádio.

– Preciso ir pra casa – falou, afastando a moça. – Mamãe deve tá preocupada.

– Ah, só mais um pouquinho…

Era a terceira vez que escutava aquela frase naquele dia.

Alguns minutos depois, Agenor dobrou a esquina de sua rua e tomou um susto. Havia um bando de gente em frente à sua casa. Ele se escondeu atrás de uma árvore, com medo. Decidiu entrar pelos fundos.

– Filho, aquilo que saiu no rádio é verdade? – Foi a primeira coisa que a mãe perguntou, ao abrir a porta do quintal para ele entrar.

– Mãe, a senhora viu? Tem uma ruma de gente lá fora.

– Na sala também. O Chico da Magnólia, seu tio Ferreirinha… Suas primas também estão aí. Até o prefeito veio.

– Pode dizer pra todo mundo que eu viajei.

– Mas…

– Vai, mãe. Vou esperar aqui.

‒ Já jantou?

‒ Não tô com fome. Vai, mãe.

Agenor escondeu-se no quartinho dos fundos enquanto dona Fafá voltava à sala.

– Foi um custo, mas foram embora – ela disse, retornando. – Agora me conte direito essa história.

Agenor falou que não sabia o que estava acontecendo. Mas estava muito preocupado com tudo aquilo.

– Então, vá dormir, filho, que é melhor. Estou vendo que você está cansado. Trabalhou muito hoje, né?

Agenor pediu a bênção e foi para o quarto. Mas sono que é bom, não teve, não conseguiu pregar o olho. Sem falar que, perto da meia-noite, uma vizinha conseguiu entrar pela janela e se atracou com ele, quase que não consegue se soltar, a moça pedindo pelo amor que ele tinha a Nossa Senhorinha que também desse uma chinelada em sua barata, que ela andava muito precisada. E, já perto de amanhecer, foi a Jaciara, filha do dono do cartório, que todo mundo desconfiava ser meio destrambelhada do juízo. Pois ela provou que era mesmo: trepou-se no telhado da casa, e ficou lá em cima, peladinha da silva, berrando para toda a cidade ouvir que estava grávida de Agenor. Mentira, claro, Agenor nunca nem tocara na moça, e ela antes nunca nem tinha olhado para ele.

Assustado e exausto pela noite em claro, Agenor decidiu que o melhor era ir embora.

– A gente pode mudar de endereço.

– Não vai adiantar, mãe.

– O mundo lá fora é tão perigoso, filho. Essas mulheres todas se enxerindo pra você…

Agenor olhou para a mãe e sentiu uma pontada de tristeza magoar seu coração. Súbito, percebeu o quanto estava sendo egoísta. Como podia pensar em abandonar sua mãe querida, deixá-la sozinha? Pensava apenas em si mesmo.

Então, se achegou no colo da mãe, que o abraçou forte, abraço sentido, apertado, seu corpo envolvendo o do filho amado. Agenor fechou os olhos e deixou-se levar por aquele abraço gostoso, o mormaço aconchegante dos seios de dona Fafá, que o apertava forte contra si, mais forte, mais forte…

Agenor abriu os olhos. O rosto afundado entre os seios grandes da mãe, quase não conseguia respirar. Um terror repentino se apossou de sua alma. O que estava fazendo?

– Tenho que ir embora, mãe… – balbuciou, levantando. – A senhora me perdoa?

– Eu sabia que um dia você ia partir, filho.

Ela foi ao quarto e voltou com umas notas que tirara do fundo da gaveta.

– Guardei esse dinheirinho pra você. É muito não, mas ajuda. Tome, leve. Vou ligar para minha irmã, em Bocariús. Zulmira vai lhe receber.

Na rodoviária, enquanto Agenor esperava o ônibus, foi surpreendido pela equipe de tevê da capital, que acabara de chegar a Jubá à sua procura. Ele não quis dar entrevista, mas mesmo assim o filmaram entrando no ônibus.

Na estrada, a caminho de Bocariús, foi que atinou: o pacto com o diabo! E ficou pasmo, os olhos arregalados. Tudo aquilo seria o pacto funcionando?, ele se perguntava, a mão sobre o coração agitado. Talvez o diabo estivesse realizando seu desejo, embora por vias que ele jamais pudesse atinar. Todo o tempo pensou que ficaria mais bonito, ou que o diabo lhe forneceria um perfume irresistível… Mas não, não foi nada disso.

Se era realmente o pacto funcionando, então lamentava que os outros homens estivessem pagando tão caro pela sua felicidade. Mas talvez fosse só por um tempo, logo voltariam ao normal. Mas se voltassem ao normal, como ficaria ele?

O ônibus chegou a Bocariús no fim da manhã. Agenor estava faminto, pensava somente num prato de comida. Encostou-se no balcão da lanchonete e pediu arroz, feijão, bife e ovo. Na tevê, passava uma reportagem, mostrando o último homem de Jubá entrando no ônibus, seguindo para… Bocariús.

Todos na lanchonete pararam ao ouvir o nome da cidade. Agenor nem respirava. A garçonete foi a primeira a reconhecê-lo.

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2a– Gente, é ele! O homem de Jubá!

No instante seguinte, estavam todos à sua volta, queriam perguntar coisas, tocá-lo. Os homens imploravam que divulgasse a receita milagrosa, as mulheres o abordavam, eufóricas. Agenor se desvencilhou como pôde e saiu. Mas as pessoas o seguiram. É o gostosão de Jubá!, uma garota gritou da janela do ônibus que passava na rua. Ele vai morar aqui!, gritou a outra. E a terceira completou: E vai casar comigo!!!

Em dois minutos, uma multidão o acompanhava pelas ruas, parecia uma procissão. O comércio fechou para vê-lo passar. Agenor correu e a multidão correu atrás. Finalmente, chegou à casa da irmã de sua mãe, ofegante, a roupa rasgada, um sapato faltando. Tia Zulmira, noventa e cinco quilos de gordura e macheza, abriu rápido a porta e botou para dentro o sobrinho escangalhado. Depois, brandindo a carabina velha, gritou que o primeiro que chegasse perto ia ficar que nem peneira. E atirou para o alto, espalhando a multidão.

Porém, a cidade inteira já sabia quem havia chegado e não o deixaram em paz nem por um minuto. Eram populares, radialistas, comerciantes, religiosos, vereadores e toda classe de gente interessada em ter com o último homem de Jubá. A tia trancara portas e janelas e desligara o telefone. Mas lá fora a multidão alvoroçada gritava seu nome, e tarde da noite ainda tinha gente rondando a casa.

Agenor estava cada vez mais assustado. A tia, porém, lhe garantiu que ali dentro ele estava seguro.

– Obrigado, tia. Vou ficar em dívida com a senhora pro resto da vida.

De madrugada, outra noite sem conseguir dormir, Agenor viu a tia entrando no quarto.

– Ô, meu filho, acuda sua tia, acuda… Não é só lá em Jubá que tem carestia de homem não…

Foi assim que Agenor pagou a dívida.

Antes que amanhecesse, ele aproveitou a escuridão, correu para a estrada e pegou carona num caminhão. Sorte que o motorista não o reconheceu. Desceu numa cidadezinha que nem sabia o nome. Mas lá as pessoas também sabiam quem ele era, e havia homens revoltados, se arregimentando para capá-lo, e as mulheres, revoltadas, tentando impedir. Quando a polícia chegou, ele precisou correr bastante para não ser preso por incitar a desordem.

Pobre Agenor. Já não havia mais onde se esconder. Sua imagem fora divulgada pela tevê para todo o planeta, o planeta sabia seu nome, todos conheciam detalhes de sua vida. Para onde fosse, seria reconhecido. Podia ser preso, podia ser morto.

Mas… havia um lugar, sim, lembrou Agenor, a esperança de repente renascida. A capital. Lá tinha muita gente, parecia formigueiro. E as pessoas estavam sempre ocupadas demais para reparar nas outras.

Foi assim que Agenor, pela primeira vez na vida, pisou o chão da cidade grande. Escondendo o rosto com boné e óculos escuros. Na primeira lixeira, jogou fora todos os seus documentos. Não era mais Agenor. Era um ninguém.

*     *     *

O mundo inteiro continuava buscando a explicação e, principalmente, a solução para o problema da impotência generalizada. Jubá, a pequenina cidade interiorana, virara atração internacional, por ter sido lá onde a estranha pandemia começou. Assim foi que os jubaenses, de repente, se viram entre autoridades de diversos países, toda uma espécie de gente ávida por saber o que havia naquela cidade que pudesse ter causado o que causou. Jubá, a cidade celebrizada pela desgraça.

– Dizem que só sobrou um homem sadio em Jubá – explicou o prefeito na coletiva de imprensa. – Mas ele fugiu, ninguém sabe onde se meteu. Aproveitando a ocasião, gostaria de dizer que inauguraremos um monumento comemorativo dessa pandemia que projetou para todo o planeta o nome da próspera cidade de Jubá e…

Pelos quatro cantos do mundo os jornais ofereciam anúncios de mulheres, e homens também, que pagavam fortunas por uma noite, uma noite apenas com qualquer um que houvesse escapado da broxação geral. Na tevê, os cientistas, olheiras profundas, imploravam que se apresentassem aqueles que ainda podiam ser preservados da pandemia. Nas ruas, os semblantes seguiam tristes. Nas igrejas, os sermões falavam de castigo divino, de Sodoma e Gomorra revividas, era o fim do mundo das profecias.

Parecia que o sombrio e previsível fim havia finalmente chegado: o mundo não tinha mais homens dignos do nome.

*     *     *

Seis meses após chegar à capital, lá estava Agenor, ao lado do ponto de ônibus, sentado na calçada, a mão estendida. Era o seu ponto de pedir esmolas. O local não era muito movimentado, mas pelo menos não tinha dono para cobrar aluguel, como os outros pontos. A barba crescida, o boné e as roupas sujas faziam-no apenas mais um entre os tantos mendigos que compunham a cena decadente da cidade grande.

O que ganhava era o suficiente para não morrer de fome e de frio. Dormia num velho prédio que fora abandonado no meio da construção, onde também dormiam outros mendigos, com os quais evitava maiores contatos. Não era um lar, era um esconderijo. As pouquíssimas coisas que possuía levava sempre consigo numa bolsa de pano, que um dia fora branca. E tomava banho, quando era possível, usando a torneira da praça, na discrição da madrugada.

A vida na clandestinidade era muito difícil, claro, mas era melhor ser ninguém que ser reconhecido na rua e ir parar sabe-se lá onde, nas mãos de sabe-se lá que tipo de gente. Emprego, então, nem pensar. Mesmo que conseguisse empregar-se sem documentos, isso seria arriscar-se demais.

Não tinha amigos, não podia confiar em ninguém. A solidão era a companheira, ela e a saudade da mãe e dos amigos. Sua vida chegara a uma rua sem saída, onde ele não podia seguir em frente e, muito menos, voltar. Estava condenado a viver aquela subvida até o último dia, quando finalmente o diabo voltaria para receber sua alma como pagamento pelo serviço. A não ser que…

A não ser que descobrissem a cura para a impotência generalizada. Quando isso acontecesse, Agenor finalmente poderia deixar de ser ninguém para ser novamente… Agenor. Ou seja, continuaria a ser ninguém, mas, pelo menos, teria um lar e não precisaria pedir esmolas.

Que grande ironia…. Obtivera a realização do seu maior desejo e, no entanto, não podia usufruir nem um pouco dele. Era ardentemente desejado por todas as mulheres, era o último homem do mundo – e não havia nenhuma vantagem nisso.

Às vezes, tomava coragem e caminhava pelas ruas, ia aos parques, mas sempre surgia algum guarda ou policial para importuná-lo. Outras vezes, percebia uns certos olhares desconfiados… Pronto, era o bastante para fazê-lo voltar imediatamente ao esconderijo. Estava bem diferente da imagem que o tornara famoso, sim, mas todo cuidado era pouco.

Pelos jornais que pegava no lixo ou pela tevê do botequim, Agenor acompanhava as notícias da pandemia. Sabia que tudo continuava do mesmo jeito. E sabia que o mundo inteiro prosseguia a busca pelo último homem do mundo, como ele ficara conhecido. Seu desaparecimento gerara uma série de hipóteses, desde as que afirmavam que ele fora assassinado às que sustentavam que ele era mantido preso nos subterrâneos de um laboratório enquanto cientistas tentavam decifrar seu segredo. Corria a notícia que o último homem do mundo fugira para uma ilha distante e montara um harém só para ele, mandando buscar as mulheres mais lindas do mundo…

Agenor até ria desses absurdos, era mesmo incrível a imaginação do povo. Mas não dava para rir quando via seu rosto surgir na tela da tevê, o que acontecia quase todo dia. Nessas ocasiões, ele baixava ainda mais o boné sobre o rosto e saía de mansinho, tremendo de medo.

Tão grande quanto o medo de ser descoberto, porém, era a angústia que lhe faziam sentir… as mulheres. Ah, as mulheres da cidade grande… Eram lindas, carnudas, bem aprumadas, vestiam-se com elegância, a pele fresquinha, o cabelo bem tratado, o jeito de andar… Elas enfeitavam todos os lugares, as ruas, as lojas, os bares. Onde estivesse, vinha-lhe o perfume inebriante da tentação, atingindo-o em cheio. À noite, deitado sobre os papelões que lhe serviam de cama, rolava de um lado para outro, a imagem de uma ruma de mulheres desfilando em seu pensamento, aquela de vermelho com quem cruzou na esquina e aquela que passou no ônibus e aquela vendedora de flores, todas elas, mil mulheres… Mil possibilidades que, entretanto, sempre terminavam expelidas em jatos de prazer solitário.

Uma vez, sem aguentar mais, dirigiu-se à periferia em busca de um cabaré, mesmo consciente do altíssimo risco da operação. Mas não encontrou nenhum. Foi então que soube que todos os cabarés haviam fechado. Por absoluta falta de clientes.

Até que uma noite…

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aDesde o início, Agenor adquirira um hábito: guardar classificados dos jornais que recolhia no lixo. Recortava pedaços e juntava aos que possuía. Eram anúncios de mulheres oferecendo verdadeiras fortunas por uma noite com um homem de verdade. Pois bem. Naquela noite, no auge da angústia e da solidão, ele separou um anúncio e com ele desceu as escadas sem corrimão do velho prédio inacabado. De um orelhão da rua ligou para o número do anúncio. Uma voz de mulher atendeu… Ele falou quem ele era. A mulher não acreditou. Nervoso, ele insistiu, disse que poderia facilmente provar, mas para isso precisavam se encontrar. Então, a mulher pediu o endereço e informou que enviaria um táxi imediatamente.

Enquanto Agenor aguardava, ansioso, começou a chover e ele se protegeu sob o orelhão. Não sabia se fizera a coisa certa, mas já não voltaria atrás.

Logo, o táxi chegou. Ele entrou e acomodou-se no banco de trás, molhado da chuva. Estava nervoso, mas esperançoso. Aquela podia ser a saída que tanto buscava: uma mulher rica e insatisfeita, disposta a pagar muito por um homem que lhe desse prazer. Ela o levaria para morar numa bonita casa de praia, cozinharia para ele, lhe compraria roupas caras, lhe daria um carro bonito e lhe ensinaria a dirigir, faria todas as suas vontades. Em troca disso tudo, ele teria apenas que ser o que era: um homem. Só isso.

O táxi parou em frente a uma casa. Agenor reparou que era grande e bonita, com um jardim cheio de plantas coloridas. Um homem de paletó, com um guarda-chuva, abriu a porta do carro.

– Boa noite, senhor. Queira acompanhar-me, por gentileza.

Agenor foi conduzido pelo jardim, subiu uma escadaria e entrou numa sala.

– Por favor, sente-se. Anunciarei sua chegada.

Agenor sentou-se no sofá, admirando os móveis e os quadros nas paredes. Devia ser uma mulher muito rica, pensou, satisfeito. Aproveitando o espelho ao lado, passou o pente no cabelo e ajeitou a camisa. Por sorte havia tomado banho aquele dia. Pensara até em tirar a barba, mas não teve coragem.

Uma outra porta se abriu e uma moça muito bonita surgiu à sua frente. Tinha lindos cabelos loiros, um rosto suave e… sorria. E vestia uma camisola transparente que nada escondia de seu maravilhoso corpo.

– Agenor de Jubá? – perguntou, delicadamente.

– Sim… sou eu… – gaguejou Agenor, o desejo já se manifestando sob as calças.

Ela se aproximou.

– Como posso ter certeza disso?

Agenor sorriu, sem saber o que responder. De repente, ela o empurrou e ele caiu sentado no sofá. Ela ajoelhou-se, tirou seus sapatos, depois sua calça, a cueca, deixando-o inteiramente nu.

– A senhora pensou que eu estava mentindo, né? – disse ele, vendo que ela olhava impressionada para o meio de suas pernas. – Menti, não.

Ela continuou ajoelhada entre suas pernas, o queixo caído, os olhos de quem não acredita no que vê. Então, ela gritou, alvoroçada:

– Está no ponto! Está no ponto!

Agenor achou estranho, mas já sabia que as mulheres da cidade grande possuíam hábitos esquisitos, de forma que apenas riu. No instante seguinte, surgiram uma mulher e dois homens, carregando equipamentos.

– Obrigado – a mulher falou para a moça de camisola. – Agora é com a gente.

– Não dá pra eu ficar sozinha com ele por dez minutinhos? – perguntou a moça.

Um dos homens, porém, a puxou e a afastou para o outro lado da sala. Agenor percebeu que o outro homem empunhava uma câmera de filmar. Uma luz forte acendeu-se sobre ele.

– Estamos transmitindo ao vivo! – disse a mulher, falando no microfone. – Isso que você está vendo não é truque. A imagem não deixa qualquer dúvida: é o último homem do mundo! Nós o encontramos! Vocês podem ver, olhem aqui, é incrível, é, é inacreditável, é… maravilhoso…

Apavorado, Agenor levantou de um salto. Um dos homens ainda tentou detê-lo, mas ele saiu correndo, nu como estava, a mulher e os homens correndo atrás, aquela luz a persegui-lo. Saltou o muro da casa e caiu na calçada, no meio de uma poça dágua. A chuva havia aumentado bastante. Agenor levantou, sentindo a perna doendo, e continuou a correr.

Correu e correu até não aguentar mais. Somente então parou e caiu no chão, ofegante, a perna doendo bastante. E assim ficou, estendido no chão da passarela do viaduto, enquanto a chuva descia sobre seu corpo e lá embaixo os automóveis passavam em alta velocidade.

Chegara ao fim. Não tinha mais forças para continuar com aquela vida. Estava cansado de correr, de se esconder, de ser ninguém. Que sentido ainda havia em continuar vivo?

Naquele instante, apesar do cansaço, da dor da perna, de tudo, Agenor fechou os olhos e sorriu. Sorriu porque a ideia do fim era como um bálsamo para sua alma sofredora. Sorriu porque sentia-se finalmente liberto da dolorosa obrigação de viver.

*     *     *

Um tempo depois, Agenor percebeu que havia alguém ao seu lado.

– Humm, você fica horrível sem roupa…

Ainda deitado, Agenor virou o rosto e tentou ver quem era. Mas a água em seus olhos dificultava a visão. Aos poucos, foi enxergando melhor: um par de botas pretas, a ponta de uma bengala…

– Soloniel… – ele sussurrou, reconhecendo o diabo em seu sobretudo.

– O mais astuto dos diabos – respondeu Soloniel, tocando seu chapéu com a ponta dos dedos.

Agenor deitou novamente a cabeça.

– Por que fez isso comigo?

– Como assim? Fiz apenas o que me pediu.

– Eu só queria ser desejado…

– E não conseguiu?

Agenor suspirou, sem forças.

