Breg Brothers com fígado acebolado

20mar2010

Encher a cara, curtir dor de cotovelo e brindar a todas as vezes em que fomos cornos…

OsTheBregBrothers1989-01

BREG BROTHERS COM FÍGADO ACEBOLADO

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Em abril de 1989 eu havia fechado meu bar, o Badauê, e decidi formar um conjunto musical, com meus amigos Cadinho e Jabuti. Nasciam Os The Breg Brothers. Objetivo oficial: homenagear a legítima música brega, aquela que ainda resiste em radiolas enferrujadas pelos bares da periferia. Bem, sejamos francos: na verdade tudo era mesmo uma grande raparigagem, mero pretexto pra encher a cara, curtir dor de cotovelo e brindar a todas as vezes em que fomos cornos.

No dia do primeiro show, correndo pra não chegar atrasado, avancei o sinal na Antonio Sales e trombei noutro carro. Cadinho nada sofreu, mas eu cortei a boca. Foi Bia, tiete do fã-clube, quem nos socorreu. Improvisei bigode postiço pra disfarçar o ferimento e fiz o show. Pra você ver o grau de profissionalismo.

Impecáveis, nos apresentávamos em paletós brancos, flor na lapela e cabelo com gomalina. Românticos, jogávamos rosas pra plateia. Cantávamos os três e Jabuti tocava violão, com a banda por trás, no bom sentido. Compúnhamos e interpretávamos sucessos de mestres como Odair José, Genival Santos, Fernando Mendes e os Pholhas. Tudo com bom humor, sim, mas com muitíssimo respeito, por favor. Nossos nomes artísticos: Kelmo Lonner, Johnson Batista e Glaydson Gil. Nos vocais de apoio a beleza e as performances estonteantes de minha irmã Luce Érida e Daniele Ellery, mais conhecidas no mundo artístico das paradas de ônibus como Lucieuda Vai-Mais-Um e Danisléa Camburão. Nós sonhávamos com os programas do Irapuan Lima e da Hebe Camargo.

O Big Bang que originou o universo do movimento humorístico-musical de Fortaleza estava ainda em seus três primeiros segundos. Lailtinho Brega, Rossicléa, Meirinha e Neo Pi Neo eram estrelas em formação. Falcão já era estrela de brilho local, recém-saído da Arquitetura, e em breve brilharia no país inteiro. Os Necessários, do fenomenal Moacir Bedê, também já aprontavam, chegando a fazer no Badauê um show tão lotado que vendemos lugar até nos galhos da mangueira. Nesse cenário surgiram Os The Breg Brothers, com seu elegante brega de cabaré. Chiquérrimo.

Depois de conquistar um valioso 3º lugar no Festival de Música Brega do Pirata (Lailtinho em 1º e Meirinha & Rossicléa em 2º) e realizar o sonho de cantar com nosso ídolo Oswaldo Bezerra, o rei do brega do Pará, recebemos convites pra cantar em clubes e bares. E planejávamos gravar um LP, incluindo composições nossas como Menina do Lacinho Cor de Rosa, Tango do Padeiro e Samba do Bombril. A glória batia à porta, prometendo luzes e camarins. Quando fomos abrir, não era exatamente dona glória, era uma proposta profissional pro Jabuti, irrecusável. E lá se foi nosso genial compositor e guitarrista morar em Teresina. Eu e Johnson Batista ficamos tão arrasados que quatro meses depois, sem forças pra continuar, cancelamos os shows, avisamos o fã-clube e demos baixa no sonho.

Mas valeu. Foram muitas horas no boteco do Genival, que a continuação da avenida Desembargador Moreira, em nome do progresso, passou por cima. Cachaça com fígado acebolado, que delícia. E uns velhos discos arranhados na radiola do Genival. E mais uns patos, imagina, uns patos que andavam pelo quintal, ao lado de nossa mesa, acompanhando com quá-quás nossas inspiradas dores-de-cotovelo.

Um dia, voltávamos de uma farra, eram seis da manhã. Descíamos a Desembargador Moreira com a desavergonhada intenção de abrir o boteco do Genival, ainda não satisfeitos com a bebedeira. Então, eis que acontece aquilo que ficou conhecido no submundo do crime desorganizado como “o dia em que a vida do Cadinho deu uma virada”. Ele foi fazer o retorno em plena ladeira, mas calculou mal a velocidade: o fusca suspendeu as rodas laterais, foi virando, virando e, bufo!, virou. O fusca ficou de lado no asfalto, com Cadinho e Jabuti lá dentro. Eu vinha em meu carro atrás e parei, meio assustado, meio rindo do absurdo. Vi a cabeça de um jabuti saindo com dificuldade pela janela do carro virado. Naqueles dias o Jabuti estava engordando, de forma que entalou na janela e não conseguia sair. Embaixo dele Cadinho o empurrava, já desesperado, pois a gasolina escorria pelo asfalto. Cena inesquecível.

