18mai2010
.
Este conto integra o livro Baseado Nisso – Liberando o bom humor da maconha, de Ricardo Kelmer
.
O DIA EM QUE PAPAI E MAMÃE
FICARAM MUITO DOIDOS
Juninho está preocupado. Seus pais decidiram experimentar um baseado para saber o que o filho via de tão bom nisso
.
– Juninho, eu e sua mãe decidimos fumar um baseado com você.
O menino ficou olhando para os pais, sem acreditar no que escutava. Depois de tantos anos insistindo em conselhos, castigos e orações, seu pai e sua mãe resolveram experimentar para saber o que afinal o filho tanto via num cigarro de maconha. O importante era a união da família.
Juninho ficou tão surpreso, atordoado mesmo, que quando deu-se conta já havia entregue o baseado e seus pais estavam sentados em sua cama, fumando e tossindo. Juninho recusou-se a fumar também, inventou uma desculpa qualquer. Mas a verdade é que alguém tinha de ficar careta para segurar a onda.
– Não tô sentindo nada – reclamou a mãe.
– Calma, Vanda, demora um pouco – explicou o pai com ar de entendido. – Não é, Juninho?
– Você tá bem, mãe?
– Tô ótima, quer dizer, tô normal. Normalíssima – respondeu a mãe, rindo.
– Eu também – disse o pai. – Aliás, nunca me senti tão normal em toda a minha vida.
– Mãe, qualquer coisa tem leite na geladeira, viu?
– Vanda, há algo errado com minhas orelhas?
– Suas orelhas? – ela olhou curiosa para o marido. – Não, Afonso, por quê?
– Elas estão maiores, não?… – Ele apalpava as orelhas, intrigado.
– É normal, pai. É viagem.
– É normal as orelhas crescerem? – perguntou o pai, indo conferir no espelho do banheiro.
– Pois eu continuo normalíssima – observou a mãe, rindo. – Eu e minhas orelhas.
– Tem gente que não viaja da primeira vez, mãe.
– Vanda!!! Vem aqui correndo!
A mãe correu assustada. Chegou ao banheiro e deu com o marido se observando atentamente ao espelho.
– Eu sempre fui assim, Vanda? Sempre?
– Assim como? – Ela não compreendia. Juninho, atrás dela, muito menos.
– Como você pôde aturar essa barba horrorosa durante todos esses anos? Heim?
– Ué? Você sempre disse que era o seu charme…
– Sei não, acho que eu ficaria melhor sem barba.
– Pai… – Juninho começava a se preocupar.
– Não acredito! – exclamou a mãe, erguendo as mãos. – Minhas preces foram ouvidas!
– Mãe, não deixe… – pediu Juninho, assustado com o rumo das coisas. – Isso é viagem, mãe, é viagem…
– Então não se meta na viagem de seu pai – ralhou a mãe.
– Vanda, faz quantos anos que você não solta seu cabelo? – perguntou o pai de volta do banheiro, retirando de repente a fivela da cabeça da mulher. Ela tentou impedir, mas foi tarde.
– Afonso! Dá aqui, dá!
– Não fica melhor assim, filho? Sempre falei, mas ela nunca escutou.
– Pai, eu acho que… será que… vocês…
– Juninho, você tem algum CD aí pra eu dançar com sua mãe? O que é isso aqui?
– É rap. Acho que vocês não vão gostar muito não…
– Tá vendo, Vanda? Precisamos comprar uns CDs pra nós dois.
– Pai, bota um pouco desse colírio aqui…
– Afonso… – disse a mãe, o tom da voz levemente lânguido, como havia muito tempo ela não experimentava. – A noite está ótima… Bem que a gente podia ir dançar. Inaugurou um barzinho aqui perto…
– Sabe que você teve uma grande ideia?
– Não precisava pingar tanto, pai. Mãe, você tem certeza que…
– Vou tomar logo meu banho. Será que ainda sei dançar?
– E por que a gente não toma banho junto? Economiza água…
– Economiza água… Ahahahah!!! Economiza água… – repetiu a mãe, morrendo de rir.