– Creio que ambos concordamos que cumpri minha parte no trato, não é?

Agenor não respondeu. Nada mais importava. Ficaria ali, sob a chuva, até morrer.

– Conforme combinamos, vim buscar meu pagamento.

Agenor escutou aquelas palavras sem qualquer surpresa. Não lhe importava. Já estava morto.

– Por favor, levante-se, jovem. Esta não é a melhor posição para um momento tão solene.

Agenor abriu a boca, deixando que a água entrasse. Bebeu um pouco e depois perguntou, enquanto se erguia com dificuldade, a perna uma dor só.

– O mundo vai continuar como está, todos os homens impotentes?

– O que você acha?

– Não está certo.

O diabo Soloniel riu.

– Sente-se culpado apenas porque realizou seu grande desejo?

Agenor não respondeu.

– Eu devia estar acostumado, mas sempre me encantam essas ironias… – O diabo bateu na bota com a ponta da bengala. – Bem, se isso serve de consolo, depois que você se for, tudo voltará ao normal.

Por um breve instante, Agenor sentiu-se feliz.

– Agora, siga-me. Está na hora.

O diabo caminhou até a murada da passarela e subiu, ficando de pé. Depois, virou-se para Agenor.

– Sua vez.

Agenor foi até a murada e olhou para baixo. Era uma altura considerável. Ouvira dizer que várias pessoas já haviam se jogado dali. Que maneira horrível de morrer, estatelado no asfalto, os carros passando por cima… Depois, seu corpo seria recolhido aos pedaços e levado ao necrotério, ninguém o reconheceria, seria enterrado numa cova qualquer, como indigente…

Apesar da dor na perna, Agenor subiu e firmou os pés sobre o cimento.

– Muito bem – disse o diabo. – Se quiser se despedir, posso dar-lhe um minuto.

De pé na murada, inteiramente nu, Agenor viu as luzes da cidade ao redor. O som da chuva se misturava ao dos carros passando lá embaixo. A queda seria rápida, uns poucos segundos e pronto, tudo estaria acabado, não haveria mais sofrimento.

– Um, dois, três e…

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aDe repente… uma dúvida. Como assim não haveria mais sofrimento? Esperava o quê do inferno? Agenor olhou para o diabo, pensando em como perguntar sobre aquela questão repentina.

– Que saco. O que foi agora, meu jovem?

– Como é o Inferno?

O diabo pareceu não acreditar no que ouvia.

– Você quer que eu lhe explique como é o Inferno? Agora?

– É que… não consigo imaginar algo pior do que o que já estou vivendo.

O diabo bateu na bota com a bengala.

– Bem, digamos que seu caso é uma exceção.

– Como assim?

– Como havia lhe dito, todos os diabos sonham com um pedido como o seu. Realizá-lo significaria a glória eterna para um diabo, o nome para sempre brilhando em ouro na entrada do Inferno. Bem, eu consegui. E graças a você.

Agenor escutava, curioso.

– Então, como retribuição, reservei um lugar especial para você. Será meu assessor. Você sabe, já estou velho, preciso dividir o serviço.

– Assessor? Eu?

– Claro. Dentro de alguns segundos, você também será um diabo. E já tem um serviço esperando.

– Como assim?

O diabo fez uma pausa enquanto sorria.

– Dorinha vai fazer o pacto. Assim que terminar com você, irei encontrá-la.

– Dorinha?! – exclamou Agenor, surpreso.

– Sim, sua ex-namorada. Aquela que você abandonou.

A lembrança de Dorinha chegou, vinda de longe… Agenor viu seu rosto bonito, sorridente… Uma sensação de suavidade e ternura tomou-lhe conta. A doce Dorinha, esquecera dela. Esquecera dos bons momentos que viveram, antes daquele pesadelo começar.

– Pois ela não esqueceu. E sabe qual é o pedido dela?

Agenor ficou calado, com medo do que poderia escutar.

– Que você volte para ela.

– Não acredito…

– Pelo jeito, ela gosta muito de você.

Agenor estava confuso.

– A ponto de sacrificar a própria alma.

Mas como aquilo seria possível?, Agenor pensou. Como ele voltaria para Dorinha se iria para o Inferno?

O diabo deu uma gargalhada.

– Você vai para o Inferno, sim. Mas logo voltará aqui. Para buscar Dorinha. Dessa forma, ela terá seu grande desejo realizado. Soloniel é um diabo de palavra.

Agenor não acreditou. Aquilo não podia acontecer. Não com Dorinha.

– Escute, Soloniel, Dorinha é uma pessoa boa, não merece sofrer.

– Todos têm que sofrer. É a lei da vida.

– Mas não deviam vender a alma!

Agenor se surpreendeu com o próprio grito. E com o raio que caiu próximo, seguido de um estrondoso trovão. Ao seu lado, o diabo o encarava, muito sério.

– Ainda bem que você não é o dono do Inferno. Eu perderia meu emprego. Agora, salte, já me fez perder muito tempo.

Agenor continuou parado, a água da chuva escorrendo por seu rosto.

– Salte, homem. Ainda tenho trabalho hoje.

Agenor nem se mexeu.

Então. a dor, súbita e aguda. O diabo o atingira com uma bengalada na perna machucada, fazendo-o gritar de dor.

– Algo me diz que você também precisará de uma bengala em sua nova vida.

Desequilibrado, Agenor agitou os braços, como se pudesse se segurar em algo, e seus movimentos pareceram uma estranha dança. Seu corpo caiu pesadamente e se chocou todo desajeitado contra o chão.

Quando abriu os olhos, já não havia dor. E a chuva havia parado. Não viu a passarela. Nem os carros. Nem a avenida, nem a cidade, nada. Estava no Inferno? Ao redor, via apenas mato. Mas o Inferno tinha mato? No céu, as estrelas brilhavam.

Levantou, sentindo o coração acelerado, o suor no rosto. Adormecera enquanto aguardava pelo diabo, e tivera um pesadelo horrível. E caíra da pedra. Estava no alto do morro, a cidade de Jubá lá embaixo.

Como pudera sonhar tanto em tão pouco tempo? E fora tudo tão real, tão real…

Pegou o cobertor no chão. Depois, olhou o relógio. Era meia-noite, em ponto. Nesse momento, escutou um ruído, alguém chegava pelo mato. O ruído ficou mais forte e ele viu as folhas mexerem.

Não teve dúvidas: deu meia-volta e saiu numa carreira apavorada, descendo aos saltos a encosta do morro, sem olhar para trás. Entrou na cidade e só parou de correr quando chegou em casa.

– Meu filho, onde você estava? – perguntou dona Fafá, vindo da cozinha. – Venha jantar.

– Oi, mãe… – ele murmurou, ofegante, fechando rapidamente a porta e passando a tranca.

– Que cara é essa? Parece que viu alma.

Agenor beijou a mãe e foi para a cozinha.

– Quem esteve aqui agora há pouco foi Dorinha.

– Dorinha? – ele perguntou, surpreso.

– Sim, vinha do restaurante. Perguntou de você. Menina boa, ela.

– E… pra onde ela foi?

– Disse que ia se encontrar com alguém e depois ia para casa.

– Encontrar… com alguém? A essa hora?

O coração de Agenor batia forte. Foi então que alguém bateu na porta.

– Tá esperando alguém? – disse dona Fafá, caminhando para abrir a porta.

– Não, mãe! Não abra!

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aDona Fafá parou e olhou para o filho, desconfiada.

– Você andou bebendo?

Agenor correu para impedir, mas ela abriu a porta, enquanto ele fechava os olhos para não ver.

– Oi, Agenor.

Aquela voz…

– Mas que pressa medonha, Agenor! Passou correndo por mim, nem me ouviu te chamar…

Ele abriu os olhos e viu Dorinha.

– Tem comida na geladeira, viu, filho? – disse dona Fafá, piscando um olho para Dorinha e saindo da sala.

– Você… foi encontrar… alguém? – ele indagou, gaguejando.

– Fui.

– Quem?

– A prima Botinha. Ela vai casar, sabia? E a festa vai ser lá no restaurante.

Ele suspirou, aliviado. Depois desviou o olhar, com vergonha.

– E você, tudo bem?

Ele fez que sim com a cabeça. Ela sorriu.

– Vim só dar um oi.

Ele procurou algo para dizer, mas não achou. O coração ainda batia acelerado. Dorinha… Em Jubá até havia mulheres mais bonitas que ela, mas Dorinha era especial, tinha um algo mais… Se ela soubesse quantas noites ele sonhara com ela… em seus braços…

– Bem, acho que já vou indo.

– Vai?

– Tá tarde, Agenor.

Ele sentiu uma súbita vontade de abraçá-la. Mas a timidez jamais permitiria. A velha timidez que nos últimos meses sempre o impedia de dizer a ela o que sentia.

– Dorinha…

– Sim?

Ela aguardava.

– É, está tarde mesmo ‒ ele falou, sorrindo nervosamente. Nunca conseguia. Jamais conseguiria.

– Tchau, Agenor. Aparece no restaurante.

Dorinha virou-se e saiu. Agenor foi para o batente da porta e de lá a observou caminhando pela calçada. Não fora forte para fazer o pacto. E nem era forte para lutar pela mulher com quem tanto sonhava. Era um fraco.

Naquele instante, um carro passou na rua e a luz dos faróis bateu em cheio sobre seu rosto. Lembrou da luz a persegui-lo enquanto tentava escapar da equipe de tevê. Então, num impulso, sem pensar no que fazia, abriu a porta e saiu correndo.

Na esquina, o carro fez a curva e sumiu. Mas Agenor não dobrou a esquina, não era o carro que lhe interessava. Continuou correndo e só parou quando alcançou Dorinha, que tomou um susto ao vê-lo chegar e lhe pegar pelos ombros. Sem dizer nada, ele a virou para si e sapecou-lhe um beijo na boca. Dorinha quase caiu, mas ele a amparou e a encostou no muro, sem interromper o beijo.

Um bom tempo depois, quando ele finalmente a largou, Dorinha só de uma coisa sabia: que queria mais.

– Pensei que você não me desejava… – ela murmurou, encostada no muro, toda molenga.

– É que eu… não sabia desejar direito.

E beijaram-se outra vez, mais forte.

Na bodega da esquina, sentado numa mesa com o último cliente da noite, Ribamar olhava satisfeito o casal se beijando.

– Até que enfim esse rapaz tomou tenência. A moça doidinha por ele…

– Quanto lhe devo, meu amigo?

– Um conhaque. Dois reais.

O homem tirou uma nota do bolso do sobretudo e pagou.

– O senhor não é daqui, né? – perguntou Ribamar, recolhendo o copo e levando para o balcão.

– Vim ver um cliente ‒ respondeu o homem, levantando e apoiando-se numa bengala. ‒ Mas ele não apareceu.

– Que pena. Fez viagem perdida.

– Fiz não. No meu ramo, cliente é o que não falta.

– Coisa boa. Que mal pergunte, qual é o seu ramo? – perguntou Ribamar, voltando à mesa.

Mas ela estava vazia. Ninguém na mesa, ninguém por perto.

– Vixe! – exclamou, sentindo um calafrio.

Bateu três vezes na madeira e rapidamente fechou a porta, sem esquecer de dar duas voltas na chave, e do cadeado e da tranca.

Adiante, encostada no muro, Dorinha suspirou nos braços de Agenor e, com os olhinhos fechados, pediu outro beijo. Mais forte.

.
Ricardo Kelmer 1998 – blogdokelmer.com

.

.

BaseadoNissoCapaMiragem-01aEste conto integra o livro
Baseado Nisso – Liberando o bom humor da maconha

> Leia mais. Adquira seu exemplar personalizado

.

.

.

.

O Ultimo Homem do Mundo CAPA 2aO Último Homem do Mundo

O sonho de Agenor é que todas as mulheres do mundo o desejem. Para isso, ele está disposto a fazer um pacto com o diabo. Mas há um velho ditado que diz: cuidado com o que deseja, pois você pode conseguir…

> Para adquirir a versão e-book (Amazon)

.

.

IndecenciasParaOFimDeTardeCAPA-03aTODOS OS LIVROS

Todos os livros kelméricos, em versões impressa e eletrônica

.

.

.

.

.

elalivro10Seja Leitor Vip e ganhe:

Acesso aos Arquivos Secretos
Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

COMENTÁRIOS
.

01- Eu gostei deste muito. gigi28 – jul2008

02- Você é bom mesmo, Ricardo. Quando vem a terrinha? Um grande abraço do amigo-leitor seu. Maninho, Fortaleza-CE – ago2008

03- Quem quer todas, não tem nenhuma. A graça de um relacionamento é ir até o fundo, explorar tudo, dure 3 meses ou 10 anos. Mas com inteireza, com verdade. Quem tem todas, não conhece, de verdade, nenhuma. Bjo. Chris, Rio de Janeiro-RJ – jan2009

04- Aquela que serve é a que conhece . conhece mesmo ? e aquele que deseja, é o faminto do lobisomem ? o grande assustado ? o fugitivo de boné … quisera ter o pacto com quem ? efusivo Agenor , talvez um perfume afrodisíaco com a tônica dionisíaca vai saber … agradaria uma bela garçonete que pega a carona no seu caminhão feito mesmo o último homem de jubá …. ahahahahahahah ! Marcia, São Paulo-SP – ago2009

05- Oi, Kelmer! Agenor é bem dotado, também, de criatividade. Ele conseguirá, um dia. rsss Linkei o teu blog no meu. =) Abs! Val – mar2010

06- Ei macho… Tu quer me matar de curiosidade é?? Parabens esse conto é incrível!!! Todo homem já se imaginou nessa situação, o problema é que nenhum homem tentou imaginar a saída desta. Valeu!!! Pedro Henrique – mar2010

07- =D Adorei essa história!!! Parabéns… o desfecho foi muito interessante. Agradeço pela possibilidade de tê-la lido. Mas… Já acabou… =(. Luciana R – abr2010

08- Achei legal o desfecho. Que pena que acabou! Karla – abr2010

09- Adorei! Aplausossssssssssss….. Gostei tanto que fiquei triste por ter acabado, hauhauahau… Parabéns Kelmer. Quero mais histórias assim. ;D Até a próxima! ;* Ingrid – abr2010

10- É até boa, mas muito brusco o fim, o que a torna sem um bom desfecho. Mariana – abr2010

11- Faltaram os créditos para a imagem da pintura usada neste artigo. O autor é o pintor peruano Boris Vallejo. Silveira Neto – abr2010

12- Muito boa a história, acompanhei-a e gostei muito. Até que enfim o Agenor teve coragem. Eu já estava angustiado com a timidez dele. Francisco Edvar – abr2010

13- ACOMPANHEI E GOSTEI DE TODA A HISTÓRIA,PORÉM O FINAL FICOU UM TANTO INCOMPLETO,HAVERÁ CONTINUAÇÃO? Dokho– abr2010

14- eita historia mais envolvente rapaz,cada capitulo era uma viagem,parabens para o escritor que deleitor dentro dos sonhos de muitos homens timidos q desejam serem desejados. Espero outras historias exoticas. Kildery – abr2010

15- Esse cigarrinho era bem docinho, hein? rs. Christiane – mai2010

16- Essa história é genial (O último homem do mundo). Recomendo. Vale muito a pena ler. Marcelo Gavini, São Paulo-SP – jun2010

 


Minhoca na cabeça

24/12/2008

24dez2008

BaseadoNissoCLUBEDEAUTORESCapa-04a.

Este conto integra o livro Baseado Nisso – Liberando o bom humor da maconha, de Ricardo Kelmer

.

MINHOCA NA CABEÇA

Quando o jovem escritor fuma, minhocas saem de sua cabeça. É mais um caso do além para Javier Viegas resolver

.

USADOS E ABUSADOS. Ivan conferiu a placa na fachada da loja de usados e entrou. A moça no balcão o cumprimentou.

– Boa tarde. Posso ajudar?

– É aqui a loja do Javier?

– Sim, Javier Viegas. No momento ele está atendendo, mas deve desocupar em quinze minutos. Aguarde um pouco, por favor.

Ivan sentou-se no sofá e pegou uma revista para folhear. Logo depois estava entretido numa matéria sobre extraterrestres que raptam pessoas para implantar chips em seus cérebros e depois as devolvem à Terra e elas só conseguem recordar o que se passou em sessões de hipnose. Foi quando o homem apareceu, saindo da salinha ao lado, acompanhado de uma senhora de quem se despediu.

– Até logo, dona Iracema. Não esqueça de acender a vela hoje, heim? Vela amarela, virgem, de sete dias.

O homem virou-se para Ivan:

– Boa tarde, o moço está me aguardando?

Ivan reparou na figura: moreno, barrigudinho, meio calvo, cabelo preto, provavelmente com tintura, numa trança única que descia até o meio das costas. Devia ter seus cinquenta anos. Um sotaque espanhol e uns trejeitos afeminados.

– Vi seu anúncio no jornal.

– Ah, entre, entre, por favor. Aceita um licorzito de manga? Ana Isaura, traz dois pra gente, traz.

Era uma sala decorada com coisas antigas, quadros, candelabros, móveis rústicos. Javier lhe ofereceu uma cadeira em frente à mesa e sentou-se na sua, do outro lado, brincando com a longa trança sobre o peito.

– Prazer. Javier Viegas. Tarô e outros babados.

– Prazer, Ivan.

– Ivan, el terrible, ui… Mas diga, meu filho, a que devo o prazer de receber olhos tão bonitos? – E cantarolou: – Lindo, e eu me sinto enfeitiçada, iééé…

– É o seguinte, seo Javier…

– Seo, não. Assim eu não atendo. Pode levantar e ir embora ‒ falou Javier, fingindo estar magoado.

– Desculpe. Javier. Bem, Javier, é uma coisa assim meio… esquisita.

– Mi querido, já vi tanta coisa esquisita neste mundo que não me assusto com mais nada. Olha seu licorzito aí. É caseiro, viu?

Ivan recebeu o cálice que a atendente lhe oferecia. Levou-o à boca, mas foi interrompido por Javier.

– Menino, que heresia! Não vai brindar?

– Ah, claro, claro…

Javier ergueu o cálice e fechou os olhos, concentrado, em silêncio. Ivan esperou que ele concluísse seu ritual, talvez fosse algo esotérico, melhor acompanhar. Fechou os olhos, respirou fundo e escutou:

– Beber sem brindar, dez anos sem pimbar… Brindar sem ver, dez anos sem foder…

Ivan abriu os olhos, surpreso. Javier bebia seu licor, compenetrado, os olhos fechados. Que diabo de sujeito era aquele?

– Muito bom o licor, obrigado – disse Ivan, após provar da bebida.

– Minha mamacita quem faz. Dona Carmela. Todo mês me manda um vidrão assim. Esse é de manga, que é muy bueno, mas tem um de café que você não crê. Aliás, estou procurando um sócio, esses licores de mamãe podem deixar qualquer um milionário. Você não estaria interessado?

– Não obrigado, não gosto de comércio.

– Depois não diga que eu não avisei. Mas fale, conte seu problema.

– Bem, eu… O senhor, digo, você fuma? – Ivan fez o gesto de quem fuma um baseado.

– Marijuana? Não no primeiro encontro – respondeu Javier, rindo. Ivan riu sem jeito. – Não é minha viagem predileta, mas de vez em quando dou meus tapinhas pra ir ver o Almodovar.

– Bem, eu fumo. Quer dizer, fumava. Deixei exatamente porque começou a acontecer uma coisa estranha…

– Hummm, está melhorando. A-do-ro cositas estranhas.

Ivan olhou para a porta, desconfiado.

– Está fechada, menino, fique tranquilo. Fora duas entidades aqui atrás… – e apontou com a ponta da trança por sobre o ombro – aqui nesta sala só tem eu e você, você e eu. Juntinhos. Tim Maia era ótimo, não?