Com muito esforço Jabuti conseguiu passar pela janela, Cadinho saltou fora e desviramos o fusca. Felizmente arranhara pouco. Outros certamente ficariam assustados e terminariam na missa das seis da igreja de São Vicente, arrependendo-se dos pecados. Nós não: desceu uma estranha euforia e nos abraçamos, rindo e nos parabenizando pela aventura. Pra comemorar o feito, fomos beber Tiller’s Club (ai, a liseira…) e compor umas canções.

Hoje, morando aqui em Ipanema, vejo da janela da sala a lagoa Rodrigo de Freitas. Tem uns patos lá, sabia? Pois é, foram eles que me lembraram do boteco do Genival. E me inspiraram a escrever sobre os Breg Brothers, esse tempo em que a maior preocupação era encontrar um bar aberto de manhã. E o acorde certo pra dor de cotovelo.

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Ricardo Kelmer 1996 – blogdokelmer.com

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> Este texto integra o livro A Arte Zen de Tanger Caranguejos

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Apresentação no Festival Brega do Pirata (1989)

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Os The Breg Brothers 1989 Jabuti, Jeova, Cadinho
Os The Breg Brothers ensaiam (Praia do Icaraí-CE, 1989)

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O RETORNO

Em 1993, Os The Breg Brothers ressurgiram das cinzas com a chegada do garoto prodígio Rossé Rian, substituindo o saudoso Glaydson Gil. Rossé Rian trouxe alegria, vitalidade, juventude, poesia… Hummm, que é isso? Ele era o Bambi?

A nova formação, montada pro show no Cotó Clube do Montese, contava ainda com os vocais irresistíveis de Dani Gut-Gut e Sandra Sandrão, que bateu a foto e depois sumiu, arrependida daquela putaria toda. Veja a foto. Perceba o semblante de Lonner, preocupado com o empresário que sumiu com a grana, Rossé Rian cuidando de uma tiete, Dani Gut-Gut abalando em seu modelito Oncinha Paraguaia e Johnson Batista em sua clássica pose “E aí, gatinha, que tal um Tiller´s no meu muquifo?”

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O REENCONTRO

Esta foto histórica, de 1997, mostra o tão aguardado encontro de todos os Breg Brothers. É claro que tinha que ser num balcão. Glaydson, já morando em Berlim (é o nosso Breg Brother mais chique), passava férias em Fortaleza. Uísque com catchup de tiragosto. Velhas canções, antigos chifres relembrados. Perceba Lonner chorando por uma safada acolá que o trocou por um dono de pizzaria. Rossé Rian era novinho, mas já usava boné pra esconder os chifres. Glaydson se esguelando, sofrendo por uma alemã que era atriz pornô. E Johnson sempre arrasado, coçando a testa. Ô sofrimento.

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MENINA DO LACINHO COR-DE-ROSA
Johnson, Lonner e Gil

Quando entrei no cabaré
Todo mundo se divertia
Nessa noite que rolava
Todo mundo aproveitava
A festa acontecia

Numa mesa mais escura
Vi uma cena comovente
Uma menina ainda nova
Com um lacinho cor-de-rosa
Me sorria tristemente

Menina do lacinho cor-de-rosa
Teu lugar não é aqui
Levanta que eu te levo embora
Vem que eu te faço ser feliz

Fui sentar na sua mesa
E ela logo me falou
Estranho pode parecer
Mas não procuro o prazer
O que eu quero é o amor

E me disse com a voz meiga
Num beicinho de chorar
Ainda não sou bem crescida
Mas já sei que nesta vida

O importante é amar

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TANGO DO PADEIRO
Johnson, Lonner e Gil

Tudo era tão bonito
Quando eu te conheci
Você ficava deslumbrada
Com os presentes que eu lhe dava
As luzes do Iguatemi

Te dei calça Fiorucci
E um apartamento duplex
Da DeMillus dei de presente
Uma camisola transparente
Você ficou tão sexy

Você dizia que eu era um pão
Que eu era o fermento da sua vida
Mas me trocou pelo padeiro
E hoje o meu dinheiro
Não vale um semolina

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Comentarios01COMENTÁRIOS
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01- Pero prefiro esse brega “estilizado” de vcs!!! Lia Demétrio Aderaldo, Fortaleza-CE – abr2010

02- Ihvna Chacon iiiiiieeeeeeiiiiiiiiiiii – Ihvna Chacon, Fortaleza-CE – nov2010

03- Pra Luce: “Eu vou tirar voce desse lugar…” Nino Cariello, Fortaleza-CE – jan2011

04- Porra num sei onde tú tá com a cabeça que não empurra esses teus textos e livros prá psiquiatria…É MUITO BOM PRA DEPRESSÃO!!! kkkk Levanta o astral de qualquer propenso a putaria!! Ronaldo Rego, Fortaleza-CE – mar2011

RK: Breg Brothers cura depressão. Assim o nosso cachê vai aumentar, Ronaldo.

