12nov2013
MANIFESTO DAS BEM-AVENTURANÇAS
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Are you a lucky little lady in the city of light?
Or just another lost angel?…
City of night.
(The Doors)
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Bem-aventurada a noite
e todos os seus embalos e alcovas
Todos os bares
sobretudo os malditos e mais ainda os de balcão
As danceterias esfumaçadas
de disputadíssimo metro quadrado
onde brilham DJs de gosto discutível
e os dançarinos de ocasião
Os neons coloridos dos cruzamentos cosmopolitas
Os motéis e suas filas de espera
constrangedoras e nem sempre contidas
Os cabarés de periferia
com suas adoráveis máquinas de música
e a luz lilás do ambiente, tão indefectível
As esquinas lascivamente habitadas de pernas à mostra
e olhares convidativos
Os inferninhos regados a uísque e cocaína
dos ricos apartamentos da orla costeira
E os incansáveis concursos gay
que sobrevivem quase clandestinos e sem glamour
para os sonhos de cinderela de tantas bonecas borralheiras
Bem-aventurado o bolero
ritmo sagrado de todas as penumbras
e das melhores dores-de-cotovelo
Bem-aventurados os que uma vez na vida
sucumbiram a uma paixão sem zelo e sem par
rodopiando lentamente de rosto colado
e a voz rouca de Elis contando falseado
de um bandeide no calcanhar…
Bem-aventuradas todas as festas
mesmo as de 15 anos e outras mais comedidas
porque festa é o que nos resta
Infinitamente mais bem-aventuradas porém
aquelas festas louquíssimas
onde exigem fantasia
os convidados são selecionados
a bebida não falta
o som não deixa ninguém parado
a fila para o banheiro é uma das atrações
há um segundo andar na casa
fertilizando travessas imaginações
o vizinho apareceu para reclamar e acabou ficando
tá todo mundo superafins
(solteiros, solteiríssimos, casados e os nem tão casados assim)
estão presentes pelo menos uma dúzia de vivas lendas
do primeiro escalão de sua agenda
e no outro dia você acorda atordoado num quarto que não é o seu
não lembra que horas saiu da festa e muito menos
o que naquela cama aconteceu…
mas toda apreensão se evapora
quando surge
à porta do quarto
insinuante e bem-humorado
aquele anjo maravilhoso do seu sonho
lhe dando bom-dia
e empunhando uma cerveja estupidamente bem-vinda
porque hoje é sábado afinal
e você não tem compromisso
e além disso seu anjo maravilhoso continua bem disposto
e maravilhosamente irreal
Bem-aventurados os garçons e garçonetes
em seu glorioso e incompreendido ofício
Os cantores e músicos da noite
que nunca perderão a velha esperança de ver a vida
lhes reconhecer os méritos finalmente
méritos diariamente abafados pelas conversas nas mesas
e pelo barulho da churrasqueira bem ao lado
ou ainda pelos aplausos longos e entusiasmados
a músicas que nunca são as suas…
Os esforçados transformistas de boate de terceira
As dançarinas de strip-tease
e os atores e atrizes de sexo explícito
já cansados de explicar
que é um trabalho como outro qualquer
As lindas e promissoras modelos
de rosto e corpo cultivados
que os emprestam a ricos executivos
por um jantar naquele restaurante badaladíssimo
e depois um bom vinho num 5 estrelas reservado
E as menininhas que encurtam ao máximo suas saias
e sua adolescência
para os caprichos fartos de estrangeiros deslumbrados
Bem-aventuradas todas as prostitutas
sobretudo as pobres
saco de pancada das sociedades hipócritas de todos os tempos
Bem-aventuradas por todos os séculos e séculos
elas que são do mundo lixo, vício e benefício
elas que (ao lado dos palhaços) terão sempre
o mais puro dos ofícios
Bem-aventurados os garotos e garotas de programa
versões mais destiladas da eterna profissão
termos mais requintados pra mesmíssima coisa
curso inevitável da democratização sexual
Bem-aventurada a não mais exclusividade do aluguel do prazer
aos prostíbulos e praças mal afamadas
que bom vê-lo com outras roupas!
que bom sabê-lo em outras camadas!