BaseadoNissoCLUBEDEAUTORESCapa-04a– Ah, sim. Era sim. – Ivan pigarreou. E prosseguiu. – Você vê espíritos, Javier?

– Desde que eu era niño de teta. Mas diga, que coisa estranha é essa que lhe acontece?

– Ultimamente, quando eu fumo um baseado, começam a sair minhocas da minha cabeça.

– Minhocas?

– Isso.

– Saem minhocas de dentro da sua cabeça?

– Exatamente. Minhocas. Saem pelas orelhas.

Ivan aguardou enquanto Javier o observava.

– Faz tempo que você fuma marijuana?

– Desde os dezoito. Tô com trinta e quatro.

– Fuma todo dia?

– Geralmente, quando vou escrever. Duas, três vezes por semana. Sou escritor.

– Ah, é escritor? Que bueno receber um escritor em minha sala. Ainda mais um escritor cheio de lombrices na cabeça…

– É sério, Javier. Não é viagem não, é verdade. Olhe, eu trouxe uma aqui pra você ver.

Ivan tirou do bolso da camisa um saquinho de plástico e o estendeu sobre a mesa. Mas Javier o interrompeu.

– Não, não, gracias. Eu acredito em você.

– Pode pegar. É inofensiva.

– Não preciso pegar em sua minhoca pra saber que ela existe, criatura, estou vendo.

– E então? O que você acha?

– Já procurou um médico?

– Nunca falei pra ninguém. Quem ia acreditar?

– Então vamos ter que ver esse babado de perto. Quinta-feira, oito da noite. Tá bom pra você?

– Tá bom.

– Então me espere que eu apareço.

– E quanto vai cobrar?

– Pelo quê?

– Sei lá. Você vai fazer alguma coisa, não vai?

– Bueno, eu cobraria esses seus olhos. Botaria eles numa moldura pra eles ficarem mirando a mim todo dia. Mas como eu sei que você não me daria, então vou cobrar só o preço de custo.

– E quanto é?

– Milzito.

– Mil reais?

– Caro, é?

– Bem que me disseram que você é careiro.

– Careiro é quem cobra caro e não resolve. Eu resolvo.

– Eu não tenho esse dinheiro todo.

– Posso facilitar.

– Não dá pra deixar por cem?

– Cem? Ai, meu são Sebastião flechado… Setecentos.

– Cento e cinquenta.

– Meu filho, sabe quanto me custou esse livro aí que você está com o cotovelito em cima? Cinco mil reais. Mandei buscar em Damasco, veio na corcova de um camelo, protegido por uma caravana de tuaregs barbudos, pegou barco, avião… É um livro sobre como criar demônios em garrafa.

– Você cria demônios?

– Eu não. Mas conheço gente que cria e estou aprendendo a fazer umas garrafitas maravilhosas pros bichinhos morarem com mais dignidade. Sabe a Jeannie É Um Gênio? Pois é daquele modelito, com sofazinho, cortininha… Demônio também é gente.

Ivan coçou a cabeça, pensando se não fora uma péssima ideia ir ali.

– Muito bem. Quinhentos e não se fala mais nisso.

– Duzentos.

– Quatrocentos.

– Duzentos e cinquenta.

– Trezentos, e acabou. Metade agora que estou com o aluguel atrasado. A outra metade no dia.

– Ah, agora eu não tenho. Não dá mesmo pra pagar na quinta-feira?

– Ai, pelas sete pétalas! Está certo, criatura. Mas não diga a ninguém que fiz por esse preço, sim? Minha reputação iria pelo ralo do esgoto…

.

BaseadoNissoCLUBEDEAUTORESCapa-04aNA QUINTA-FEIRA, A CAMPAINHA do apartamento de Ivan tocou e ele abriu a porta.

– Preparado? – Javier disse, alisando a longa trança que passava pelo ombro e caía sobre o peito. Vestia calça e camisão, tudo branco.

– Só um pouco nervoso… Vamos entrando. Que elegância, heim?

– Gostou? Comprei especialmente pra esta ocasião. Tinha que ser uma roupa que nunca foi usada. Humm, Karine Alexandrino… – Javier pegou um CD sobre o aparelho de som. – Mas não é que o bofe tem bom gosto? Adoro essa perua. Dizem que é homem operado, mas eu não acredito.

– Quer escutar?

– Em outra ocasião. Vamos logo ao que interessa. Menino, mas que buena vista que você tem desta janela. Pra empurrar cobrador é uma beleza. Cadê o baseadito?

– Aqui. Você fuma também?

– Desta vez não. Anda, senta aqui do meu lado e acende logo.

Ivan acendeu o baseado e começou a fumar. Javier observava atento, sentado ao lado no sofá.

– Não tem problema com os vizinhos?

– Que nada. Nesse prédio só tem maconheiro.

Ivan deu mais algumas tragadas, apagou e guardou a guimba numa caixinha de alumínio.

– Olha aí, já tá começando… – falou Ivan, apontando para a orelha direita.

Javier se aproximou e pôde ver perfeitamente: alguma coisa surgiu à entrada do ouvido. Depois foi saindo, saindo e era mesmo uma minhoca, uma pequena minhoca que deslizou um pouco mais para fora, balançou-se e caiu sobre o ombro do rapaz.

– Pelas pantufas do niño Jesus… Que coisa…

– Pode pegar, não morde.

– Não, gracias, minha religião não permite.

– Olha, já tá vindo outra…

Javier viu outra minhoca surgir à entrada do ouvido. Essa também deslizou, balançou um pouco e caiu.

– Tá saindo outra! – Javier gritou. – É a invasão das minhocas… E pelo outro ouvido, não sai?

– Sai. Tá saindo agora, olhaí.

– Que coisa loca. Me diga, quantas saem?

– Ah, depende. Às vezes sai uma só, outras vezes duas, três, cinco. Uma vez saíram nove, quase fiquei doido.

– O que você faz com elas?

– O que eu faço? Jogo fora, claro.

Javier fechou os olhos e apoiou-se com as costas na parede. Respirou profundamente, uma, duas, três vezes. Depois murmurou algo ininteligível por alguns segundos e, por fim, abriu os olhos. Afastou-se da parede e falou calmamente:

– Pois desta vez vamos fazer diferente. Já saiu tudo?

– Acho que sim.

– Então junta num papel e traz aqui – Javier foi à cozinha e abriu a geladeira. – Tem cebola?

– Cebola?

– É. Cebola. Aquela cosita arredondada, com casquinha, que faz chorar…

– Não tô entendendo…

– Claro que não está. Se estivesse entendendo não teria de me pagar quatrocentos reais.

– Trezentos.

– Não foi quatrocentos?

– Não, foi trezentos.

– Então anda, vem cá, me ajuda a cortar. Este tomate também vai.

– Minhoca não come tomate, Javier.

– Quem disse que elas vão comer alguma coisa? Onde está a frigideira, é aqui embaixo? Ah, aqui está. Tem manteiga?

– Javier, você podia me explicar…

– Dá aqui as minhocas.

Ivan passou-lhe as quatro minhocas e Javier despejou-as na frigideira, junto com pedaços picados de tomate e cebola.

– Javier, você não tá pensando…

– Um temperozinho…

Enquanto Javier fritava e temperava as minhocas, Ivan observava sem acreditar.

– Javier, você por acaso…

– Creio que já está bueno. Tem farinha? Tem, ótimo. Vamos botar um poquito, mexer… Onde estão os pires? Creio que um azeite vai bem. Pronto, você come essas duas aí e eu como essas duas aqui.

– Eu?!

– É riquíssimo em proteína, sabia? Na China o povo faz fila pra comer.

– Eu não sou chinês.

– Mas é um escritor que me contratou pra desvendar o mistério das lombrices. Anda, aproveita que está quentinho.

Javier levou a primeira minhoca à boca e começou a mastigá-la, de olhos fechados, calmamente. Ivan olhava enojado.

– Não está tão mal, Ivan. Prova aí.

BaseadoNissoCLUBEDEAUTORESCapa-04aIvan levou a colher à boca e mastigou uma minhoca. Quase pôs tudo para fora, mas controlou-se e engoliu.

– Ivan, tô recebendo uma mensagem pra você – Javier falou, de olhos fechados.

– Pra mim?

– Um bruxo… que mora sozinho na floresta…

– Como?

– Isso mesmo. Um bruxo. Ele mora… sozinho numa cabana, próximo de uma aldeia.

– Ele tá enviando uma mensagem pra mim?

– Uma bruxa muy bonita que mora perto… e os dois vivem brigando.

– O que é isso, Javier?

– Na verdade, os dois… são apaixonados um pelo outro. Mas não reconhecem isso.

– Sinceramente, não tô entendendo nada.

– Deixa ver essa outra minhoquita… – Javier mastigou a segunda minhoca. – Hummm… Um velhinho que é o Guardião dos Gnomos… Cruzes, é isso mesmo? Sim, é isso mesmo, Guardião dos Gnomos. Os gnomos têm o poder de encontrar pessoas… de fazer com que as pessoas se encontrem… Um dia, um rapaz o procura porque está interessado em…

– Espere um pouco, Javier – interrompeu Ivan. – Só um instante.

– Um pescador… uma bela noite… – Javier seguia falando, aparentemente em transe. – Ele encontra uma sereia e ela… diz que tem o poder de lhe dar muito dinheiro.

– Espere, Javier, que eu vou pegar uma caneta!

Ivan saiu correndo e voltou com papel e caneta.

– Aquela primeira, como era mesmo? Um bruxo e uma bruxa que vivem na floresta…

– Um fantasma… ele mora no quarto de uma pensão e… e sempre trata de expulsar os inquilinos que o alugam.

– O guardião dos gnomos… e depois… depois o quê mesmo?

– Menino, o que eu fiz? – falou Javier, de repente, abrindo os olhos.

– Comeu duas minhocas fritas. Como era mesmo a outra mensagem?

– Aaaaaaarrrrrgh!!! – gritou Javier, levando as mãos à boca e correndo para o banheiro. – Me acuda, minha cabocla Mariana do cabelo cor de telha! Argh!

– Depois foi o quê mesmo? – perguntou Ivan, indo atrás dele com a caneta e o papel. – Ah, o pescador e a sereia.

– Minhoca frita! Não creio! Traz água, por caridade!

– Já vou pegar. Depois foi o quê?

– Ah, não me recordo, criatura. Quem tem de lembrar é você. Vai pegar minha água, maligno.

– Não são mensagens, Javier, são ideias pra contos.

– Ah, é?

– E são ótimas, todas elas. Ah, lembrei! O fantasma da pensão.

– Então não deixa de ser mensagem. Deixa que eu vou pegar a água, cavalheiro.

– Puxa, não acredito! Javier, você é demais!

– Ideias pra contos, heim? Bueno, vai ver que é isso que faltava pra você ser um escritor famoso: uma dieta à base de minhoca frita.

– Puxa, Javier, nunca poderei lhe agradecer…

– Claro que pode. São trezentos reais, aqui en la mano.

– Escute, Javier, tenho uma proposta a lhe fazer. Que tal trabalharmos juntos? Você come as minhocas e me passa as mensagens. Eu serei um escritor famoso, venderei muitos livros… Nós ficaremos ricos, Javier! Você fica com dez por cento de tudo o que eu ganhar, aceita?

– Não.

– Mas, Javier, as ideias são maravilhosas, eu vou escrever ótimos contos, eles vão ser um sucesso!

– Tsc, tsc. Madre de Dios, esse gosto horrível não sai…

– Vinte por cento.

– Já disse que não me interessa. Imagina, vou virar um minhocário ambulante…

– Trinta!

– Trinta por cento? – Javier alisou a trança sobre o peito, pensativo. Fez algumas contas rápido. – E se você não ficar famoso nem nada?

– Com essas ideias? Impossível!

– Não, não interessa. É melhor eu garantir o meu agora. Escuta, por que você não come as minhocas? Afinal, é da sua cabecita que elas saem, e não da minha.

– Ah, Javier, eu não vou conseguir, é ruim demais.

– Faz parte do seu aprendizado cósmico. Vamos, eu quero meu pagamento, dá aqui na mãozinha.

– Javier, por favor, seja mais bondoso…

– Mais bondoso? Só se da próxima vez eu comer aranha…

– Desculpe, não quero ser injusto.

– Exatamente, seja justo. Eu mostrei pra você qual a utilidade dessas minhocas que saem de sua cabeça quando você fuma, e agora é muito justo que eu receba meu pagamento, que te parece?

– Então vamos deixar pelos duzentos?

– Trezentos, foi o que combinamos.

– Duzentos e cinquenta então.

– Ah, eu não creio! Está bem, me pague e me deixe ir embora comer qualquer coisa pra tirar esse gosto horrível da boca, argh…

– Vou fazer os cheques.

– Cheques?

– Você parcela, não parcela?

.

BaseadoNissoCLUBEDEAUTORESCapa-04a– SEO JAVIER, DESCULPE interromper, mas é encomenda pro senhor assinar – avisou Ana Isaura, entregando um pacote.

– Só um instantito, dona Iracema… – disse Javier, interrompendo a consulta do tarô e assinando o papel. – O que deve ser? Ah, é do Ivan, aquele bofe dos olhos lindos. Livro novo…

– Quem é Ivan? – perguntou dona Iracema, sentada à sua frente na mesa.

– É aquele escritor, a senhora não conhece? Ivan Ferreti.

– Ah, sim, claro. Ele é seu amigo?

– Uns anos atrás resolvi um babado forte pra ele, entonces sempre que ele lança livro novo, manda pra mim, com dedicatória e tudo – Javier abriu o pacote e mostrou o livro, orgulhoso. – Mira que capa bonita.

– Bonita mesmo.

– Era um pé-rapado. Hoje está famoso, podre de rico. Casou dia desses com uma modelo italiana que é a cara da Anita Ekberg, até os peitos são deste tamanho. Sabe onde o bofe mora atualmente? Num castelo na França, imagina o luxo.

– Nossa, que partido… Pra mim não cai um desse.

– Ai, ai, quando eu penso naqueles trinta por cento…

– Como?

– Nada, mulher, nada. Divaguei. Mas sim, onde estávamos?

– No Enamorado.

– Ah, nessa carta aqui. Pois bem… Bueno, deixa eu ver… Humm, é um senhor alto, viu, educado, distinto… Um guapo.

– Será que é casado, Javier?

– E isso lá é problema, mulher! Se for, a gente descasa.

.
Ricardo Kelmer 2000 – blogdokelmer.com

.

BaseadoNissoCLUBEDEAUTORESCapa-04aEste conto integra o livro
Baseado Nisso – Liberando o bom humor da maconha

> Leia outros contos. Adquira seu exemplar personalizado

.

.

.

.

elalivro10Seja Leitor Vip e ganhe:

 Acesso aos Arquivos Secretos
Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS


O presente de Mariana

15/11/2008

15nov2008

.

A cabocla Mariana, entidade da umbanda, propõe noivado ao moço Dedé. Ela garante estabilidade financeira, mas, em troca, exige fidelidade absoluta


GuiaDeSobrevivenciaCAPA-1b.

Fantástico, mistério

.

Este conto integra o livro Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos

.

.

O PRESENTE DE MARIANA

.
ESTAMOS FAZENDO DEZ ANOS de casados, eu e Mirley. É uma mulher incrível, faço questão de lhe dizer, e continua bela e fascinante como no dia em que a conheci. Para comemorar a data, viemos passar o fim de semana em nossa casa de praia. Trouxemos vinho, velas aromáticas e nossos discos preferidos. Dez anos de alegrias. Dois filhos maravilhosos. Houve dificuldades, é claro, mas nosso amor superou tudo.

Neste momento, Mirley está na praia com as crianças. Preferi ficar aqui na rede da varanda, escutando Julio Iglesias, olhando as árvores do terreno, me deliciando com o vento, o som chacoalhento que ele faz nas folhas. Dez anos. Tantas coisas vividas…

Recordei fatos, sensações, dizeres e pequenos eventos banais. Recordei os dias difíceis, um fraquejando, o outro segurando a barra… Ri sozinho de tantos encontros e desencontros, interessantes acasos e as brigas homéricas que o tempo sempre faz tornarem-se ridículas. Em dez anos de convivência acumula-se o inevitável pó das coisas corriqueiras, eu sei, mas um olhar ainda apaixonado, acredite, é capaz de captar poesia por trás da mais empoeirada rotina.

E foi nesta manhã, aqui na rede a vasculhar o passado, que súbito me veio a lembrança de Mariana. Foi como se um vento soprasse a areia de cima do acontecimento esquecido. Soprou e surgiu Mariana, ela e seu jeito gracioso de menina, o sorriso franco… E eu recordei tudo.
.

ERA UMA QUARTA-FEIRA, o dia em que botavam mesa na casa de dona Neide, uma médium conhecida no bairro. Joca perguntara se eu gostaria de conhecer uma sessão de umbanda manauara, eu disse que sim e lá fomos nós.

Eu havia deixado Recife para ir morar em Manaus, onde investira todas as minhas economias num negócio de exportação. Minha namorada Mirley foi comigo, mas infelizmente não se deu com o clima da região e voltou. Eu fiquei, eu e a promessa de que em breve faria algum dinheiro e voltaria também. Mas por aqueles dias, quase um ano depois, os negócios seguiam muito difíceis e o dinheiro e a esperança cada vez mais curtos. As perspectivas não eram nada positivas. E a saudade de Mirley me incomodava demais, feito um espinho encravado na alma. Sem ela ao meu lado, tudo era mais difícil de suportar. Quem sabe então alguma entidade poderia me dar uma mãozinha?

Formou-se a mesa. Estava concorrida a sessão daquela noite, algumas pessoas tiveram de ficar em pé, ao redor. Como era minha primeira vez, deixaram-me sentar, e bem ao lado de dona Neide, a médium, uma senhora muito distinta, corpo moreno e mirrado, cabelos e olhos bem pretos. Num canto da sala ficava a mesa do congá, e nela pude distinguir imagens de Jesus Cristo, são Jorge, são Sebastião, são Cosme e são Damião e a da Virgem. A médium pediu a bênção de Oxalá, do mestre Jesus, da entidade responsável pelo terreiro, que não lembro mais quem era, e de alguns orixás.

Nunca acreditei nessas coisas, acho que se pode explicá-las pela autossugestão. Mas como sou tímido, aquela experiência nova me deixou pouco à vontade. Via as pessoas expondo seus problemas às entidades e aquilo me soava estranho. Vi que umas conversavam ao ouvido delas, reservadamente, mas nem assim arrumei coragem. Sentia-me ridículo só de me imaginar falando ao ouvido de um imaginário preto velho baforando fumaça de fumo de palha, com aquelas pessoas fazendo um fundo sonoro de cantigas meio desafinadas.

Por ocasião da visita das entidades não senti nenhuma mudança mais significativa na médium. Observava-a com discrição, mas atentamente, procurando falhas ou comprovações do além. Uma coisa, porém, me chamou a atenção: foram as sete doses, isso mesmo, sete doses de cachaça que ela tomou durante a visita de um caboclo não-sei-quem. Sem falar nas cervejas que outras entidades pediram e tomaram. Pela lógica, dona Neide, com sua fraca compleição física, terminaria a sessão bastante embriagada.

Foi no fim que Mariana apareceu. Eu já interpelava Joca de canto de olho, demonstrando minha impaciência, quando dona Neide mais uma vez estremeceu, fechou os olhos e entrou em transe. De imediato percebi uma fragrância suave no ambiente, um cheiro de madeira, de mato fresco, e olhei discretamente ao redor para ver quem estaria usando perfume tão agradável.

Todos saudaram a entidade que chegava.

– Salve, Mariana.

– Salve, cabocla Mariana. Bem-vinda.