05- Ainda que esta escola aceite matrículas involuntárias de todos os homens, é Impressionante o quanto os escritores e artistas cearenses conscientes se declaram pós-graduados nessa filosofocornologia. 🙂 Lazaro Freire, São Paulo-SP – mar2011

RK: Sr. Lazaro Freire. Comunicamos que seu cadastro foi aprovado. Informamos também que não aceitamos desistência pois, de acordo com a sabedoria popular, ex-corno não existe.

RK: Teoria kelmérica sobre essa fixação do homem cearense com a questão da CORNAGEM. Acho que é aquela coisa: se você não pode com seu inimigo, una-se a ele. Cansado de lutar contra a natureza fogosa de suas conterrâneas, que simplesmente não se satisfazem com um homem só (ou uma mulher só), o homem cearense decidiu relaxar e fazer graça com a coisa. A cornagem, então, deixa de ser um mal que acomete o homem traído, um sofrimento sem cura, e se transforma numa grande GOZAÇÃO, motivo de piadas sem fim, fruto da capacidade de fazer humor com a própria desgraça. Se não for isso, então é outra coisa.

06- vidas passadas muito bem… éramos feliz e sabiamos muito bem… Gilberto Fonteles (Jabuti), Berlim, Alemanha – mar2011

07- rsrsrssssss… Muito bom! Estamos lindosssss!!!! Daniele Ellery (Danisléa Camburão), Rio de Janeiro-RJ – mar2011

08- Foi muito bom!!!Mas bom mesmo, foi quando a platéia jogou os pães semolina de volta na gente…….. Luce Galvão (Lucieuda Vai-Mais-Um), Fortaleza-CE – mar2011

09- Meu, tempos bons, não!!!! hahaha….a diversãoé o sentido da vida!!!!!! Ana Luiza Cappellano, Jundiaí-SP – mar2011

10- e vi também a nossa no Pirata com os Breg Brothers. Legal ter publicado! Isabella Furtado, Modena-Itália – abr2014

14 Responses to Breg Brothers com fígado acebolado

  1. ana claudia disse:

    adoro suas reminiscencias… como eh bom ter estorias para contar, ne

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  2. Gledson Shiva disse:

    Putz, camarada!

    Essas fotos vão servir pro diretor de arte elaborar o cenário e ambientes do CHIFRUDO, um filme que estou desenvolvendo,

    Muito bom!

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  3. Gladson Gil disse:

    pô Lonner, me animei. Acho esta renascendo uma fenix mutante, que ao invés de renascer das próprias cinzas, renacerá dos chifres enrustidos e das garrafas vazias(de Tiller´s Club). Vou começar a produção da “Menina do lacinho cor-de-rosa” aqui em Berlim. Mandarei noticia.
    Abração

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  4. Lia disse:

    rsrs…Morri de rir. Vc escreve dum jeito que a gente parece ter contracenado( é assim?) neste filme : Uma diliça!!!Quase cantei tb! Do Badauê eu lembro prá caramba.Morava no Rio e quase não volto das férias…kkkk
    Fortaleza não paracia tão divertida antes. As fotos estão demais. Um beijo prá vc -cheia de saudosismo. Lia

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  5. Isabelle disse:

    kkkkkkkkkkkkkk!!! Essa última foto é do Cadinho?

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  6. Lia disse:

    Caro Breg Brother Lonner, afinal me regojizo de ser irmã do ‘Cadinho’. A noite em que vcs ganharam o premio no Pirata ficara gravada nas melhores lembranças da minha vida. Mas antes, tenho que contar um detalhe… Cheguei nesta mesma manhã de um ano de viajem am Paris e imagine a minha surpresa de bater na janela para surpreender a familia e o meu breg brother abrir a janela e me mostar um bigodinho vulgo ‘rodapé de….’ , fiquei em estado de choque!!!!! De Paris para Fortaleza o ‘choque cultural’, não poderia ter sido maior, nem mais prazeroso! Não lembro se um dia ja me diverti mais do que nesta noite do Pirata. Vcs foram e são DEMAIS!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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    • ricardokelmer disse:

      > Bar Pirata, Fortaleza, 1989 – foi realmente uma noite inesquecível, que tocará pra sempre na radiola da nossas lembranças. E, olhe, ser irmã do felomenal Johnson Batista não é pra qualquer uma não, viu?

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  7. Bia Villar disse:

    Kelmer Lonner…vc me fez lembrar de coisas maravilhosas que já tinha esquecido…como cuidar do seu ferimento em prol do profissionalismo e da pontualidade em mais um show dos Breg Brother…Bons tempos, adorei o texto e fotos…beijinhos

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