07jul2009
Os filhos sempre pagam caro pelos pais que não se realizam em suas vidas
CARMA DE MÃE PARA FILHA
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“Quanto menos os pais aceitem seus próprios problemas, tanto mais os filhos sofrerão pela vida não vivida de seus pais e tanto mais serão forçados a realizar tudo quanto os pais reprimiram no inconsciente.”
Foi o sábio Carl Gustav Jung (1875-1961), sempre ligado nas sutilezas dos processos psicológicos, quem afirmou isso aí. Em outras palavras, o psiquiatra-pensador suíço quis dizer que os filhos sempre pagam caro pelos pais que não se realizam em suas vidas.
Lembrei disso ao assistir a comédia romântica Mamãe Quer que Eu Case (Because I Said So, EUA 2007, direção Michael Lehmann). A história é sobre uma garota desajeitada (Mandy Moore) que sofre um bocado pela mania da mãe (Diane Keaton) de querer controlar sua vida, principalmente na questão dos relacionamentos amorosos. A mãe, no passado, havia errado em suas escolhas e tinha medo que a filha seguisse pelo mesmo caminho.
Meu lado mulherzinha até que riu com aquelas besteiras que somente o universo feminino, com suas deliciosas neuras, pode proporcionar. O tema da história é bom, mas os personagens não me convenceram, e o roteiro tem obviedades demais, dessas que te fazem sacar o final já no começo do filme. E a personagem da mãe exagera nos faniquitos, ficou caricato.
Mas pelo menos o filme me inspirou a falar de Jung, esse notável médico de almas. Essa coisa dos pais não viverem suas vidas verdadeiras e isso influenciar no comportamento dos filhos é algo muitíssimo sério, mas que infelizmente não costuma ser levado em consideração nas análises que fazemos sobre a vida. O que Jung quer mesmo é nos alertar, a nós todos, para a extrema importância que tem a realização pessoal, não apenas para as nossas vidas individuais como também para a vida de todos os que estão próximos a nós.
Em sua compreensão abrangente da vida humana, Jung logo percebeu que estamos todos inapelavelmente ligados uns aos outros, que nossas mentes estão interconectadas através do inconsciente e, por isso, tudo o que fazemos reverbera nos outros, como espelhos que se refletem e a todo instante acusam, em si próprios, os movimentos dos outros espelhos. Se os pais não resolvem seus conflitos internos, estes não apenas afetarão a relação familiar como poderão influenciar negativamente a vida individual de seus filhos. Se os pais vivem falsamente suas vidas, o peso dessa mentira sufocará seus filhos, que poderão se sentir pressionados, sem perceber, a viver o que seus pais não realizaram em vez de seguir seu próprio caminho de autorrealização. Às vezes, é possível desfazer essas falsas expectativas, mas isso é um processo que requer alto grau de conscientização das partes envolvidas, que inclui o perdoar e também o perdoar-se – e ainda assim se terá perdido um tempo precioso, que jamais será recuperado.
Vendo a coisa desse modo, torna-se óbvia a necessidade de vivermos bem nossas vidas, não apenas por interesse próprio, mas porque a nossa bem-aventurança, de algum modo, também tocará a nossos amigos e familiares. Foram vários os sábios da história que insistiram nessa curiosa verdade: para mudar o mundo, mude a si próprio. Jung, falando sobre o processo de individuação, disse o mesmo, afirmando que o futuro da Humanidade depende da quantidade de pessoas que conseguirem se autorrealizar.
Entretanto, não existe autorrealização sem autoconhecimento. Como realizaremos o nosso potencial sem antes sabermos verdadeiramente quem somos, o que de fato precisamos e queremos, o que realmente nos atrapalha a caminhada? Como nos libertarmos sem saber o que nos aprisiona? É libertando-se que podemos também libertar os outros das nossas expectativas limitantes em relação a eles.
Conhecermo-nos, sem autoenganações, e vivermos nossa melhor vida – é o que temos de fazer. E um dia nossos filhos e netos nos agradecerão bastante por isso.