– Bem-vinda, Mariana do cabelo cor de telha.

– Salve, salve! – dona Neide respondeu, falando para todos. E percebi que sua voz se tornara mais juvenil.

– Quanto tempo que não aparece, Mariana.

– Êta, hoje tá cheio. Gente nova, homem bonito, que bom. Êta, felicidade!

Achei aquilo tudo ridículo e tive vontade de rir. Nesse exato instante, porém, o olhar de dona Neide cruzou com o meu. E tomei um susto. Aquele não era seu olhar, era outro. Estava diferente, mais brilhante, mais vivo. Tentei desviar, incomodado, mas algo me impediu.

– Esse é meu amigo Dedé – Joca tratou logo de me apresentar. – Tá vindo pela primeira vez.

– Tem um olho bonito, ele – dona Neide falou, meio séria, meio sorrindo.

Fiquei sem saber o que dizer, as atenções todas sobre mim. Procurava algo para fazer com as mãos sobre a mesa e evitar os olhares, principalmente o de dona Neide. Era estranho: dona Neide continuava ali, ao meu lado, mas ao mesmo tempo… não parecia ser ela. Não podia ser ela.

– O moço é encabulado, é? – ela perguntou, falando a poucos centímetros de meu rosto. Tinha um olhar meigo, mas nele havia qualquer coisa de dominador. Era algo sutil, mas que prendia meu olhar. Ela tocou meu rosto, sorriu e se virou, buscando os velhos conhecidos da mesa. Respirei aliviado.

Dona Neide, ou Mariana, cumprimentou a todos os presentes. Pude perceber que se demorava mais nos homens. Pediu notícias sobre conhecidos, perguntou sobre um e outro, riu de casos e se divertiu com uma confusão ocorrida dias antes na rua. Eu estava tão sem jeito com a situação que nem lembrei de pedir que também desse uma forcinha nos meus negócios. Contentei-me em admirar seus modos graciosos e seu bom humor. Decididamente, era uma entidade cativante.

Havia algo, porém, que me chamava a atenção desde o início de seus falares. Ela perguntava por seu noivo fulano e seu outro noivo beltrano, e pelo jeito parecia ter muitos noivos. Curioso, cutuquei Joca e ele me explicou, falando baixinho ao meu ouvido:

– A cabocla Mariana não morreu, foi encantada, com 17 anos e meio. Ela é muito bonita. Tem a pele branca e o cabelo ruivo, da cor de telha. E o olho azulzinho. Quando se engraça de um homem, pergunta se ele quer ser noivo dela. Homem que é noivo de Mariana consegue o que quiser nos negócios, sobe rapidinho na vida.

Senti um frio no estômago. Ajeitei-me na cadeira, mais para perto do meu amigo.

– Meu irmão é noivo dela. Tu conheceu a loja dele, Dedé. Pois dois anos atrás não tinha nem onde cair morto. Enriqueceu rapidinho.

– E o que faz ela se engraçar de um homem?

– Ah, não sei. Ela gosta e pronto.

– E o que ela pede em troca?

– Ela é ciumenta, exige exclusividade total. Homem que noiva com Mariana não tem mais mulher nenhuma.

– Mas… como assim?

Alguém fez psiiiiuuu… Sorri um pedido de desculpas e me recompus. Mas o assunto era irresistível.

– Ela estraga qualquer xodó teu – prosseguiu Joca. ‒ Olha aquele ali, o Luís. Noivou com ela. Foi ele quem comprou esta casa e deu de presente pra dona Neide fazer as sessões. Era um pé-rapado e hoje é dono de supermercado. Em compensação nunca mais se ajeitou com mulher nenhuma, Mariana sempre estraga o namoro.

– E não dá pra desfazer o trato?

– Não. Tem que ser muito macho pra noivar com ela.

– Pois eu topava um negócio desse.

– Tu não é doido!

– Se ela me arrumar dinheiro, eu vou embora daqui e ela não me encontra nunca mais. Caso com Mirley e ainda fico com dinheiro no bolso.

– Ela não te deixa sair daqui, Dedé. Tu não sabe o poder dessa menina, tu não sabe.

Já não adiantariam os conselhos. Eu estava tomado por um estranho frenesi. Entrara ali sem acreditar em nada daquilo, mas agora estava disposto a abrir uma brecha em minha incredulidade para a cabocla Mariana se ela fosse realmente capaz de me tirar do sufoco em que eu me encontrava. Quanto à questão dela estragar relacionamentos, bem, isso pra mim já era demais, não dava para acreditar.

– Antes de eu ir embora, queria conversar com este moço aqui… – Mariana virou-se para mim subitamente, me pegando de surpresa. – Não precisa me dizer que a vida não anda fácil pra ti, né? Moço honesto, trabalhador… Vem de longe, né?

Concordei com a cabeça. Era impressionante seu olhar. Eu me sentia envolto por um estranho carinho, uma água morna, aconchegante… um cheiro gostoso de mato fresco…

– Aposto que deixou namorada chorando, não foi?

Sorri encabulado.

– Sabe que a primeira coisa que elas reparam é no teu olho bonito?

Senti as faces quentes de vergonha.

– E sabe olhar do jeito que mulher gosta.

Eu não soube o que dizer.

– Precisa só respeitar um pouquinho mais as entidades. Eu sei que tu é inteligente. Mas com as entidades ninguém pode.

Falou e tocou meu braço. Decididamente não era a mão de dona Neide. Era a mão macia de uma garota.

– Mas eu respeito… – tentei consertar, incomodado pela exposição de meus secretos pensamentos.

– Então respeite mais um pouquinho que não faz mal. Tu sabe muita coisa. Mas ninguém sabe tudo.

Fiquei em silêncio, cada vez mais nervoso. Reprimenda de entidade, quem diria.

– Não sabe, por exemplo, ganhar dinheiro.

Ela falou e riu. E era uma risada de menina.

– Se quiser, Mariana te ensina.

No silêncio que se fez, escutei as batidas de meu coração. O que ela estava mesmo propondo?

– Ele não tá interessado, Mariana – interrompeu Joca, batendo amavelmente em meu ombro.

– Verdade? – ela perguntou, os olhos nos meus. E por um segundo me pareceram azuis.

– Bem… eu…

– Teu caso não é sem jeito. Só umas coisinhas que estão emperradas.

Mariana prosseguiu me olhando, séria. Nesse momento senti algo estranho, uma leve sensação de torpor…

– Pra mim é fácil resolver.

– Em quanto tempo? – eu quis saber. Ela tinha mesmo olhos azuis. Ou eu já estava vendo coisas?

– Mais rápido do que tu imagina.

Eram azuis sim. Um azul límpido, suave, quase uma carícia. Não era impressão – eu via. Não sei como. Mas eu via.

– Simpatizei contigo.

E o cabelo comprido, cor de telha. A pele branquinha, o jeito de menina levada. Não me peça para explicar – eu via.

– Mariana, ele não tá interessado – Joca nos interrompeu novamente.

– Tu continua despeitado, Joca. Só porque eu nunca quis ser tua noiva. Sabia, Dedé? Sabia que ele pediu pra noivar comigo e eu não quis?

Olhei para o meu amigo. Aquilo ele nunca me dissera.

– Faz muito tempo, Mariana. Eu nem sabia o que tava fazendo.

– Por isso que ainda hoje tá nessa situação, pedindo dinheiro emprestado pro irmão. Nunca sabe o que tá fazendo.

– Você sabe que eu tô sem emprego.

Pensei em meu amigo Joca. Era mais velho que eu e já tentara muita coisa na vida. Nada dava certo. Os amigos estavam sempre lhe dando uma força. Parecia ter o estigma dos fracassados. Mariana teria visto isso nele? Por isso não aceitou noivar?

– Dedé? – ela me chamou. – Olhe, semana que vem eu volto. Pense com carinho porque eu só proponho uma vez.

– Isso é verdade – um homem falou por trás de mim. – Se não aceitar, ela não dá outra chance não.

– Espere… – segurei seu braço. – Eu aceito.

Mariana abriu de novo seu sorriso lindo. Seus olhos azuis brilharam. Ela pegou minha mão, pondo-a entre as suas, beijou-as, olhou-me firme e falou:

– Eu ainda não perguntei, moço. Mas pergunto agora. Tu quer ser meu noivo?

Pensei em Mirley, no quanto gostava dela. Ela me perdoaria? A causa pelo menos era justa. Por um segundo senti que meu futuro estava se decidindo naquele exato segundo e que qualquer que fosse a decisão tomada, não haveria como voltar atrás. O olhar de Mariana estava no meu e era como ser ternamente abraçado… Eu já não estava na sala. Estava com ela, caminhando pela floresta, Mariana e seu vestido branco, o belo cabelo ruivo numa trança caindo no ombro, nós dois rindo, nós dois molhando os pés na água fria do igarapé, nossas mãos juntas, os corpos juntinhos, seu rosto perto do meu, mais perto, mais pertinho, sua boca, nossas bocas…

– Ele vai pensar, Mariana – Joca falou, me fazendo voltar à mesa. – Ele vai pensar direitinho e quarta-feira dá a resposta.

Olhei para ele com raiva.

– Então na quarta eu volto aqui pra saber – ela disse. E largou minha mão, virando-se para se despedir de todos.

Logo depois, dona Neide abriu os olhos e, distinta como sempre, sorriu para todos e pediu que uníssemos as mãos numa oração pelos mais necessitados e por todos os pedidos bem-intencionados que foram feitos. Eu a observei com atenção e não percebi nenhum sinal de embriaguez. Ela havia bebido muito naquela hora e meia e sequer apresentava hálito de bebida. Isso me impressionou, é verdade, mas não tanto quanto a transformação de dona Neide: em seu semblante, em sua voz e em seus gestos já não havia mais o mínimo traço da jovem Mariana. A cabocla de olhos azuis e do cabelo cor de telha, se alguma vez estivera ao meu lado, já não se encontrava mais ali.

Enquanto caminhávamos na rua, Joca me falou sobre o episódio do noivado frustrado com Mariana. Confessou que na época teve muita vergonha, mas que agora já havia superado. E, inclusive, agradecia todos os dias por Mariana não tê-lo querido, pois atualmente namorava uma garota ótima.

Eu queria saber sobre Mariana, estava inteiramente curioso.

– Ela se engraçou mesmo de ti. Mas não vai cair na besteira de noivar com ela, Dedé.

– Isso parece papo de noivo desprezado…

– Eu sei que parece. Mas me diga uma coisa: adianta ter muito dinheiro e nunca encontrar alguém pra dar o coração? Adianta?

– Eu vou pra bem longe. Ela não me encontra.

– Olha o que ela disse… Tu tem de ter mais respeito.

– Respeito eu tenho. Só não consigo é acreditar.

Joca riu, bateu em meu ombro e falou:

– Já vi muita gente chegar aqui em Manaus do jeito que tu chegou e voltar diferente, já vi.

E riu gostosamente.

Eu não me importava de voltar diferente, desde que estivesse melhor de vida. As opiniões de Joca não me demoveriam de meus propósitos. Noivaria com Mariana, juntaria um dinheiro e me mandaria dali. Já fazia planos até de como investir a grana. Uma soparia no Recife Antigo. Ou talvez uma fábrica de gelo em Olinda.

– Não vou poder ir contigo na quarta-feira – ele avisou. – Tu vai sozinho fazer essa besteira.

Naqueles dias sonhei duas vezes com Mariana – e a sensação agradável do sonho me acompanhava o resto do dia. Várias vezes senti seu cheiro, na rua, no ônibus… De repente, percebia o aroma gostoso de mato fresco e então sua presença tomava conta do ambiente, e algo em mim tornava-se mais calmo, mais compreensivo, mais doce.

Não tive jeito de conversar sobre isso com ninguém, nem mesmo com Joca. Com Mirley, nem pensar. O que lhe diria, que estava embevecidamente enamorado de uma entidade adolescente? Que pensava nela toda hora e tomava sustos quando via algum cabelo cor de telha passar na rua? Que me pegava desenhando seu nome em papel de guardanapo? Como dizer que noivaria com uma entidade de umbanda por causa de nosso futuro? Não, melhor não dizer. Seria um segredo meu e de Mariana.

Na quarta-feira seguinte eu estava lá de novo. E mais uma vez dona Neide recebeu as entidades. Como na sessão anterior, Mariana foi a última a aparecer. De novo o aroma suave de madeira, de mato fresco. De novo a voz alegre, a graça juvenil. Senti meu carinho por ela se derramando pela mesa. Admirei a beleza dos gestos simples, os mínimos detalhes. Como podia ser tão encantadora? Descobri que gostava dela. Muito.

Depois de conversar com algumas pessoas, Mariana finalmente virou-se para mim. E sorriu. E outra vez seu sorriso me trouxe o frescor de cachoeiras.

– Oi, moço bonito.

– Oi, Mariana.

– Pensou em mim esses dias, não foi?

– Pensei.

– Eu também pensei. Muito.

– Verdade?

Ela parou de sorrir e percebi tristeza em seu olhar.

– Olha, tenho uma coisa pra te dizer. Vem pra cá, vem… – E me chamou para que eu sentasse na cadeira ao seu lado, a que era reservada às conversas de pé-de-ouvido. Enquanto os outros entoavam uma cantiga, ela começou:

– Tu é mais protegido do que eu pensava. Vieram dizer pra eu não me meter contigo.

Não entendi.

– Olha, tu não pode ser meu noivo.

– Por que não? – perguntei surpreso.

– Tem entidade maior que eu, tenho que respeitar. Fiquei muito triste com isso.

Parecia o rompimento de um relacionamento profundo. Senti vontade de chorar em seu colo.

– Tu já tá protegido, moço bonito, não precisa de mim.

– Preciso – insisti. Já havia mandado às favas qualquer vergonha e discrição. – Preciso de você sim, Mariana.

– Vai, segue o teu caminho que é um caminho bom. Esse momento tá difícil, mas tu é homem forte e vai atravessar a floresta. Tenha fé.

De repente, lembrei de Mirley. E senti que não teria mais forças para continuar lutando por nós. Finalmente vencido, impotente. Era o fim.

– Olha, já que tu não pode ser meu noivo, vou te deixar um presente. – E segurou minha mão, me puxando mais para perto. Agora ela sussurrava em meu ouvido. – Pra tu não ter dúvida do tanto que gosto de ti.

Respirei fundo e encontrei forças para perguntar:

– Um presente?

– Se tu não puder vir na quarta-feira que vem, eu vou saber que tu aceitou o presente de Mariana.

Percebi uma lágrima descendo de seu olho.

– E mesmo que tu me esqueça, eu vou estar sempre intercedendo por ti, viu? Agora vai, moço bonito, vai.

E me empurrou delicadamente. Feito isso, despediu-se rápido de todos e se foi. Foi-se o aroma de mato fresco. Foi-se a água morninha.

Saí de lá arrasado, e fui procurar Joca. Não levava mágoa alguma de Mariana, pelo contrário, ela realmente me cativara e por ela eu era todo carinho. Mas não conseguia crer que fizera tantos planos em vão. E a famosa soparia no Recife Antigo? E a bem-sucedida fábrica de gelo em Olinda?

– Ela gostou de ti – Joca falou, me consolando. – E se gostou, vai dar um jeito de te ajudar.

Não adiantaram as palavras de Joca. Estava tão triste que não tinha ânimo para nada. Os dias seguintes foram um inferno, mal conseguia levantar da cama. Trabalhar era uma tortura. Até a fome perdi. Estava deprimido e decepcionado com tudo, com a vida e principalmente comigo mesmo por um dia ter acreditado que uma entidade iria dar jeito em minha vida.

Como meu telefone estava cortado e só religariam na segunda-feira, fiz disso desculpa para não falar com Mirley. Não queria que ela percebesse meu estado. Joca me chamou para sair, mas recusei: passaria o fim de semana trancado em casa. Não tinha vontade alguma de ver o mundo lá fora.

Na segunda-feira, o telefone foi religado, e à noite, assim que cheguei do trabalho, ele tocou. Era Mirley. Eu ainda estava triste, mas consegui disfarçar. Ela então disse que uma das filiais da empresa de um amigo seu, no interior de Pernambuco, ficara sem gerente e que ele pensara em mim para ocupar a vaga. Explicou que tentou falar comigo no fim de semana mas não conseguiu, e que talvez seu amigo já houvesse conseguido um substituto. Falei que estava interessado e Mirley me passou o telefone de seu amigo.

Desliguei o telefone ansioso. Seria um castigo enorme perder aquela oportunidade graças a um telefone cortado por falta de pagamento. Liguei para o número anotado, mas deu ocupado. Liguei de novo, liguei outra vez – sempre ocupado. Não consegui sequer levantar do sofá de tão ansioso.

Na centésima tentativa o amigo de Mirley enfim atendeu. Felizmente, a vaga ainda existia. O salário não era tão bom quanto eu gostaria, mas como a filial ficava numa cidade próxima a Recife, eu estaria pertinho de Mirley e poderíamos nos ver todo fim de semana.

Acertamos tudo na mesma noite. Ele tinha pressa e perguntou se podia marcar minha passagem para quarta-feira, dois dias depois.

– Sim, claro – respondi, decidido. – Pode marcar.

Desliguei o telefone e fiquei parado, ainda sem acreditar. Então subitamente entendi. Era o presente de Mariana…

As lágrimas desceram sem que eu pudesse evitar. Ali, no sofá, tive uma crise de choro como jamais tivera. Lembrava de Mariana entre lágrimas agradecidas e só conseguia balbuciar: obrigado, obrigado…

Na quarta-feira, no aeroporto, despedi-me de Joca e pedi que agradecesse por mim a Mariana. E que dissesse que eu jamais a esqueceria. Ele riu:

– Precisa dizer não. Ninguém esquece Mariana.

Na quarta-feira, durante a viagem, eu só pensava na sessão. Naquele momento, certamente estavam todos à mesa, olhando para as entidades no rosto de dona Neide. Sentia-me bem, confiante, a alma leve. Sabia, com toda a certeza que se pode ter, que aquele voo era o mais protegido do planeta.

No aeroporto de Recife, peguei minha mala e fui procurar por Mirley. Enquanto a aguardava, senti um aroma familiar, um frescor gostoso…

De repente, o toque em meu ombro. Meu coração gelou. Virei-me devagar, já sabendo o que veria. E vi. O cabelo avermelhado, a pele clara, os olhos salpicando azuis…

Nesse instante, um rio de águas mornas passou por mim e eu me deixei levar pelas águas envolventes, o cheiro fresco de mato, a contínua melodia da floresta… Minha alma foi tomada por uma doce sensação de arrebatamento, e enquanto dois lindos olhos azuis me acariciavam, tudo que eu conseguia fazer era sorrir, sorrir…

– Desculpe – ela disse, sem jeito. – Pensei que era outra pessoa.

– Como?… – falei, voltando ao aeroporto, sentindo novamente os pés no chão. A garota aguardou que eu dissesse algo, mas nada encontrei para dizer. Ela acenou para algumas pessoas mais adiante e depois sorriu para mim:

– Boa sorte. Tchau.

Fiquei parado, vendo a garota se afastar e correr para seus amigos. Não sabia o que pensar. Nesse instante, escutei meu nome e vi Mirley se aproximando. Confuso, ainda procurei pela garota ruiva, mas ela já havia sumido na multidão. Mirley me abraçou forte e chorou em meu ombro. Quase um ano que não nos víamos, tanta saudade…

– Que cara estranha é essa, Dedé?

– Foi a viagem… – respondi – Mas tá tudo bem. Já jantou?

Fomos embora rapidamente. No dia seguinte, eu já assumiria a gerência da filial, havia muito trabalho à frente. Uma vida nova me esperava, dessa vez bem perto da mulher que eu amava.