Naquela noite, eles voltaram para casa às três da manhã. Juninho ainda rolava na cama, preocupado. Não conseguira dormir e muito menos estudar para a prova. Escutou abrirem a porta e experimentou um alívio imenso, que bom que estavam de volta. Os dois entraram se esforçando para não fazer barulho, mas não conseguiram.
– Afonso, você ficou um gato sem a barba…
– Aqui não, Vanda, vai acordar o Juninho…
Juninho virou para o outro lado. Não devia ter permitido, sabia que não devia. E se tivessem realmente gostado? E se ficassem viciados, o que podia acontecer? Seu pai tirara a barba depois de vinte anos, ficou tão estranho, não conseguiu olhar direito para ele. E se chamassem os amigos para fumar, o que eles achariam? E o trabalho deles, não podia prejudicar? E a mãe então, nunca vira a mãe rir tanto, parecia uma… uma louca. E se dessem muita bandeira e a polícia descobrisse, a vergonha que seria… Não podia fazer mal à saúde deles? Não era perigoso fumar e sair por aí?
Juninho puxou o lençol, fechando os olhos, tinha de acordar muito cedo. Bem, talvez fosse só empolgação, ele pensou, primeira vez é assim mesmo, pai e mãe são muitos inexperientes para fumar maconha.
Do corredor, ainda chegavam as vozes, abafadas:
– Afonso, onde será que ele guarda?
.
Ricardo Kelmer 1998 – blogdokelmer.com
.
> Este conto integra o o livro Baseado Nisso
Liberando o bom humor da maconha
> Saiba mais/Adquira o seu exemplar personalizado
.
.
.
.
– Acesso aos Arquivos Secretos
– Descontos, promoções e sorteios exclusivos
Basta enviar e-mail pra rkelmer@gmail.com com seu nome e cidade e dizendo como conheceu o Blog do Kelmer (saiba mais)
.
.
01- Oi Ricardo Cara, eu ri demais “No Dia em que papai e mamãe ficaram muito doidos” hahahaha… isso já valeu o meu domingo. Beijos. Ana Cristina Souto, Fortaleza-CE – jan2006
02- adorooooooooooo muito bom…rs. Magna Mastroianni, São Paulo-SP – abr2011
03- Adorei!!! Aliás, tenho lido vários, e tá difícil não gostar de algum, viu?rsrs. Bjão!! Simone Marini, São Paulo-SP – abr2011
04- Esse Ricardão!!! ahahahah :* Gisela Symanski, Porto Alegre-RS – abr2011
Eu adooorooo esse conto! O li a uns 03 anos atras e mesmo assim, continua o máximo! Muito bom mesmo!
CurtirCurtir
> Então tá feito o convite: em 2013 volta aqui e lê de novo.
CurtirCurtir
Há muitos e muitos anos atrás, li este conto e me encantei com RK.
Muitos e muitos anos depois, meu filho, adolescente, começou a andar em turma, alguns um pouco mais velhos e mais “ligados”, percebi que não demoraria muito para que entrasse em contato com “o baseado”.
Eu e meu marido conversamos a respeito e prevendo o inevitável, melhor que fosse com a gente do que escondido de nós.
Convidamos uma turma de bons e filosóficos amigos para uma noitada em nossa casa e apresentamos o “dito” pra ele. De início não entendeu bem, achou que estávamos pedindo permissão pra ele para que fumássemos com nossa turma (hehehe!), depois experimentou, mas não pegou, e enfim sua cabeça ficou cheia de interrogações: “_ Tá, esta então é a segunda vez de vocês?”; “_Sério, sempre?”; “E quem mais?”…
Foi inevitável nos lembrar do Ricardo Kelmer nesta noite, nos sentimos como os pais do Juninho, hehehe…
A melhor frase saiu no dia seguinte, ao buscá-lo no colégio, entrou no carro e disse: “Eu nunca mais vou ver vocês como antes!” (isso foi um elogio!). Hoje sabemos que foi uma boa decisão, ele não “se perdeu no mundo das drogas” e sempre nos conta o que tá rolando.
CurtirCurtir
> Matemática da boa educação: pais malucos + filho maluco = família sadia
CurtirCurtir