Bem-aventurado, por extensão, o telefone
que os solicita e as solicita com discrição
Bem-aventurados mais ainda os travestis
Bombástica personificação do inconformismo à ditadura genética!
Exótica e sensual indignação da alma ao legado do corpo imposto!
Seres tão cruéis à nossa vã necessidade de tudo explicar
Eles que são elas
e que desafiam e abordam insolentes nas esquinas
o pudor do mundo
e envergonham a sagrada decência da família
e instigam curiosidade e luxúria
com seus corpos inadmissivelmente belos
tão androginamente profanos
Eles que são elas
anjos noturnos do apocalipse sexual urbano
prisma expiatório de sentimentos vários
o mais puro amor
o ódio mais sanguinário
Eles que são elas
própria contradição do sexo
e sua mais alta idolatria
Buscada redenção do pecado original: Adão e Eva num só
Para lembrar que um sempre se descobrirá no outro
que é o que sabemos quando amamos
Para lembrar que do homem nasceu a mulher
e se um está no outro
é porque ambos estão em você
mesmo se não quiser
Bem-aventurados enfim
todos vós que atentais contra a moral e os bons costumes
Vós que dais de comer à obscenidade e à alegria
Vós que instigais a carícia e a polícia
e que emprestais ao profano vossa poesia
Vós que sacudis a pasmaceira dos tempos
e assaltais a mesmice
e violentais a pudicícia
e fazeis sangrar a pestilenta carne da demagogia
Deus vos proteja
e vos guarde (sempre à noite) um lugar
e um altar
em sua incompreensível sabedoria
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Ricardo Kelmer 1993 – blogdokelmer.com
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SOBRE ESTE POEMA – Nos shows da Intocáveis Putz Band (Fortaleza-CE), em 1994, quando eu ainda integrava a banda, usávamos este poema num dos números, vestidos como monges medievais. Enquanto a banda fazia um instrumental psicodélico e de intensidade crescente, eu recitava trechos do poema, pregando para a plateia, num clima denso e sombrio. Era o momento sacro-profano do show. As reações do público eram curiosas: algumas pessoas se assustavam, outras se identificavam bastante e havia até quem chorasse emocionado. O Manifesto das Bem-Aventuranças não foi gravado no único disco que a banda lançou, em 1999.
> A celebração da putchéuris – A história fuleragem da Intocáveis Putz Band
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Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)
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01- Uma hora de palmas e em pé ainda não seria o bastante…..simplesmente genial. Fabiano Brilhante, Fortaleza-CE – nov2013
02- Quanta blasfêmia… Sei que você é um poeta, e que vê beleza e arte na vida boêmica, mas não use o nome de Deus em vão, para que não te sobrevenha nenhuma maldicão “Não vos enganeis, de Deus não se zomba, pois tudo o que o homem semear, isto também ceifará”. (Gálatas 6:7). Clara Haugland, Fortaleza-CE – nov2013
03- sae satanas……. evem pra igrja punk do f.d.s…. capeta…… Bispo Xines, São Paulo-SP – nov2013
04- Clara, não discuta.O Kelmer só deseja provocar, chamar a atenção… É nisso que se transformou o ato de pensar, isso não nos deve surpreender. Somente sendo idiota se faz uma provocação como essa. Deus já disse que o Reino dos Céus é para todos, todos aqueles que o quiserem, e só quererão os que se arrependerem, os que estão cansados, dispostos à buscar sabedoria. Kelmer está por aí fazendo literatura sem fazer literatura, pensando sem pensar muito bem ou muito demoradamente. O que sei é que um testemunho como este em nada altera, em nada influência… Chega! Já demos audiência demais. Max Honorato, Nilópolis-RJ – nov2013
05- que as diferenças sejam respeitadas e a diversidade de pensamentos livre!!! evoé. Marina Caires, São Paulo-SP – nov2013.