E quanto à garota do aeroporto, já sei, já sei. Você certamente está pensando que eu acho que aquela era Mariana. Pois era sim.

Não tente me dissuadir. Nem me peça lógica, eu não a tenho nem para mim. Basta-me a certeza, pura e agradecida, que ainda hoje trago aqui no peito, de que a menina faceira que de repente sorriu para mim no aeroporto de Recife era Mariana sim, a cabocla Mariana do cabelo cor de telha, encantada aos 17 anos e meio, e que naquela noite de quarta-feira aproveitou uma folguinha na sessão de dona Neide para me ver pela última vez e, ao seu modo, me desejar felicidades.

É esta a história. Num momento de angústia e desamparo, eu estive disposto a ser noivo de Mariana e lhe desafiar os poderes. Ela me queria também. Mas o destino não quis assim. Mariana então, em sinal de amor, me concedeu um presente, uma oportunidade única de mudar para melhor a minha vida – oportunidade que agarrei com todas as forças.

É esta a história de Mariana. Que até hoje trago no peito, banhada em água morna, no cheiro do mato fresco. Nos primeiros meses, ainda impressionado com tudo que acontecera, eu lembrava de Mariana todo dia e em silêncio agradecia. Aos poucos, fui esquecendo, absorvido pelo trabalho intenso, a família que crescia. À medida que minha vida se equilibrava, Mariana foi se tornando uma lembrança cada vez mais distante, até que sumiu. Talvez ela já não precisasse mais interceder por mim, minha vida finalmente seguia seu rumo natural.

Hoje, porém, dez anos depois, aqui na casa de praia, ela voltou em minha lembrança. E em meu coração. E me fez lembrar de tudo outra vez.
.

MIRLEY ACABA DE CHEGAR da praia com as crianças. Elas trazem um balde lotado de conchas. Laís diz que vai plantá-las no quintal para que nasça um pé de concha. Filipe repreende a irmã por acreditar nessas besteiras que os adultos dizem. Sento na beirada da rede e pergunto se eles apanharam sozinhos todas aquelas conchas ou se quem teve o trabalho foi a mãe deles. Filipe diz que uma moça os ajudou. Mirley diz que as crianças adoraram a tal garota de um jeito que ela jamais viu antes. Enquanto despeja as conchas no chão, Filipe me diz:

– Ela era bonita, pai. O olho da cor desse balde.

Olho para o balde azul, já sentindo algo estranho.

– E o cabelo vermelho, daquela cor.

Antes de Laís apontar para o telhado da casa, eu já havia entendido. Sinto meu coração gelar, um súbito vácuo na alma. Seguro-me à rede como se segurasse a vontade de sair correndo em direção à praia.

– A pele tão branca, Dedé… – Mirley diz, ligando a ducha do jardim para o banho das crianças. – Não sei como aquela moça aguenta ficar nesse sol quente.

Levanto da rede sentindo uma coisa no peito, uma alegria estranha, uma melancolia, uma excitação, tudo misturado. Caminho em silêncio até a sala. No balcão, sirvo uma dose de uísque e viro de uma vez. O ardor faz meus olhos marejarem. Um disfarce inútil para as lágrimas que não consigo controlar.

.
Ricardo Kelmer 1998 – blogdokelmer.com

.

.

GuiaDeSobrevivenciaCAPA-1bEste conto integra o livro
Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos

O que fazer quando de repente o inexplicável invade nossa realidade e velhas verdades se tornam inúteis? Para onde ir quando o mundo acaba? Nos nove contos que formam este livro, onde o mistério e o sobrenatural estão sempre presentes, as pessoas são surpreendidas por acontecimentos que abalam sua compreensão da realidade e de si mesmas e deflagram crises tão intensas que viram uma questão de sobrevivência. Um livro sobre apocalipses coletivos e pessoais.

.

vtcapa21x308-01Este conto integra o livro
Vocês Terráqueas – Seduções e perdições do feminino

Ciganas, lolitas, santas, prostitutas, espiãs, sacerdotisas pagãs, entidades do além, mulheres selvagens – em todas as personagens, o reflexo do olhar masculino fascinado, amedrontado, seduzido… Em cada história, o brilho numinoso dos arquétipos femininos que fazem da mulher um ícone eterno de beleza, sensualidade, mistério… e inspiração.


.

Saiba mais sobre a cabocla Mariana, os aspectos psicológicos e arquetípicos de sua crença: Mariana quer noivar

.

.

.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

Acesso aos Arquivos Secretos
Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- Vc sabe que sou apaixonada por Mariana… Bateu comigo e foi a história que mais me pegou, do único livro seu que li. Saudades… Ana Karla Dubiela, Fortaleza-CE – jan2005

02- Caro Ricardo, Gostaria de fazer um comentário sobre o seu conto da cabocla Mariana, que vc diz ser uma entidade de umbanda. Gostaria de lhe informar que as entidades de umbanda, principalmente os caboclos, que são orixás menores não fazem este tipo de exigência dos filhos de fé da umbanda, ao contrário são entidades elevadíssimas. Este tipo de pedido saõ de entidades provinientes dos catimbós, macumbas e outros rituais que lidam com magia negra e pesada. Faço este comentário pois a umbanda sofre muito preconceito por ser confundida com este tipo de coisa. Inclusive seria muito rico para seus conhecimentos que vc lesse as obras sobre umbanda esotérica de Matta e Silva e Rivas Neto. O seu conto prejudica a corrente astral de umbanda pois ajuda a alimentar nos leigos o tabu e o preconceito contra essa religião tão bela. Gostaria de solicitar que vc não citasse a umbanda nele. Atenciosamente. Clícia Karine, Crateús-CE – jan2005

03- Olá amigo, estou escrevendo de Fortaleza, sobre este texto fabuloso, gostaria que soubesse o quanto eu me sentio atraído pela historia pra ser sincero eu passaria o dia todo lendo e não cansaria. Abraços de seu amigo, fã, etc. Eudes Martins, Fortaleza-CE – mar2005

04- Acima de tudo, pela licença de ler completa a história. Depois, porque ela é belíssima! Não concordo com a leitora que falou que era uma falta de respeito ás entidades. Acho que se não é uma aventura verdadeira meresceria ser… Não gostei, Ricardo. Adorei! Parabéns e que a cabocla Mariana sempre traga sucesso na sua vida. Afinal, quem ficou apaixonado com ela uma vez e escreveu essa bela homenagem tão cheia de sensibilidade e meiguice deveria gozar da proteção da encantada. Abraço e mais uma vez, muito obrigado pela sua gentileza. PS.- desculpe-me o meu português, por favor. Milton, Montevidéu-Uruguai – abr2005

05- Já estava curiosa a respeito do final.Pura ficção, será?Acho que os leitores sempre se indagam sobre isso.Até pq, vivenciei coisas tão estranhas qt essa. Talvez, descobrir nas histórias uma possibilidade de verdade,nos faça mais “íntimos” do autor. Ah..outra coisa: adoro ler td q tem a ver com Recife.Morei lá por 4 anos e costumo dizer que minha alma é recifense.Vou lá pelo menos duas vezes ao ano, rever os amigos e o meu mar de todas as cores. Mônica Burkle Ward, Niterói-RJ – mai2005

06- Olá Ricardo! Bem gostei bastante do texto e gostaria de saber até que ponto a história é veridica ou mesmo se a sua pessoa já esteve em contato com a entidade pois quem a conhece sabe que a atração pela entidade é verídica, eu mesmo quando a encontro na casa de um amigo meu aqui em São Paulo me sinto atraido, é impressionante o poder de sedução desta entidade cá entre nós é a mulher que todo homem gostaria de ter. D. Mariana como conhecemos aqui em São Paulo é muito bela! É a estrela do tambor de mina aqui de São Paulo. Vinícius de Almeida, São Paulo-SP – mai2005

07- oi , me chamo regina vilhena, sou do para debelem mesmo, e no momneto estou no japao, acredito em tudo qeu lir, pois conehco marina de longos anos e ate hoje nao consigo fazer nada em minah vida sem a orientação dela, sabia sua historia muit bonita, sau fe tbm, sabe caro amigo neste exato momneto eu estou passando aki por muita dificulada sem trablaho sem casa para morar, mas a minah fe em deus em primeiro lugar e em mariana nao perco, tenho comigo ja vairas historia de maraina que ja aconteceu comigo, coisas que ela me disse qeu aconteceria e aconteceu de verdade, sabe provas , coisas reaais ate essa minah viagem apra ca foi ela qeu me mandou sei qeu to pado mento pois como ela me me mandou um recado essa semana . me disse asssim qeu tem certo sofrimentos que ela nao pode evitar. agora to muito feliz em ter lido sua historia e espero nao perder o contato com vc. se quzier pode me adicionar no seu msn ok fica com e cabocla mariana dos anjos perreira . assim que eu chamo para ela proteja nos dois. Regina Vilhena, Japão – mar2006

08- Só tenho um comentário a fazer : Adorei sua estória sobre a Mariana!Um grande abraço! Sidiany Colares Alencar – Fortaleza-CE – abr2006

09- Estou acompanhando o conto da cabocla Mariana. Não sou entidade da umbanda mas também trago sorte e prosperidade pra quem eu gosto e exijo fidelidade, que não precisa ser absoluta, basta que eu não saiba dos acontecidos. Não me importo muito em ser traída, pior é ser deixada. rsrsrs. Marcia Sucupira, Fortaleza-CE – mai2006

10- Li o conto da Cabloca Mariana, primeiro achei longo, mas nao consegui parar de ler…. bom, muito bom. Fabiana Vasconcelos, Boston-EUA – abr2006

11- O que mais gostei da Mariana e aquela mistura balanceada de realidade com ficcao, aquela pulguinha atras da orelha para as coisas que nao sabemos explicar, que sao dificies de acreditar, mas estao la… e so dar uma chance pra elas acontecerem. Fabiana Vasconcelos, Boston-EUA – mai2006

12- eu li o conto! Criativo… abraços. Priscila Saboya, Fortaleza-CE – jan2010

13- tive o prazer de conhecer o Blog do Kelmer quando pesquisava sobre a cabocla Mariana e me deparei com o conto O Presente de Mariana….lindo, encantador. Danyela Freitas, Belém-PA – mar2011

14- Oi, Ricardo. Tô sem net em casa , mas vim numa lan so pra te falar umas coisas…. Desde ontem eu tava toda depre( nao sei por que/ na verdade, sei, mas nao vou falar aqui…rsrsrsr), acordei e tirei o “vocês Terráqueas” da estante e fui ver os textos que ainda nao havia lido…. voce me arrepiou com “presente de Mariana” , e pelo arrepio, pensei: nao lembro quanto paguei nesse livro, mas valeu a pena!!!! Irlane Alves, Fortaleza-CE – jul2011

15- conto do livro VOCÊS TERRAQUEAS legal. Weslen Queiroz, Juazeiro do Norte-CE – ago2011

16- Adorei este conto, demais! Ligia Eloy, Lisboa-Portugal – ago2011

17- Meu amigo, consegui enxergar várias metáforas e relacionar Mariana como um feminino idealizado no contexto da vida dele…..o momento de lhe dar com as dificuldades e a escolha de Mariana possivelmente como uma fuga…e ao mesmo tempo aquilo que ela representou e manifestou na vida dele como uma forma verdadeira do amor! Sem esperar algo em troca e simplesmente dar! O momento final do aeroporto e das conchas foi triunfal! O sentimento dele daquilo que nunca foi realizado mas, sentido….uma emoção que sobrepujaram as palavras!! Por aí meu amigo! Parabéns! Esse conto me tocou bastante! Cibele Cortez, Fortaleza-CE – dez2012

18- Advinha o nome da minha primogênita e o pq?? Goretti Strutzel, Fortaleza-CE – 2018

19- Historia fantastica. Aconteceu algo semelhante muitos anos atras comigo por isso me identifiquei com o conto. Wellington Lopes, Manaus-AM – 2018

20- Incrível!!! João Victor Queiroz, Fortaleza-CE – 2018

21- Mariana me conquistou desde a primeira leitura do conto. Ana Beatriz Soares Bezerra, Sobral-CE – set2024


Crimes de paixão

15/11/2008

15nov2008

CrimesDePaixao-02

.

GuiaDeSobrevivenciaCAPA-1bDetetive investiga estranhos crimes envolvendo personagens típicos da boêmia Praia de Iracema e descobre que alguém pretende matar a noite.

Terror, mistério, erotismo

.

> Este conto integra o livro Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos

> O livro Crimes de Paixão, contendo somente este conto, pode ser adquirido em PDF (direto com o autor) e também na Amazon (kindle).

.

CRIMES DE PAIXÃO

.

Todos os frequentadores do Quais Bar pararam surpresos quando chegaram no sábado e descobriram que o Olimar não aparecera para trabalhar. Afinal de contas, além de se tratar do garçom mais folclórico do boemíssimo bairro da Praia de Iracema, ele era conhecido por Penalidade, alcunha que lhe botaram os clientes por ter faltado ao trabalho uma única vez em vinte anos de profissão – justamente por ter, no dia, defendido de forma magistral uma penalidade máxima na final da Liga de Futebol do Quintino Cunha. A comemoração foi tamanha que à noite não teve condições de trabalhar. Olimar, o Penalidade.

E agora o homem faltava pela segunda vez. Era um acontecimento quase tão histórico quanto o da primeira. Gente se gabava de ter estado no bar na noite em que o Penalidade faltara. Roger Gaciano Jr., o renomado jornalista e frequentador da praia, procurando alguém para ilustrar sua matéria sobre a boemia do bairro, entrevistou quem? O garçom Penalidade, claro. E a entrevista até hoje está lá na parede do bar, plastificada para todo mundo ler.

– O Olimar não veio trabalhar?! Será que defendeu outro pênalti?

– Proponho realizarmos uma assembleia pra mudar seu nome pra Dupla Penalidade…

Especulações correram soltas por toda a noite. Apostas foram abertas, um mês de birita grátis para quem acertasse o motivo da segunda falta do Olimar. Tão carismático o homem que até mesmo sua ausência era uma festa.

Porém, no domingo à noitinha, quando a mulher do Olimar chegou ao bar perguntando pelo marido, começou-se a desconfiar de algo mais sério. Dona Cândida, aflita, menino novo no braço, dizia que ele saíra sábado à tarde e desde então não teve mais notícia. Carlitos, dono do Quais Bar, sensibilizado com a aflição da mulher, propôs organizarem uma comissão para ir atrás de notícia do seu melhor garçom. Dona Cândida não se preocupasse, fosse para casa, ele mandaria um táxi deixá-la e logo estaria tudo bem, o Olimar ia aparecer.

O mistério continuou até segunda pela manhã quando o corpo do garçom Penalidade deu à praia da Barra, já em decomposição. O laudo apontaria afogamento. Ele não sabia nadar, portanto jamais se arriscaria no mar. E o mais esquisito é que estava de roupa – teria caído do píer? Dinheiro e documentos no bolso. No corpo, marca nenhuma de violência. O que poderia ter acontecido?

Penalidade foi enterrado no fim da tarde. Consternação geral. Quase todos os seus clientes se fizeram presentes, inclusive os ocasionais e até mesmo os que lhe deviam e ultimamente evitavam aparecer. A viúva recebeu ofertas de auxílio e pôde constatar como era querido o finado. Um turbilhão de flores acompanhou a descida do caixão e alguém puxou um violão para cantar “Beira-Mar”, de Ednardo, música favorita do Olimar.

No meio do chororô ninguém escutou o Jeová, vulgo Profeta, de dentro de seu casacão preto que havia muito não via sabão, dizer com seu jeito grave e o olhar fixo no caixão que descia:

– Lá se vai o segundo mártir.

Ou se alguém escutou, fez que não ouviu. Já não era fácil aguentar o Profeta nos bares com seus discursos sobre profecias apocalípticas, imagine em enterro.

– Mas o fim não se fez. Ainda restam três…

Apesar de muitos evitarem tocar no assunto, por uma lua inteira não se falou de outra coisa nas mesas dos bares da Praia de Iracema. Os mais inconformados fizeram abstinência etílica de três dias in memoriam. Outros beberam sem parar durante três dias.

Entretanto, ninguém, ninguém se deteve a relacionar a morte do garçom Penalidade com outra ocorrida três meses antes no Le Bombom, um motelzinho humilde frequentado pelas putinhas e travecas de fim de noite. A vítima fora seo Neném, dono do estabelecimento, gentil e pacato senhor de idade. Foi encontrado morto num dos quartos, estirado na cama. Estava nu e com a boca entupida com papel de bombons finos, coisa mais desumana.
.

.

CrimesDePaixao-02O detetive Eládio Vieira, como gosta de ser chamado (porém conhecido no submundo do crime por Eládio Ratoeira), trinta e nove de idade e quarenta de baralho, que sempre se gabou de ser um detetive de nível, acordou naquela manhã numa ressaca federal. Não dormira mais que duas horas. Tomou um banho rápido e pegou um táxi para a favela Verdes Mares. Daquela vez exageraram: o pôquer terminara às seis da manhã. E ainda pagou o equivalente a um mês de trabalho ao filho-duma-égua sortudo do Mardônio.

O detetive Eládio Ratoeira (ele que nos desculpe, mas certos apelidos já fazem parte da pessoa) nunca trabalhava nas manhãs de quarta-feira. Naqueles anos todos nenhum caso foi tão importante que justificasse sua falta ao velho pôquer das terças nem ao sagrado sono da manhã seguinte. Porém, ele conhecia dona Iza, a cigarreira, era seu cliente fazia tempo. E não teve como não se sentir abalado quando soube pelo telefone de sua morte naquela madrugada.

Quando terminou de fazer suas perguntas a vizinhos, parentes e amigos da vítima, o detetive Ratoeira rumou para seu escritório, no centro da cidade. Sentado em sua mesa com vista para a Catedral, comparou as informações que tinha e montou sua reconstituição. Dona Iza chega em casa, um pequeno barraco de madeira na favela Verdes Mares, aproximadamente às quatro da manhã. Vem da Praia de Iracema, onde trabalha como vendedora ambulante de balas e cigarros. Meia hora depois o marido sai para a fábrica, deixando mulher e filho no barraco. As primeiras chamas são avistadas logo depois por três homens que jogam sinuca num bar distante cinquenta metros. Socorrem o menino que dormia e retiram o corpo de dona Iza, já carbonizado, que jaz no chão da cozinha.

Ninguém da favela viu nada suspeito, nenhum fato estranho. Apesar de tudo indicar acidente, Ratoeira coçava a nuca sem entender por qual motivo a vítima não conseguira sair do pequeno barraco a tempo.

À noite, foi à Praia de Iracema. Escutou garçons, taxistas e vendedores ambulantes – todos unânimes em afirmar que se tratava de pessoa querida, simpática e generosa, não cultivava inimizade. Às onze, fechou o caderninho e encerrou as atividades. Mas antes de ir para casa deu uma passadinha no Quais Bar, o bar do finado garçom Penalidade, só para molhar o bico numa cachacinha. Reconstituiu as conversas da noite, uma a uma. A mulher não devia a ninguém, não gostava de confusão, era fiel ao marido. Nem crime passional, nem latrocínio e nem vingança. Restava acidente.