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Ricardo Kelmer 2009 – blogdokelmer.com
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Carl Gustav Jung (26.07.1875 – 06.06.1961)
Psiquiatra e pensador suíço. Fundador da psicologia analítica, também conhecida como psicologia junguiana. Jung, assim como Joseph Campbell (1904-1987), ajudou a reacender o interesse sobre a mitologia, situando os mitos como elementos essenciais na busca do indivíduo por sua essência e completude
Jung – a jornada do autodescobrimento – Vídeo com um resumo da vida e das ideias de Carl Jung, o psicólogo e pensador suíço criador da teoria do inconsciente coletivo
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01- Ricardo querido: sábias palavras. Friso esta frase aqui, que resume tudo: Como nos libertarmos sem saber o que nos aprisiona? Esta é, de fato, a grande questão. Passarei esta deliciosa crônica adiante. Um abraço meu! Jana Lauxen, Passo Fundo-RS – nov2009
02- Querido Rico, Sempre aprecio a simplicidade com que consegue falar de assuntos complexos – simples mas nunca superficial – os laços invisíveis que nos ligam com nossos ancestrais (pais, avós, tios etc) em grande parte nos determinam; o tal autoconhecimento fruto, ou não, de uma boa terapia sem dúvidas nos ajuda a desistir de pagar “contas” ou pagar conscientemente e por escolha, débitos que na verdade não contraímos…. Parabéns! bjs. Danielle Alves, Fortaleza-CE – nov2009
03- Karaca Ricardo, cada vez me surpreendo mais com vc. Vc é o homem ideal. Vc pensa muiiiiiiiiiiiito legal, e escreve muito legal as coisas que pensa. Marcia Alves, Belo Horizonte-MG – nov2009
04- Li agora “Carma de mãe pra filha”….Vou assistir ao filme… Você realmente mexeu na questão…..e vejo o quanto é sério e importante esse debate.!! Acho que todos nós sem exceção….teve esse impacto na educação e atualmente esse reflexo é visível, já que antigamente era mais velado…não tão aparente. O que difere éque tudo está na nossa frente e não fazemos muito pra mudar isso. Pergunto: se mesmo nos autoconhecendo….o que fazemos depois disso? prá onde iremos e qual alternativas temos? A resposta está lá frente…no futuro…. Mas hoje o que fazer pra mexer nesse universo e provocar essa mudança principalmente na família.? Inêz Dias, Campinas-SP – nov2009
05- Tenho que te parabenizar, Ricardo! Além de escritor, vc se torna intermediador de temas como esses, que algumas vezes acabam ficando um tanto complexo para nós, simples curiosas e curiosos sobre o comportamento humano, e nos facilita a compreensão. Vc une qualidade e simplicidade e fica ótimo te ler! A coisa flui… adoro! Sua maneira de se comunicar é muito ímpar e boa demais! Estou lendo -Mulheres que correm com os lobos- e… putz! Estou fascinada!! Infinitamente enriquecedor… Toda mulher deveria ler! Foi referência sua. Obrigadíssima pela dica! E quando acabar Clarissa, estarei mergulhando no universo Junguiano. Já estava com essa idéia e depois de ter lido a crônica, mais ainda! Obrigada por me enviar! Bjs. Karine Rangel, Rio de Janeiro-RJ – nov2009
06- Muito bendito…muito bem dito, Ric!!!! Gosto muito quando fala do querido Carl! Beijos sortidos!!!! Chris Godoy, São Paulo-SP – nov2009
07- Olha Kelmer, vc é demais mesmo, apesar de não ter filhos, na teoria és 1000. Verdade, às vezes precisamos repensar nas atitudes, nas nossas relações como um todo. bjão. Gizela Symanski, Porto Alegre-RS – nov2009
08- Adorei, Rica ! Estou entendendo e entrando cada vez mais à fundo nessa compreensão e querendo me libertar das crenças ancestrais e da história de meus pais. Isabela Pinto, Fortaleza-CE – nov2009
09- Amei!!! Concordo plenamente… Beijos e Parabéns!!!! Cynthia Silveira, São Paulo-SP– nov2009
10- Adorei!!! Beijos de luz! Sandra Neves, Belo Horizonte-MG – nov2009
11- “Os pais fazem dos filhos, involuntariamente, algo semelhante a eles – a isso denominam ‘educação’ -; nenhuma mãe duvida, no fundo do coração, que ao ter seu filho pariu uma propriedade; nenhum pai discute o direito de submeter o filho aos seus conceitos e valorações.” Assim dizia Nietzsche … Márcia Costa, São Paulo-SP – nov2009
12- Adorei!!!!! Repassei para várias pessoas. Gosto muito do jeito que você enxerga as coisas. Seu jeito de escrever… amei ler…to começando a semana a milhão com está frase na minha cabeça pra mudar o mundo, mude a si mesmo. Jung. Jamile Abdallah, São Paulo-SP – nov2009
13- Oi Ricardo, adorei seu texto, primeiro pq é um tema que me fascina (escrevi um artigo sobre isso na conclusão de uma especialização sobre “Abordagem sistêmica”, acho até que usei essa mesma citação do sábio Jung), segundo pq gosto muito do seu jeito de escrever e terceiro pq vc sintetizou bem um pensamento central da teoria junguiana. Muito legal… Vou enviar o tento pra amigos e entregar uma cópia pra alguns pacientes. Obrigada. Abraço e continue nos presenteando com boas construções. Raquel Brasil, Fortaleza-CE – nov2009