Ratoeira coçou a nuca com a ponta do polegar. Alguma coisa lhe dizia que tinha cachorro naquele mato. E sua intuição nunca lhe pregava peças. Por isso lhe botaram o Ratoeira no nome. Por mais que se esforçasse, não conseguira tirar o apelido. Apelido ridículo, dizia ele, Ratoeira é para investigador de polícia, corrupto e camisa manchada de suor. Ele não, ele tinha nível. Trabalhava de detetive porque sempre gostara de investigar, mas era formado em Engenharia. Dava aulas em cursinho pré-vestibular mas seu negócio era desvendar casos. Era tão bom no que fazia que muitas vezes a própria polícia lhe solicitava auxílio. Aliás, foram eles que lhe botaram o ingrato apelido: Eládio Vieira é nome de professor, diziam. Então ficou Ratoeira. Até algumas madames, sempre preocupadas com as saidinhas dos maridos, conheciam-no pelo apelido: Dessa vez eu tenho certeza que ele está me traindo, seo Ratoeira…

Então tomou um gole e olhou para o mar iluminado da Praia de Iracema, descansando a vista. Os vendedores disso e daquilo, os carrinhos de pipoca e as luzes fortes dos postes faziam aquela parte do bairro parecer um parque. Como o bairro pudera mudar tanto em tão pouco tempo? Alguns anos antes, os bares eram meia dúzia e conviviam pacificamente com os moradores. Agora, eram mais de cem, e de pouco adiantavam os esforços da associação de moradores para garantir mais tranquilidade e respeito às famílias que ainda insistiam em morar ali.

De uns moradores, em depoimentos que recolhera, escutou repetidas queixas quanto ao inferno em que se transformara a vida no bairro. Alguns chegaram a dizer que a morte da vendedora podia ter sido fruto da luta por pontos de venda, já não duvidavam de mais nada, os bares haviam trazido muitas pessoas de fora, e com elas, a violência.

Ratoeira já fora assíduo frequentador do bairro e conhecia sua história. Sabia que procedia a queixa dos moradores. Mas sabia também que a vocação boêmia do bairro vinha de longe e que a proliferação dos bares era difícil de ser controlada por envolver muitos aspectos, entre eles a geração de empregos e o turismo cada vez mais forte.

Ele praticamente deixara de frequentar o bairro depois da massificação. Antes, podia-se caminhar pelas ruas à noite, tranquilamente. Podia-se namorar olhando o mar sem medo de assalto, e os frequentadores conheciam-se uns aos outros e mantinham certa cordialidade para com os moradores. Era comum encontrar uma roda de violão na calçada. A boemia continha em si uma boa dose de poesia e amizade.

Mas agora, não. Em lugar de músicos, artistas, poetas e intelectuais, a Praia de Iracema via desfilar por suas ruas bandos barulhentos de mauricinhos e patricinhas, jovens obcecados pela potência do som de seus carros e a etiqueta de suas roupas. Com eles, vieram assaltos, roubos de carro, brigas nos bares, mortes. Traficantes de drogas e jovens brigões de academia também descobriram o filão. Então vieram os turistas, ávidos por consumo. Depois chegaram as prostitutas, por que não haveria um pedaço também para elas? A Praia de Iracema é de todos! – alardeava o slogan da campanha turística.

O detetive voltou para sua quitinete com muitos pensamentos e uma pulga atrás da orelha. Embora se esforçasse para não levá-lo a sério, não conseguia esquecer do Profeta, o maluco que encontrara no Quais Bar aquela noite. Conhecia-o de vista dali dos bares. Era o mesmo bêbado cabeludo de vinte anos atrás, o mesmo casacão fedorento, a mania de rimar as frases, não mudara nada. Ele sentara-se à sua mesa sem pedir licença:

– Sua intuição está certa, seo detetive. O que aconteceu com dona Iza não foi acidente. Mas não adianta um culpado perseguir, pois a profecia vai se cumprir.

Na hora, não atinou para o fato, mas depois sim: como é que ele podia saber a respeito de sua intuição se não falara dela para ninguém? Era só o que me faltava, pensou intrigado, um maluco lendo meus pensamentos. Bem, concluiu, virando-se na cama para dormir, até mesmo os malucos acertam uma de vez em quando…

Dias depois, o laudo do IML saiu com uma conclusão curiosa: não havia indícios de fumaça nos pulmões da vítima. Isso significava que ela morrera antes de começar o incêndio. Mas não concluía sobre a causa. Para isso seria preciso mais alguns dias.

Ratoeira coçou a nuca com o polegar: quer dizer então que dona Iza já estava morta? Teria sido queda ou algo assim? Ou alguém a matara?
.

.

CrimesDePaixao-02‒ Ô Garçom, duas cachaças, por favor.

– A minha é dupla.

– Muito bem, seo Jeová. O que o senhor sabe a respeito da morte de dona Iza?

Jeová, vulgo Profeta, de dentro de seu velho e endurecido casacão preto, olhou para o homem à sua frente com um misto de simpatia e desdém.

– O que eu sei é o que está escrito, seo detetive…

Naquela noite, uma semana após a morte de dona Iza, Eládio Ratoeira reencontrara o Profeta pelas ruas da Praia de Iracema e o convidou a tomar um aperitivo, por sua conta. Talvez o maluco tivesse algo de interessante a contar, ele que vivia dia e noite a realidade do bairro. O diabo era ter de aguentar o fedor daquele casaco…

O garçom chegou com as bebidas. O Profeta tomou a sua cachaça de dois goles e então pôs-se a falar da noite, da magia da praia e dos segredos dos bares. Contou histórias do bairro, lendas dos antigos moradores da área, personagens que já não existiam mais. Eládio Ratoeira escutava com atenção, surpreso com a própria paciência. O Profeta andava por ali desde o início da ocupação da praia pelos bares, ele e seu casaco, o cabelo sujo, os dentes estragados e todas as suas histórias esquisitas. Diziam que fora fotógrafo de jornal. Diziam que tivera uma banda de rock nos anos 1970, Punk Froid ou algo assim. Diziam que endoidara por causa de mulher. Não havia quem não o conhecesse, quem já não lhe tivesse pago uma dose de cana.

– Não duvide da realidade, seo detetive. Isso é importante pra sua profissão. Por exemplo, se eu disser que tem alguém sentado nesta mesa com a gente, alguém que veio com o senhor, o senhor duvidaria, né?

Eládio Ratoeira olhou automaticamente para o lado. Quando deu-se conta, irritou-se consigo mesmo e entendeu que já escutara demais, meia hora ouvindo maluquices, onde andava com a cabeça? Então respirou fundo e, botando um pouco de autoridade na voz, falou que já estava tarde e que se o outro não tivesse nada de mais concreto para dizer, então fosse desculpando que ele tinha trabalho amanhã cedo. E pediu a conta.

O Profeta sorriu um sorriso curto de resignação.

– Vou falar na língua que o senhor conhece, seo detetive. Me diga uma coisa. Se o senhor não sabe que eu tenho nas mãos uma quadra de damas, então essa quadra não existe pro senhor, não é mesmo? Não existe porque o senhor não sabe que eu tenho, não é isso? Pois ela existe sim, independente do senhor saber.

O detetive Eládio Ratoeira, quarenta anos de baralho, encarou o Profeta e sentiu um calafrio lhe percorrer a espinha. O maluco sabia que ele jogava pôquer? Então lia mesmo pensamentos?

Por alguns segundos, manteve o olhar fixo nos olhos do homem, procurando alguma pista que indicasse qualquer coisa… Mas a expressão do outro não mudou, permaneceu impassível, o olhar manso e desarmado, tipo do sujeito incapaz de mal algum.

De repente, um gato preto entrou pela porta do bar e aproximou-se da mesa, miando para o Profeta. Ele o pegou nos braços e pôs no colo, acariciando-lhe o pelo.

– O senhor está investigando somente o caso de dona Iza, não é? Pois vou ampliar um pouco mais seu horizonte. É só porque simpatizei com a sua honestidade.

Eládio Ratoeira esperou. Dos braços do Profeta, o gato preto o observava com seus olhos amarelos.

– Olhe, a morte de dona Iza tem dois precedentes. Um é seo Neném, dono do motel, que morreu cinco meses atrás. O outro é o garçom Penalidade, morto faz dois meses. Eu sei que o senhor sabe, eu sei. Mas ainda não ligou os fatos. Os três eram personagens conhecidos na praia, faziam parte da paisagem. Atente pra ironia, homem: o dono do motel, que vendia sexo, morreu na cama. O garçom, que vendia bebida, morreu afogado. E a cigarreira morreu queimada.

– Morreu antes de ser queimada – interrompeu Ratoeira, dando-se conta, um segundo depois, que revelava um segredo de trabalho.

– É o simbolismo que vale. A noite está morrendo por meio de seus personagens. A profecia é desumana, mas é real.

– Que profecia?

– O senhor conhece. Um dia, a noite da Praia de Iracema vai morrer.

Eládio Ratoeira perdeu de vez a paciência. Pagou a conta e levantou-se.

– Pelo que me consta, seo Profeta, e talvez não conste ao senhor, é que foi uma mulher loira, bonita e aparentando vinte e poucos anos, trajando vestido preto, que foi vista na companhia de seo Neném poucos minutos antes dele ser encontrado morto. Nada de símbolo. Foi assassinato e vou provar.

– Então, homem? Pra que melhor simbolismo? Uma loira bonita e cruel, vestida de preto… A cool girl will kill you in a darkened room… O senhor conhece essa música?

Pronto, o maluco sabe inglês, pensou Ratoeira, coçando a nuca.

– O senhor está tão obcecado em descobrir o assassino que não consegue ver o óbvio.

Ratoeira caminhou para a calçada e, enquanto acenava para o táxi, pôde ouvir o Profeta lá na mesa, ainda com o gato preto nos braços:

– Toinho, Tereza, Tarzan… Quem é o próximo de amanhã?
.

.

CrimesDePaixao-02Durante os dias que seguiram, o detetive Eládio Ratoeira aguardou com expectativa o segundo laudo sobre a morte de dona Iza. Finalmente, obteve uma informação: os legistas não conseguiam descobrir a causa mortis. Simplesmente, não sabiam.

A segunda conversa com o Profeta repercutia insistente em sua cabeça. Aquela história da profecia sobre a morte da Praia de Iracema era antiga, mas era apenas mais uma das histórias malucas sobre o bairro. O povo ficava fumando maconha nos becos e inventando aquelas coisas. A verdade verdadeira era que seo Neném morrera de ataque cardíaco e a mulher loira fora realmente vista na noite do crime por duas testemunhas. O garçom Olimar morrera afogado e não havia suspeitos. O caso de dona Iza é que era o mais misterioso. As mortes, porém, não tinham ligação entre si, como supunha o Profeta.

De qualquer modo, os casos do garçom e do dono do motel não eram da sua conta. O garçom certamente caíra sozinho do píer, embriagado. E a loira suspeita de matar seo Neném estava sendo procurada pela polícia. Seu problema era a cigarreira, descobrir por que ela não conseguira escapar do incêndio.

Eládio Ratoeira ligou o chuveiro e meteu-se debaixo da água fria. O que precisava era de um bom banho e de uma mesinha de pôquer divertida. Quadra de damas… Quem sabe não seria uma dica para a mesa daquela noite? Bem que podia ser. Descontar o que o Mardônio lhe ganhara da última vez.

Após o banho, vestiu-se rapidamente e foi encontrar o resto do pessoal no Papagaio, o único bar que aceitava receber aquela mesa de pôquer, uma mesa no depósito do primeiro andar, é verdade, mas aceitava. Mesa de cinco, uma garrafa de conhaque, pratinho de amendoim. Do lado de suas fichas, uma foto da Danusa pelada, secretária do escritório vizinho ao seu, era para dar sorte, patuá antigo, ela até já casara. O cacife vale vinte, primeira pausa à meia-noite, mexeu no patuá do outro vale uma advertência, o prêmio é um, dois e quatro cacifes, vamos jogar que o jogo é jogado e tomem cuidado que hoje eu tô invocado…

Ratoeira tentava se concentrar no jogo, mas não podia aparecer uma dama na mesa que logo lembrava da conversa do outro. Como o maluco podia saber que ele jogava pôquer? Será que era por isso que o chamavam de Profeta, tinha o dom de adivinhar coisas?

As três cartas da mesa começaram a ser abertas. Uma dama de espadas surgiu. Precisava se concentrar no jogo.

Toinho, Tereza, Tarzan…  Mas até o Tarzan estava metido naquela história? Ratoeira achou engraçado e riu. Precisava se concentrar, estava muito disperso.

A segunda carta da mesa: dama de paus.

Toinho, Tereza, Tarzan… Todos começavam com T. Será que o maluco queria dizer que o nome do próximo a morrer começava com T?

Então, a dama de copas apareceu na mesa. Trinca de damas! Uma exclamação geral percorreu a mesa. Todos se entreolharam, sorrindo maliciosos. Quem tivesse a dama de ouro faria a quadra. Se alguém tinha, sorriu para disfarçar a felicidade. E quem não tinha, sorriu para esconder o medo.

Ratoeira sentia o coração pulando dentro do peito. Ergueu o olhar e, do outro lado da mesa, deu de cara com os olhos desconfiados do Mardônio por trás da fumaça do baseado. Voltou às suas cartas. Ou se concentrava ou então o demônio do Mardônio lhe adivinharia o jogo.

Já havia visto a primeira de suas duas cartas. Era um dois de paus. A outra estava por trás. Faria um pequeno suspense para si próprio. Então, num impulso, dobrou a aposta, ainda sem saber qual era sua segunda carta, uma jogada no escuro. Claro que era arriscado. Não costumava fazer aquilo, mas era o tipo da coisa que podia funcionar como um bom golpe psicológico nos outros jogadores. Tomou um gole do conhaque. Tinha de aparentar calma.

Então Mardônio pôs várias fichas sobre a mesa, dobrando a aposta mais uma vez. E tornou a encará-lo. Os outros jogadores desistiram e sobraram eles dois. Ratoeira, ainda sem ver a segunda carta, pagou a aposta. Alguém assobiou, surpreso.

Ratoeira tentou manter-se tranquilo. A coisa estava ficando séria. Respirou longamente e decidiu finalmente ver a segunda carta. Seu próximo lance dependia dela. Se fosse a dama de ouros, iria com a aposta até o fim do mundo. Tinha que ser a dama. Tinha que ser a quadra. A quadra do Profeta.

Ratoeira deslizou os dedos lentamente, fazendo a pressão exata para que a carta de trás não surgisse de todo. Fazia suspense para os outros e para si próprio. Podia sentir que Mardônio o observava atentamente, pronto para interpretar qualquer mínimo gesto seu. Os outros não ousavam falar nada. Era a maior aposta da noite.

Ratoeira deslizou os dedos mais um pouco. Descobrindo o lado inferior esquerdo, percebeu pelo desenho que a carta era uma figura, não era um número. O coração disparou. Tinha uma trinca de damas já certa e agora aquela carta podia ser a outra dama que faltava. Ou era um rei ou um valete ou uma dama. Tinha de ser a dama de ouros.

Continuando o suspense, descobriu um pouco da parte superior esquerda e a letra começou a aparecer, em cor vermelha, aos poucos, devagarinho, a cor vermelha…

Ratoeira, quarenta anos de baralho, não acreditou no que viu. Por alguns segundos, não conseguiu pensar em qualquer coisa. Depois, imaginou que alguém aprontara alguma brincadeira idiota para cima dele. Mas ninguém ria. Estavam todos sérios aguardando sua decisão.

Ratoeira engoliu seco. Em sua mão estava uma carta que não era rei, nem valete e nem dama. Em sua mão estava um macabro esqueleto sobre um cavalo, empunhando uma foice. E a letra, no canto superior da carta, era um T. Um T vermelho como sangue.
.

.

CrimesDePaixao-02Tânia Mara parou em frente ao espelho do banheiro e enxugou os longos cabelos negros. Passou uma escova e jogou-os para trás. E parou para se olhar. Sua experiência como loira durara apenas seis meses, não foi muito proveitosa, poucos aprovaram. Até mesmo Rian, seu gato, estranhou a mudança. Ficava olhando para ela com seus olhos amarelos, olhando como se não reconhecesse aquela mulher loira. Agora seus cabelos eram negros novamente, a cor do seu gato e das roupas que usava, e era confortável reencontrar a velha imagem.

Vivia um bom momento. Os shows estavam acontecendo. Os rapazes da nova banda eram músicos competentes, e juntos faziam um bom trabalho. A noite aos poucos tomava conhecimento de Tânia Mara. Ah, a vida devia ser sempre assim, ela falou para a imagem no espelho, cantar blues e viver as emoções. De preferência, bem fortes, meu bem.

Deu uma última olhada no corpo nu refletido, o corpo que assumidamente usava como arma, nos palcos e na vida. Pôs duas gotas de perfume nas mãos e passou na nuca e no colo. Apalpou os seios. Olhou-os de perfil. E vestiu uma camiseta preta, que lhe desceu até metade das coxas. No espelho, viu seu rosto ao lado do de Jim Morrison, refletido do pôster da parede de trás. Antes de deixar o banheiro e dirigir-se ao quarto, beijou-o na boca pelo espelho.

– Você não me engana, cara. Sei que está vivo. Um dia a gente se encontra.

No toca-disco da sala, era ele, o Rei Lagarto, quem cantava: If you give this man a ride, sweet family will die… Killer on the road… Tânia Mara fechou os olhos, escutou a música e respirou fundo. Mordeu o lábio. Eu resisto a tudo, meu bem, menos às tentações… No quarto, pegou a garrafa de Jack Daniel´s na mesinha de cabeceira e foi para a sala. Parou na porta, segurando a garrafa e olhando para o homem sentado no chão encostado no sofá. O relógio da parede lhe dizia que demorara vinte minutos no banho. Vinte minutos para o que ele terá é pouco…, ela pensou, sorrindo.

– Tim-tim… – ela brindou, após servir os copos.

– A você. Desumana Tânia.

– A mim.

Enquanto Jim cantava a mortal carona na estrada, Tânia Mara bebeu um pouco do uísque e olhou para o homem à sua frente. Conhecera-o por ocasião de um show, uma semana antes. Logo que chegou ao bar seus olhares se cruzaram de um modo estranho, e durante o show pôde perceber como ele a olhava com desejo. Cantou o tempo todo excitada, sentindo a calcinha molhada. E fez seu melhor show. Quando saiu do camarim passou pela mesa para chamar sua atenção. A isca funcionou: ele a convidou para um drinque e ela aceitou. Ele elogiou sua voz e as músicas, principalmente “Desumano blues”. Ela gostou do jeito dele, misterioso. Além do mais, ele falou: Você tem o jeito da noite… E isso ficou em sua cabeça, não esqueceu. O jeito da noite.

Rian surgiu de repente, vindo da cozinha, e foi enroscar-se em suas pernas. Ela pôs o gato preto em seus braços.

– Escapou, né, safado? Vem, vamos voltar. Hoje você não pode ficar comigo, entenda…

Ela saiu em direção à cozinha e voltou logo depois.

– Quem é você, Tânia?

– Uma garotinha sortuda sob os holofotes da noite.

– Ou só mais um anjo perdido na noite da cidade?

Ela imitou uma garotinha tímida e desprotegida, brincando com os dedos. Então foi até a estante botar novamente o disco para tocar. Podia sentir o olhar dele em suas costas, deslizando pelos seus contornos. Ele agora vai levantar e vir até aqui…

– Também gosta de Jim Morrison? – perguntou ela, pousando a agulha novamente na última música.

– Gosto mais de Tânia Mara.

A voz dele bem atrás, podia senti-la em seu pescoço.

– Por que você diz que eu tenho o jeito da noite?

– Porque a noite é desumana.

Desumana…, pensou ela, saboreando o que escutara.

– Nada que eu possa evitar, meu bem…

– Você tem futuro, Tânia Mara.

– Eu sei.

– Comigo.

– Com você? Essa parte do roteiro não recebi.

– Se quiser, posso levá-la daqui, exibir sua voz pelo mundo, vivermos uma tórrida paixão. No fim, morreremos de amor em Paris. Na banheira de um quarto de hotel.

– Tentador… Mas os lagartos não morrem em Paris, querido.

Primeiro, foi o braço dele em sua cintura, puxando-a com força. Em seguida, foi a sua boca invadindo a dele, as línguas sem cerimônia. Depois as mãos, a camiseta subindo, rasgando, as mãos em suas costas, em seu pescoço, nos seios, seu corpo nu nos braços dele, no meio da sala. Depois foi o sofá, depois as roupas dele, a urgência, o suor. Depois as estrelas, as estrelas… E os teclados gotejantes de um blues morrendo aos poucos, sob a chuva. Depois, o silêncio. Desumano silêncio.

Meu bem, esta cidade ensurdece
E você esquece do que eu tenho pra dizer
Meu bem, a noite é desumana
Fumando e bebendo sozinha em meu apê…

(Tânia Mara – Desumano Blues)
.

.

CrimesDePaixao-02Foi o tenente Trindade, amigo informante na polícia, quem avisou Eládio Ratoeira. Imediatamente, ele pegou um táxi e conseguiu chegar ao apartamento da vítima antes da imprensa, quando a polícia ainda recolhia material e fazia as fotos. Ratoeira conferiu o estrago com os próprios olhos. Viu o corpo nu da cantora, belo e ensanguentado, estirado de bruços no tapete, as pernas abertas, o pescoço rasgado. A polícia já havia recolhido alguns objetos para análise pericial, entre eles dois copos e um disco de vinil partido ao meio com restos de sangue.

– Conhece, Ratoeira? – perguntou o tenente Trindade, mostrando o disco partido.

– “L. A. Woman”. Um crime quebrar um vinil desse.

Ratoeira caminhou pelos aposentos. No mural do quarto viu fotos, bilhetinhos, cartazes de show… De repente, um gato preto surgiu correndo e foi meter-se debaixo do guarda-roupa. Pela ração na cozinha, Ratoeira deduziu que morava com a moça. Tentou pegá-lo, mas o gato saltou e em dois tempos estava no parapeito da janela, olhando para ele. Por um instante, passou-lhe pela cabeça que o bichano podia estar tentando dizer algo, gatos são meio bruxos. Fixou o olhar nos olhos do animal e perguntou:

– Quem foi? Eu sei que você sabe.

O gato, imóvel no parapeito, continuou olhando para ele. E miou.

– Então é este seu método, Ratoeira… Interrogação felina.

Ele virou-se e viu o tenente, parado na porta.

– A vizinha disse que o nome dele é Rian. Em francês quer dizer…

– Nada.

– Exatamente. Ou seja: ele não sabe nada.

Enquanto o tenente Trindade ria, Ratoeira pegou o gato nos braços e o acariciou.

– Não se deve duvidar da realidade… Né, Rian?
.

.

CrimesDePaixao-02Eládio Ratoeira sentou no sofá da sala de sua quitinete. Ligou a tevê, mas não prestou atenção. Seu pensamento estava na Praia de Iracema…

Tânia Mara, o nome da moça. Bonita. Vinte e três anos, cantora de blues. Tinha uma banda e os frequentadores dos bares a conheciam. Estava na cidade havia um ano, morava sozinha. Fizera um show na noite de terça e depois não foi mais vista. Quem descobriu o corpo foi o gaitista da banda, dois dias depois. Como ela não havia comparecido ao ensaio nem atendia ao telefone, ele fora até seu apartamento. A porta não estava trancada e ele entrou, encontrando o corpo estendido no tapete.

Tânia Mara… O T da charada, pensou Ratoeira. Cantora da noite. Morreu com o pescoço rasgado por um disco. Indícios de luta corporal, ela certamente resistiu. Mas o assassino era mais forte e a derrubou. Virou-a de costas no tapete da sala, deitando sobre ela. Tapou-lhe a boca com um lenço para que não gritasse. Quebrou o disco ao meio e rasgou-lhe o pescoço. Enquanto a hemorragia a enfraquecia, ele a sodomizou ao som de “Riders on the Storm”…

– Miaaauuu…

Ratoeira despertou com o miado do gato aos seus pés.

– Tá com fome, Rian?

Levantou-se e pôs mais ração no pratinho. Depois, ainda com a cena do crime em sua mente, pegou caneta e papel. E escreveu o nome de todas as vítimas. Primeiro, o dono do motel, que morreu na cama. Três meses depois, o garçom, que morreu afogado. Dois meses depois, a cigarreira, que morreu queimada. Um mês depois, a cantora, morta com o pescoço rasgado por um disco. Nenhum latrocínio. Nem crime passional, nem vingança. Em seis meses, quatro crimes sem sentido. Mas simbolicamente coerentes, como dizia o Profeta. Ratoeira coçava a nuca, pensando se a polícia estaria a par daquela suposta relação entre os crimes. Coincidência ou não, ele já não conseguia deixar de relacioná-los.

Mas como o Profeta sabia que a próxima vítima começaria pela letra T? Ou teria sido apenas um palpite? Ratoeira escreveu o nome das vítimas no papel. Neném, Penalidade, Iza e Tânia, em sequência cronológica. N, P, I e T. Não formavam nada lógico à primeira vista. Tentou algumas combinações, mas nada lhe chamou a atenção. Então percebeu que os dois primeiros eram apelidos. O nome verdadeiro do seo Neném era Nilton, a mesma inicial. Mas o nome do garçom era Olimar.

Substituiu a letra P de Penalidade pela letra O de Olimar. Tinha agora N, O, I e T.

Um relâmpago cruzou o interior de sua mente. Um arrepio percorreu-lhe o corpo de cima a baixo. Ratoeira ficou olhando para o papel, sem acreditar.

A profecia.
.

.

CrimesDePaixao-02– Eu sabia que você viria. Quer sentar?

Jeová, o profeta da praia, ele e seu casacão preto e imundo.

– Uma dose de cana pro Profeta – pediu Ratoeira ao garçom.

– Tripla – acrescentou Jeová, grave como sempre. – A moça merece.

– Como você sabia que seria ela?

– Tudo que sei é o que está escrito.

– E o que está escrito?

– Que chegou o fim dos tempos.

– Que mais?

– Que a noite desta praia está condenada.

– Condenada por quem?

O garçom chegou com a bebida. Eládio Ratoeira observou o Profeta erguer o copo cheio de cachaça à altura do nariz, fechar os olhos e cheirar. Ia repetir a pergunta quando o outro abriu os olhos.

– As pessoas dizem que eu sou louco. O que o senhor acha?

– Não acho nada. Quem está tentando matar a noite?

– A noite está morrendo… – prosseguiu o Profeta, entre um e outro gole. – Mas a morte sempre vem, seo detetive. Ninguém sai vivo daqui. A noite dessa praia morre quando abrem um novo bar, por mais estranho que pareça. A noite morre quando esses boyzinhos vêm desfilar suas grifes por aqui, quando as barraquinhas na rua vendem bebida aos menores, quando os próprios garçons fornecem cocaína aos clientes e os taxistas e donos de motéis fazem vista grossa pros turistas e suas menininhas de doze anos.

Ratoeira escutava, seus olhos nos olhos vermelhos do Profeta.

– A noite morre toda vez que alguém é assaltado na esquina escura, quando um carro é roubado, quando brigam os garotões valentes de academia. A noite morre quando a mãe se exaspera ao ouvir o choro do bebê que não consegue dormir por causa do som alto do bar vizinho. A noite morre nas músicas dos carros, nas churrascarias que trazem gente de bairros distantes e que não entende a brisa da praia. A noite morre porque esse é o destino de todos. E a culpa não é de ninguém. Por isso não adianta o senhor procurar o culpado.

– O que fazer então?

– Os dias estranhos nos alcançaram, seo detetive. Seguiram nosso rastro e destruíram nossas alegrias mais simples. Nada a fazer.

– Tem de haver um assassino.

– A Praia de Iracema é de todos… – O Profeta sorriu tristemente, olhando o mar pela janela do bar: – Todos têm direito a uma cota de seu linchamento.

– E você, não tem pena dela? Ou das vítimas?

– Lamento pelos filhos da praia, que tentam perpetuar o que já é passado. Esses amam a noite e morrem com ela. Muitos nem nasceram aqui, mas são feitos da mesma maresia. É ruim se apegar demais ao que vai morrer. Koi-guera.

Ratoeira escutou com atenção. Dessa vez as palavras do Profeta, por mais loucas que fossem, pareciam ter alguma coerência. Ou será que sempre tiveram e ninguém nunca percebera?

– Quem será o próximo?

– O senhor ainda não desconfia?

– A letra E é de Eládio?

– O que o senhor acha?

– Faria sentido. O assassino matou o sexo, a diversão, a droga e a música. Não falta mais nada. Matar quem quer desmascará-lo seria o último passo. O grand finale.

O Profeta escutava, sério.

– Quem matou a cantora foi um homem, eu sei que foi, o mesmo que esteve com ela depois do show, bebendo no bar. Se vários foram os assassinos, então eles estão obedecendo à sequência “noite” nas mortes. Ele ou eles trabalham pra quem?

– O senhor não entende. Quem matou os quatro foram os mesmos que matam a Praia de Iracema, a cada noite, a cada violência. E eles não têm consciência disso, matam por ignorância. Pensando bem, talvez seja melhor acabar de vez com sua agonia. Matar antes que ela morra. Matar por amor – acrescentou o Profeta, bebendo o resto da cachaça e levantando-se da mesa.

– O que vai acontecer quando morrer a letra E?

– Cumpre-se a profecia.

– Como assim?

– Pensei que o senhor já tivesse entendido… É a parte mais óbvia da história, seo detetive.

Sempre que pensava na profecia, Ratoeira sentia-se meio ridículo. Mas já não podia evitar.

– A noite morre… – repetiu o Profeta, saindo em direção à porta. – Nada lhe ocorre?

Enquanto pensava nas palavras do Profeta, Ratoeira puxou a carteira para pagar a conta. Foi quando percebeu que o copo de cachaça do Profeta continuava cheio, do jeito que chegara. Mas ele não havia bebido tudo?
.

.

CrimesDePaixao-02Eládio Ratoeira entrou em casa, foi direto ao quarto e deitou-se, os olhos pesando de tanto sono. Precisava de uma noite bem dormida.

Mas… algo estranho estava acontecendo…

Acendeu o abajur e viu Rian, deitado na cama, olhando para ele. Então percebeu que Rian na verdade era uma gata. E estava parindo, exatamente naquele momento, estava tendo gatinhos em sua cama, vários gatinhos saindo sem parar, vários, muitos…

Ratoeira abriu os olhos. A luz do quarto estava acesa. Passou a mão no rosto suado, compreendendo que sonhara. Se as coisas continuassem daquele jeito terminaria precisando de um tratamento. No pôquer do mês anterior vira uma carta com a figura da morte, um esqueleto montado num cavalo, a letra T, que loucura. Terminou jogando as cartas na mesa, indignado com o que pensava ser uma brincadeira idiota dos amigos. Teve que pedir para sair, tão abalado que ficou com a visão da carta. Depois viu o copo cheio de cachaça do Profeta quando, na verdade, vira-o bebendo tudo bem à sua frente. E agora tinha pesadelo com uma gata parindo em sua própria cama.

Tomou um banho frio e depois pegou um pedaço de pizza na geladeira. Comeu sem esquentar. A tevê exibia o clipe da Intocáveis Putz Band tocando o “Manifesto das bem-aventuranças”, todos vestidos feito monges, capuzes, o clima sombrio… Ratoeira desligou, irritado. Aquelas mortes estavam inspirando até mesmo as bandas da cidade.

Olhou para Rian, dormindo no sofá. Estaria sentindo falta da antiga dona? Lembrou do sonho, a gata parindo. O que podia significar? Parto… nascimento… algo importante que virá… Mas o quê? Quando?
.

.

CrimesDePaixao-02“No dia 28 de dezembro completam-se nove meses da primeira morte.”

Eládio Ratoeira olhou para a frase que escrevera, pensando em quanto aquilo era estranho. Deixaria um depoimento escrito a respeito de tudo que sabia sobre as mortes, caso algo viesse a acontecer com ele. Na carta, admitia que podia muito bem estar fantasiando mas não podia desprezar o simbolismo de que falava o Profeta.

Podia muito bem dar o caso de dona Iza por encerrado: os legistas finalmente admitiram que havia sim vestígios de fumaça nos pulmões da vítima e, portanto, ela morrera asfixiada, fora um acidente. Mas isso lhe parecera algum tipo de armação, talvez os legistas realmente não tivessem descoberto a causa da morte. E como se tratava de gente pobre e não havia nenhum interesse maior no caso, inventaram tal conclusão.

As outras mortes continuavam sem culpados. A polícia concluíra que o garçom realmente se afogara. Quanto a seo Neném, nenhuma pista sobre a tal loira de preto. Nem sobre o assassino da cantora.

Mas as estranhas mortes viraram assunto indispensável, e frequentavam as mesas da Praia de Iracema todo tipo de suposições, desde as que acusavam ser tudo obra para desviar a atenção das eleições às que denunciavam maquiavélicos planos de empresários dispostos a substituir os bares por hotéis de luxo.

E havia os que reiteravam o que dizia o Profeta: faltava apenas uma morte para que a profecia se cumprisse e a noite da Praia de Iracema morresse de vez. Por isso era preciso aproveitar o que ainda restava, as noites estavam no fim. Bandas compunham músicas sobre as mortes. Nas mesas, os poetas vendiam cordéis de terror. Nas ruas, as camisetas circulavam com os dizeres “Esta pode ser a última noite. Aproveite. Comigo.” Bares pegavam carona na onda e faziam promoções. “ApocaLIP-se!” – assim convocava seus clientes o Lip Bar. Alguns mais supersticiosos vendiam barato seus pontos para evitar prejuízo maior: se não haverá noite, quem irá aos bares?

A noite, porém, ainda estava viva. E naquele 28 de dezembro, exatos nove meses após a morte de seo Neném, Ellen Star faria na Boate Circus a sexta apresentação de seu macabro espetáculo transformista “Mate-me que eu já te matei”, que tratava exatamente de todas aquelas mortes. E era lá que Eládio Ratoeira estaria.

“Nove meses que tudo começou. Sinto que hoje o mistério será decifrado. Tenho que estar lá. Se estou fantasiando, nada acontecerá, e os crimes seguirão sem solução. Mas se estou certo, então alguém morrerá. E talvez eu descubra quem é o assassino.”
.

.

CrimesDePaixao-02Era quase meia-noite quando Eládio Ratoeira chegou à boate Circus e sentou-se numa mesa mais ao fundo. Pediu uma cachaça e foi ao banheiro. Aproveitou para observar o ambiente, balcão, cozinha, corredores. A boate não era grande, cabiam ali umas vinte mesas. No canto havia um pequeno palco. Em caso de confusão, a porta principal seria estreita demais para evacuação rápida.

Todas as mesas estavam cheias quando as luzes se apagaram.

– Estão todos aí? – uma voz cavernosa ecoou pela boate. – O espetáculo vai começar.

A cortina se abriu para o primeiro ato. Uma voz feminina cantando ao som de um piano. Você me olha desse jeito… Pensa que eu não sei que você quer me comprar… O cenário de um quarto de motel. Um homem deitado na cama. Uma mulher loira num vestido negro com uma generosa fenda lateral, exibindo suas belas pernas. Mas eu não estou à venda, meu bem… A mulher caminhando devagar até a cama. Ratoeira ajeitou-se na cadeira, impressionado com a beleza da atriz. O que está à venda é seu sonho de ter o que você pode pagar…

Ellen Star foi a loira amante do dono do motel que morria de ataque cardíaco durante um orgasmo. Depois, foi o garçom que se encontrou no píer com o amante de sua mulher, que o empurrou ao mar. Ratoeira demorou a acreditar que Ellen também era o ator que interpretava o garçom. Como alguém podia ser tão convincente como mulher e também como homem?

Em todas as cenas Ellen dublava músicas especialmente escolhidas. Na terceira, ela era um garoto que tentou roubar dinheiro do barraco da cigarreira e causou o incêndio que a vitimou.

– Ellen é ela ou ele? – perguntou Ratoeira ao garçom.

– É um mistério. Mais uma cachaça?

A cena da cantora começou com Ellen Star dublando “Little girl blue”, um blues muito triste na voz de Janis Joplin, e Ratoeira pôde observar como as pessoas estavam bastante absortas no espetáculo, algumas visivelmente emocionadas. Havia no ar um clima de comoção, mas também de suspense. No momento em que a cantora chegava em casa radiante de felicidade por ter feito o melhor show de sua vida, Ratoeira escutou um miado. Procurou no palco, mas não viu gato algum. Então escutou novamente, dessa vez mais forte, e viu as cabeças se virando, todos procurando saber de onde vinha o som.

Vinha do lado da entrada. Ratoeira virou-se, e na penumbra percebeu um homem em pé, encostado na parede, de frente para o palco, vestido num sobretudo preto. Olhando melhor, percebeu que seu rosto estava pintado, lembrando o de um gato. Faria parte do show? No palco, a cantora rasgava com um disco de vinil a própria garganta, morrendo feliz e realizada. Quando Ratoeira olhou novamente, o homem havia sumido.

Ratoeira coçou a nuca, cada vez mais nervoso. Algo o inquietava. Havia algum mau presságio no ar, ele podia senti-lo.

A quinta cena começara e Ellen Star representava uma travesti batendo seu ponto na esquina, sob a luz fraca de um poste. Saia branca curtíssima, meias pretas, salto alto, o cabelo ruivo chanel revelando o pescoço fino. Os olhos sombreados e os lábios vermelhos. Os carros passavam e ela, insinuante, fazia trejeitos e jogava piadinhas aos motoristas. Tocava um envolvente bolero chamado “Lupiscínica”, de onde vinha a frase-título do espetáculo.

Vamos adiar essa briga, amor…

De repente, um automóvel parou mais à frente. Ellen sorriu. A luz traseira acendeu-se e o carro voltou de ré. Ellen ajeitou a saia e assumiu posição de espera.

Na madrugada, sonolento, de bolero em bolero…

O carro parou ao lado e o vidro fumê baixou, surgindo os rostos de uma garota e de um garoto. A travesti aproximou-se pelo lado da garota, debruçou-se na janela e sorriu, os seios como se numa bandeja.

A tua boca guarda segredos de mim…

– Boa noite, jovens.

– Oi – respondeu a garota.

– Ontem vocês passaram por aqui, não passaram?

– Você é boa observadora.

– Sou boa também em outras coisas…

E hoje sinto ciúmes até da tua falta…

– Você é homem ou mulher?

– Sou o que você e ele quiserem, meu bem.

– Quanto custa desvendar o mistério?

– Pra vocês faço por cem.

Mas não vou mais matar ninguém por tua causa…

– Você é muito bonita.

– E vocês são uma gracinha.

– Bonito, teu peito…

– Quer pegar? – perguntou a travesti, levando a mão da garota até seu seio. – Concorrência desumana, né, querida?

– Outra noite a gente vem com mais calma – disse o garoto.

– Mas não demora, viu? Posso não estar aqui.

– Vai mudar de ponto?

– Eu sou a noite, meu bem. A noite sempre chega ao fim.

Mate-me que eu já te matei…

Um homem. Vestido num sobretudo preto. Rosto pintado como um gato. Surgiu de algum lugar da escuridão da rua. Tão silencioso que de repente ele já estava lá, na calçada. Aproximou-se.

No momento em que a travesti virou-se, ele desferiu-lhe um violento soco no rosto. Ela caiu no chão, sobre o meio-fio, quase no asfalto.

Assustada, Ellen passou a mão no canto da boca e percebeu que sangrava. O homem continuava em pé. O automóvel arrancara. E o bolero havia terminado. Ele meteu a mão sob a roupa e puxou um revólver.

Ratoeira sentiu o coração gelar. O único som era o dos automóveis passando pela avenida. Ratoeira viu Ellen Star levantar-se e encarar com altivez o sujeito à sua frente. Foi ela quem gritou, a mão sobre os lábios feridos:

– Você tinha que estragar tudo, né?