14- Muito boa a reflexão..adorei! Tatá Guida, Rio das Ostras-RJ – ago2013
15- É isso aí… “torna-se óbvia a necessidade de vivermos bem nossas vidas, não apenas por interesse próprio mas porque a nossa bem-aventurança, de algum modo, também tocará nossos amigos e familiares.” Sem essa de jogar a culpa nos pais, no governo, nos astros, no aquecimento solar…. Maria Emília Lino Silva, Paraty-RJ – ago2013
16- Gostei Ricardo,Bjo! Dijé Sales, Fortaleza-CE – ago2013
17- Geralmente as mães fazem isso, falam dos seus dissabores como uma alerta. Erros são inevitáveis. Há erros que são acertos e vice versa. Jully Fernandes, Juazeiro do Norte-CE – set2013
18- Gostei, meu amado!!! Jung é DELIOSO, assim como você! Tadinhos dos meus filhos…eles devem viver com aquela ladaínha do Zeca Pagodinho na cabeça: “É preciso muito amor para suportar essa mulher…” Ana Erika Oliveira Galvao, Fortaleza-CE – set2013
19- Jung e Ricardo Kelmer: mistura irresistível. Adoro! Paula Izabela, Juazeiro do Norte-CE – set2013
20- Muito boa eu já tinha lido antes, sensacional! Adriana Rocha, Mogi das Cruzes-SP – set2013
21- Muito boa eu não tinha lido antes, sensacional! Zilda Barradas, Cuiabá-MT – set2013
Curioso,no processo de minha separação,meu filho mais velho,na epoca com 15 anos,nos reuniu e disse: Vcs são as duas melhores pessoas que conheço,mas na teimosia de manter algo que ja acabou estão ficando amargas,precisamos que estejam felizes,independente de separados ou não.
Neste dia vi que havia criado um cara incrivel e que só podemos fazer alguem feliz qdo estamos felizes e realizados. hoje eles são crescidos e a cada momento feliz nosso comemoramos juntos.
adorei ler isso e ter estado aqui
Denise
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> Parabéns aos filhos da Denise, pela mãe que eles têm.
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Tenho que lembrar disso-tenho que lembrar disso- tenho que lembrar disso- tenho que lembrar disso- tenho que lembrar disso…Porque eu tb acho que é isso aí e por aí. Beijo
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> Ahahahah! Escreve e põe na porta da geladeira, Lia.
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oi Ricardo, ótimo texto, fala coisas simples e sábias que deviam ensinar pra todos antes de serem pais/mães, assim teríamos menos pessoas neuróticas no mundo. Coisa que eu vivi na pele e tive q me rebelar pra ser feliz, coisa e disse pra minha filha “pare de tentar me agradar e vá pro mundo, pra agradar a vc mesma, faça coisas que te fazem feliz, ninguém poderá te fazer feliz além de vc mesma”, sábio Jung ! Saudações poéticas, Adri
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> Poidscrer, Adriana. Ser feliz é também um ato de amor ao próximo.
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Logo ao abrir o meu e-mail e ter lido este texto seu,lembrei que nesta noite tive um sonho onde você dava aulas e apresentava seus livros.Haviam muitos alunos e seus livros estavam num furgão e dois amigos e uma amiga seus sequestraram o furgão.Fomos tentar resgatar o furgão e eu acabei ficando com os sequestradores para descobrir a verdade.Daí ficou parecendo que eu estava do lado deles.Mas depois você recuperou os livros e construiu um cenário com a Torre Eifel dentro do furgão.Você tinha um filho e uma sobrinha com as mesmas características da sua mãe.
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> Putz… O misterioso caso do sequestro do fogão. Tá parecendo aquelas aventuras do Scubidu. Ainda bem que vc solucionou tudo, obrigado!
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Estimado Kelmer
Mais uma vez parabenizo-o pelo texto. Danielle, de Fortaleza, está coberta de razão: vc aborda assuntos complexos da maneira mais sucinta e simples que se possa imaginar. Vc é um grande comunicador.
Diga-me uma coisa: você não incluiu QUEM APAGOU A LUZ? no site. Esse livro é simplesmente FANTÁSTICO! Tenho-o guardado com muito carinho pois sei que vc não o editou mais. Nem digo para ninguém que o tenho para que não mo peçam emprestado. Não me sinto confortável em emprestar alguma coisa e fazer uma série de recomendações.
Muito sucesso é o que lhe desejo.
Abraço cordial da MARILIA.
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> Ah, Marília, a simplicidade… O Taoísmo me ensinou que ela é a última das estações. Assim sendo, posso estar no caminho, mas ainda não cheguei lá. E sobre o “Quem apagou a luz?”, não pretendo reeditá-lo mas em breve publicarei uma série chamada O Guru Sem Futuro, em que conto, em capítulos, a história desse livro e muitas histórias divertidas sobre essa fase de minha vida. Tomara que você goste também!
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Muito bom o texto meu irmão, era o que eu estava procurando ler hoje. Obrigado, um abraço.
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> Quem procura, encontra. 🙂
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