Quando o homem empunhou a arma e apontou para ela, Ratoeira não ousou piscar os olhos. Estava petrificado, a respiração presa, toda a sua atenção concentrada nos dois, a travesti que encarava o homem e o homem que atiraria na travesti.

O tempo parecia ter parado. Ratoeira não mexia um único músculo. Alguma coisa iria acontecer no próximo instante e ele não fazia ideia do que seria.

Um pensamento lhe veio rápido à mente: e aqueles carros passando, aqueles prédios todos ao redor? Ninguém via nada? Ninguém para gritar, impedir um crime? Aquelas janelas todas, centenas, milhares de janelas… A noite da cidade tinha tantos olhos e, no entanto, ninguém via nada…

Ellen Star moveu-se rapidamente e de dentro da bolsa sacou um revólver, apontando-o com as duas mãos para o homem. A arma disparou. Um grande estrondo, o eco permanecendo no ar por longos segundos, a fumaça subindo do cano…

Ratoeira viu Ellen afastar-se para trás, cambalear sobre os saltos altos, perder o equilíbrio e chocar-se contra o poste feito um triste boneco desengonçado. Depois escorregou para o chão e ficou lá, inerte, enquanto os faróis seguiam indiferentes pela avenida. E as janelas nada viam.

O homem do sobretudo, ainda segurando o revólver, avançou. Ele agachou-se sobre o corpo de Ellen, passou a mão levemente por seu rosto e falou baixinho:

– Meu amor…

Então ergueu-se e saiu caminhando devagar pela calçada. E atravessou a avenida, num passo tranquilo, sem olhar para os lados. Um carro freou bruscamente para não atropelá-lo e quase provocou um acidente com outros carros. Na confusão, os passantes perceberam o corpo na calçada e se ajuntaram ao redor.

Eládio Ratoeira também foi para lá, abrindo caminho entre a multidão. Dirigiu-se até o corpo caído. Viu o sangue espalhado pela roupa, escorrendo para o chão. Suspendeu a cabeça de Ellen enquanto ela abria os olhos devagar. No meio de sua expressão serena surgiu um doce sorriso:

– Aquela cartomante me paga…

– Como? – indagou Ratoeira.

– Ela me garantiu que… ai…. eu morreria em Paris…

– Aguente mais um pouco, Ellen.

– É o fim, meu belo amigo. O fim das doces mentiras… das noites em que tentamos morrer…

– Não fale. O socorro está chegando.

– Você… ai, como dói… faz parte deste teatro ridículo?

– Ahnn… sim… – ele respondeu, sem saber o que dizia.

– Acho que minha participação termina aqui… Você gostou?

Ratoeira virou-se para as pessoas ao redor, elas e seus rostos impassíveis.

– Quem é ele, Ellen? Um cliente seu?

– Ele não tem culpa…

Ratoeira percebeu que ela respirava com cada vez mais dificuldade.

– Por que ele atirou em você?

– A profecia. Tem que ser cumprida.

Ratoeira desgrudou o cabelo ensanguentado da boca de Ellen e, olhando para aquele rosto bonito, lembrou-se do que ela dissera ao casal do carro: Eu sou a noite…

– O que vai acontecer agora?

– Acabou a peça, meu bem. As luzes se acendem.

Então ela fechou os olhos. E sua cabeça tombou para o lado no momento em que as luzes se acendiam. Ratoeira olhou para o corpo imóvel em seus braços, o belo corpo de Ellen. Percebeu que um seio estava de fora, um seio bonito. Olhou para as pernas. Lentamente estendeu o braço e tocou o sexo de Ellen, apalpando-o…

– Essa técnica eu não conhecia, Ratoeira.

Ele virou-se rápido, retirando a mão. Reconheceu o tenente Trindade, em pé, a viatura parada atrás. Pousou a cabeça de Ellen no chão e ficou de pé, a roupa encharcada de sangue.

Ratoeira olhou o relógio: uma da manhã. Foi então que percebeu que a claridade não vinha dos faróis de carro algum. Nem vinha dos prédios ao redor. Estava clara a noite da Praia de Iracema. Estranhamente clara.

Desumanamente clara, diria o outro.

.

Ricardo Kelmer 1994 – blogdokelmer.com

.

.

TRILHA SONORA DESTA HISTÓRIA

Flor púrpura (Ricardo Kelmer e Joaquim Ernesto) – Um tango para cortar os pulsos da angústia

Beira-mar (Ednardo) – E um gosto de você que foi ficando… e a noite enfim findando… igual a todas as demais

Riders on the storm (The Doors) – Pegue uma carona na tempestade desse som

Quanto você paga (Ricardo Kelmer e Toinho Martan) – Você me olha desse jeito… Pensa que eu não sei que você quer me comprar?

Little girl blue (R. Rodgers e L. Hart) – Querida, você não vê que está na hora?

Lupiscínica (Augusto Pontes e Petrúcio Maia) – Bolerão maravilhoso, na inesquecível interpretação de Teti e Ednardo

The end (The Doors) – É o fim, meu belo amigo. O fim das doces mentiras… das noites em que tentamos morrer…

.

GuiaDeSobrevivenciaCAPA-1bEste conto integra o livro
Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos

O que fazer quando de repente o inexplicável invade nossa realidade e velhas verdades se tornam inúteis? Para onde ir quando o mundo acaba? Nos nove contos que formam este livro, onde o mistério e o sobrenatural estão sempre presentes, as pessoas são surpreendidas por acontecimentos que abalam sua compreensão da realidade e de si mesmas e deflagram crises tão intensas que viram uma questão de sobrevivência. Um livro sobre apocalipses coletivos e pessoais. > Mais

.

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS

.
01- Massa. Jose Leite Netto, Fortaleza-CE – mai2015

02- Muito bom,li só o trecho mas já gostei . Vou ler tudo qndo meu computador sarar. Samuel Araujo, Vilhena-RO – mai2015

03- Eita! crimes passionais sempre são comoventes, afinal são motivados (na maioria das vezes) pelo amor que adoeceu… E como há amores doentes perambulando pelas curvas da nossa velha Iracema! Valeu pela indicação de leitura amigo! Lílian Martins, Fortaleza-CE – mai2015


O íncubo

15/11/2008

15nov2008

Íncubos eram demônios que invadiam o sono das mulheres para copular com elas. Mas… e se ainda existirem?

OIncubo-05

O ÍNCUBO

.
Ele virá como num sonho, mas será real. Porque habita a realidade mais profunda ‒ e inadmissível, não esqueça ‒ dos seus desejos. Chegará devagar e sem alarde. E deixará os sapatos à entrada para poder pisar delicadamente o seu chão e sentir, desde o início, todos os detalhes de sua presença. Ele, o meticuloso.

Haverá uma roupa no sofá da sala, você anda meio desleixada? Quem será o moço no porta-retrato, seu namorado? Que diria se acaso soubesse que ele esteve em seu apartamento a essa hora da noite? A porta de seu quarto estará trancada, evidentemente, mas ele já sabe que você anseia por essa visita. E é exatamente por isso que poderá vir e entrar. Se esse encontro não existisse antes em seu pensamento, minha querida, ele não passaria jamais por essa porta, aberta ou fechada.

Ele entrará em seu quarto enquanto acostuma os olhos à penumbra do ambiente, os olhos que a encontrarão em sua cama, dormindo tranquila, os lábios roçando o travesseiro e o cabelo escorrendo pelas curvas do seu rosto suave. Então, ele se permitirá profanar a harmonia do quadro e afastará para o lado uma mecha de cabelo que insiste em querer seus lábios. Ele, o profano.

Não, de forma alguma ele se sentirá culpado por invadir assim sua intimidade mais secreta, logo você, tão cheia de recatos. Porque foi você quem quis assim, embora jamais o revele, nem a si mesma. É essa a lógica: você tem de chamá-lo para que ele possa vir. Ele estará, portanto, somente realizando um velho desejo seu. Aliás, ele gostaria imensamente de estar presente quando, pela manhã, você sonolenta a lavar o rosto, viesse a primeira lembrança do sonho que teve, tão estranho, tão louco… Mas tão real, não? Ah, ele adoraria vê-la, você estancando subitamente, em pé ao espelho, os olhos na expressão de quem lembra, o gesto suspenso na vã tentativa de congelar o resto de lembrança que vai fugindo, fugindo… E a cara de incredulidade e espanto. Mas não, ele não poderá estar presente, seus poderes não resistem longe dos sonhos.

OIncubo-06

Ele puxará a ponta do lençol, descobrindo seu ombro magro. Mais um pouco e os seios surgirão aos seus olhos agradecidos, descansando suaves e alheios no ritmo sereno de sua respiração. Ele não resistirá e deixará escapar um sorriso… Nesse momento já não poderá evitar deter-se um pouco e comparar a imagem que tem à mulher que conhece, tão pudica. Se você pudesse despertar agora, certamente teria um de seus repentes de indignação e bradaria que ele está violando sua intimidade e que não tem o direito. Mas nesse sonho, minha querida, não há lugar para violências. E, além do mais, não foi você quem o chamou? E quem melhor que ele, o que capta o que se esconde, para entender a beleza tímida dos seus seios?

Então, de repente, para total surpresa dele… você se moverá, virando o corpo e privando-o da visão de seus seios. Ele confessará, do alto de suas vivências no assunto, que, tsc-tsc, por essa não esperava. Então, sussurrará ao seu ouvido, sorrindo uma revolta bem-humorada, que certos pudores não têm jeito, não adormecem nunca…

Em sinal de protesto, ele retirará, de uma vez, o lençol que ainda cobre o restante de seu corpo. E terá outra surpresa o nosso amigo. Duas, para ser exato. Quem, em algum tempo, poderia imaginar, inclusive ele, que aquele autêntico recato ambulante dormisse nua, inteira e despojadamente nua? E, mais curioso ainda, que fosse tão desejável sem vestes?! Ninguém, certamente, você sempre fez questão de se ocultar demais. E ele muito menos, ele que há algum tempo flagra a ânsia dessa aventura por trás das couraças de sua defesa.

Retirado o lençol, o profano se afastará da cama e se posicionará melhor para observar, pintor orgulhoso do novo quadro. Você nua e sem defesa. Entregue aos olhos de um homem como jamais imaginou que pudesse. A pele brilhando na penumbra. O corpo inteiramente nu, convidativamente disposto sobre a cama, finalmente autorizado, nihil obstat. Ah, como ele se deliciará ao vê-la aprisionada em sua própria nudez…

E ele percorrerá com os olhos comovidos as paisagens de seu corpo, montes e planícies, savanas e cavernas. Gozará enternecido todas as minúcias de sua pele e procurará novos ângulos para sua beleza inconsciente ‒ e finalmente despudorada. Um fino e cruel ladrão de intimidades, desumano e desrespeitador. Ora, convenhamos, ele dirá, um pouco de perversidade não faz mal a mulher nenhuma! Principalmente a você que sequer admite durante o dia o que se permite em sonhos…

Então, ele perceberá, desconfiado, a sua respiração mais intensa, o ritmo acelerado. Aproximará o rosto do seu, já antevendo a nova surpresa, e, por fim, constatará sua excitação. Ora, ora, ele exclamará sorrindo, então o sonho já começou… E, enquanto se despe ao lado da cama, observará seus movimentos angustiados e impacientes, como se buscasse alguém ausente.

Ele comparecerá a esse encontro porque você o quer, vamos deixar isso bem claro, mas também porque anda curioso por saber o que existe por trás de toda essa sua aparente frieza e indiferença. Aparente, sim, ele sempre soube disso, pois mesmo nas mulheres, bichos ardilosos que sempre foram, o olhar nem sempre acompanha a velocidade da mentira ‒ ou da habilidade, como queira. E foi o olhar, minha querida, foi exatamente esse pequeno detalhe que naquele dia a denunciou, a você e suas tão bem cuidadas aparências. Foi apenas um encontro instantâneo de olhares, tudo muito rápido, é verdade, somente um desejo que por um segundo escapou sorrateiro de sua vontade e que, ao perceber o olhar dele, voltou logo a ser desdém. Ah, mas já era tarde. Ele agora sabia de tudo.

Jogada a roupa a um canto, ele deitará ao seu lado na cama, já chega de perversidade. Sentirá então o calor receptivo e o aroma delicado de sua pele. Você jogará ao chão velhos escrúpulos, que por lá ficarão enquanto ele não se for, e decerto que se espantarão ante toda sua disposição revelada. Seus olhos estarão sempre fechados, mas verão tudo em seu sonho. Só não verão os olhos dele, o que fará mais difusa ainda sua recordação.

Enquanto sua boca o procura e seus braços exigem com avidez o corpo dele, ele sorrirá dessa sua insuspeitada ardência. E finalmente fechará os olhos, deslizando para dentro do seu sonho. E só retornará quando novamente abri-los.

OIncubo-06No outro dia, você lembrará de quase tudo, mas sua lembrança será como névoa que aos poucos se dissipará, terminando por se transformar na sensação de já ter vivido algo assim em algum dia, algum lugar…

Mas como, se tudo foi apenas um sonho?, você se perguntará, sempre surpresa com a qualidade das lembranças que a farão sorrir pelos cantos do dia, subitamente envergonhada. O que foi? ‒ a amiga indagará, desconfiada, e você disfarçará, procurando qualquer coisa para se ocupar e fugir do flagrante. Mas nem sempre conseguirá conter o sorriso que, fora do seu controle, denunciará a si mesma uma descarada satisfação.

Você pensará nele, sim, e por pouco não se renderá ao desejo, várias e vacilantes vezes ao lado do telefone. Sussurrará na rua, sem querer, o nome do maldito, mas ao mesmo tempo evitará encontrá-lo, pois se sentiria nua nesse encontro. E toda vez que se recordar dessa noite, perceberá um vento gelado lhe roçar os pelos e trazer arrepios. Ventos do outro mundo? Lera certa vez alguma coisa sobre demônios que invadem o sono das mulheres para copular com elas, lendas medievais. A história não lhe saíra da cabeça.

Demônios… Não sabia que pudessem ser tão competentes, você pensará, permitindo-se afinal brincar um pouco. Muito competentes…

Mas não, não ‒ você sacudirá a cabeça, abandonando tal absurdo, e voltará aos afazeres. Entrar no sonho dos outros, imagina, seria o fim do mundo…

Mas… e se fosse possível? E se realmente eles pudessem…

Não, não, foi tudo um sonho ‒ você repetirá mais uma vez, lutando contra a vontade que arde de vê-lo novamente. Foi apenas um sonho louco e alguma coincidência. E, além do mais, há muito que essas coisas não existem.

.
Ricardo Kelmer 1991 – blogdokelmer.com

.

Este conto integra os livros
Vocês Terráqueas
Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos
Indecências para o Fim de Tarde

.

VÍDEO
The Doors – The spy. Com imagens de Milo Manara
Criei este vídeo para ilustrar o conto “O íncubo”, e homenageando uma banda e um artista que adoro

.

.

Este conto integra o livro
Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos

O que fazer quando de repente o inexplicável invade nossa realidade e velhas verdades se tornam inúteis? Para onde ir quando o mundo acaba? Nos nove contos que formam este livro, onde o mistério e o sobrenatural estão sempre presentes, as pessoas são surpreendidas por acontecimentos que abalam sua compreensão da realidade e de si mesmas e deflagram crises tão intensas que viram uma questão de sobrevivência. Um livro sobre apocalipses coletivos e pessoais.

.

.

MAIS SOBRE SEXUALIDADE FEMININA

AsFogueirasDeBeltane-03aAs fogueiras de Beltane – A sexualidade sem culpa de uma sacerdotisa pagã

A noiva lésbica de Cristo – Se hoje a sexualidade feminina ainda apavora a mentalidade cristã, no século 17 ela era algo absolutamente demoníaco

Lolita, Lolita – Ela é uma garotinha encantadora. E eu poderia ser seu pai. Mas não sou

A gota dágua – A tarde chuvosa e a força urgente do desejo. Ela deveria resistir, mas…

A torta de chocolate – Sexo e chocolate. Para muita gente as duas coisas têm tudo a ver. Para Celina era bem mais que isso…

Desculpem o atraso – Um miniconto sobre BDSM e feminismo

Prazer proibido – Um miniconto sobre mães e filhas

.

SÉRIES ERÓTICAS DESTE BLOG

As aventuras de Diametral e Ninfa Jessi – A mais bela e safada história de amor jamais contada

As taras de Lara – Desde pequena que Lara só pensa naquilo. E ai do homem que não a satisfaz

Um ano na seca – O que pode acontecer a um homem após doze meses sem sexo?

O último homem do mundo – O sonho de Agenor é que todas as mulheres do mundo o desejem. Para isso ele está disposto a fazer um pacto com o diabo. Mas há um velho ditado que diz: cuidado com o que deseja, pois você pode conseguir…

.

.

Seja Leitor Vip e ganhe:

– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)

.

.

Comentarios01COMENTÁRIOS
.

01- Eu já lí esse texto no jornal…muito louco..muito bom mesmo gostei, parabéns! Paulo César Cândido, Fortaleza-CE – abr2007

02- Mais outra crônica soberba!!! Humberto de Melo Batista, Fortaleza-CE – abr2007

03- SURPREENDENTE! Sou sua fã! E se fã é sinônimo de fanática…também sou! ;^) Grande beijo! Danila Gomes, Fortaleza-CE – abr2007

04- Oi, Ricardo ! Tuas crônicas são pra lá de inusitadas.E é isso que faz a grande diferença.Cada tema ! kkkk gosto demais do teu estilo de satirizar. Estou repassando para os meus contatos, Um grahde abraço ! Zinah Alexandrino, Fortaleza-CE – abr2007

05acabei de ler o teu íncubo, fiquei impressionada, você realmente conhece o feminino, o mais escondido do feminino, neste conto você escreveu sobre algo que me acompanha desde a infância. IK, São Paulo-SP – fev2011

06- ‎”Você dormirá tranquila, os lábios roçando o travesseiro e os cabelos escorrendo pelas curvas do seu rosto suave. Então ele se permitirá profanar a harmonia do quadro e afastará para o lado uma mecha de cabelo que insiste em querer seus lábios.” Que malvadeza! 😀 Muito bom, Ricardo!!! Thanks! Cristiane Rocha, São Paulo-SP – abr2011

07- Tradução do trecho que você citou, Cristiane: “Você capotará na cama depois do vuco-vuco, mordendo a fronha e toda desgrenhada, com o cabelo por cima da cara de exausta. O caba, enxerido, não satisfeito em aperrear teu cansaço, ainda vai te perturbar por mais, começando a tirar os cabelos enfiados na tua boca.” Lincoln Silveira, Fortaleza-CE – abr2011

08- Esse sempre mexe um pouco comigo, a 1ª fez que li parecia mais um Dejavú do que simplesmente mais um conto. E mais, eu só durmo sem calcinha, acho que isso facilita um pouco a vida do íncubo hehe. Dolores Agnes, Fortaleza-CE – dez2012

09- Adoro esse conto do Íncubo, por que mistura mistérios e desejos ocultos das mulheres… A escrita do Kelmer é maravilhosa, adoro seu jeito de escrever totalmente descontraído e divertido! Ana Jess Sousa, Fortaleza-CE – fev2013

10- Uaaaaau! O conto ficou ainda mais delicioso ao som de The Spy! Belas ilustrações! Renata Kelly, Fortaleza-CE – jun2014

11- Muito bom aliás adoro todos teus contos…acho que já recebi a tal visita deste íncubo…rsrsrs (detalhe não tão púdica, rsrsrs) !!!!! Brincadeiras a parte…parabéns pelo blog também!!! Leide de Assis, Belém-PA – jun2017

OIncubo-06